quinta-feira, 2 de julho de 2015

o mistério não está na morte

em uma espécie de universos paralelos, existimos. cruzamo-nos com este e com aquele - aqui ou acolá. depois trocamos palavras ou sorrisos ou silêncios. toleramos ou aguentamos ou resistimos ou fruímos. choramos ou rimos ou não sentimos. isto tudo, tão pouco, para dizer que há sempre outro dia - o dia que aí vem ainda limpinho e sem linhas. porque os dias são sempre em branco por mais que os agendemos no anterior. e isso é, sem dúvida, a maior beleza da vida.

viver é, já não tenho dúvidas - nem dívidas -, sentir os dias envoltos em mistério.

1 comentário:

  1. Olinda, porque o Valupi não te faz a vontade, aqui vai um cheirinho a papel despretencioso:


    “Chegou uma esquadra, e aqueles a quem chamavam os camones invadiram a cidade tingindo-a com a brancura das suas fardas (…) Os camones pararam junto do Ângelo, que estava sentado no seu banco de madeira a experimentar a harmónica, um deles aproximou-se e disse girls, e fez com o braço o movimento respectivo, we want girls, o Ângelo disse girl é a tua mãezinha, estás a perceber ou precisas de explicador?, sim, a tua mãezinha, o camone riu-se para os outros, um deles avançou e fez uma espécie de passe à Fred Astaire, e de repente o Ângelo já tinha guardado os óculos e a harmónica no bolso, começou a despachar os camones, enfiou um pela loja de móveis do Ventura, outro foi cair numa das cadeiras da Barbearia Hollywood, os camones iam e vinham, o Ângelo tinha-os juntados todos num molhinho, e vai disto, tudo pelo ar, rumo ao Marocas Papa-Milhas, que tinha um motocicleta cheia de cromados e a mania das curvas rápidas, ia a fazer uma bela curva naquele momento, despistou-se, disse foda-se, foda-se, não mexam na mota, subiu o passeio (...), virou de pantanas o mostruário do Raul Pechisbeque, choveram colares de vidros, pulseiras, broches e anéis, o Marocas continuou em prova (...), depois de passar pela banca de peixe do Zeca Trampa, espadanando carapaus e lulas por todos os lados (...), as pessoas assomavam às janelas, as mulheres gritavam, o bebé da Gertrudes, que era o melhor pulmão lá do bairro, berrava como nunca (...), o Zuca diria mais tarde que, tirando algumas partes cómicas que pareciam à Charlot, aquilo tinha sido uma coisa iglantónica…

    Dinis Machado

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