um parêntesis no meio de uma crise existencial - as crises existenciais não são aquelas em que questiono quem sou de onde vim e para onde vou mas as que me reforçam a certeza de quem sou e de onde vim e para onde quero ir pela incerteza de poder ser quem sou e ir para onde quero, a primeira foi há cerca de sete anos e isso leva-me a concluir, não sei se prematuramente mas com a certeza intuitiva com que me habituei a viver, que entro em curto-circuito ao fim de ciclos de sete anos - foi uma oferta bem atrasada de aniversário em pura, total, poesia: um bailado russo em lago de cisnes no edifício mandado construir pela companhia de seguros garantia: o coliseu. não importa que os bailarinos não estivessem perfeitos em tempos nem em equilíbrio, estariam uns e outros (pode ser) igualmente a completar o pacote dos sete anos de vida, mas a magia da leveza, não só em pontas, da ponta dos pés até ao tecto alto, bem alto, que me transportou para o bico dos sonhos de olhos abertos. e cada passo, como se o andar fosse (e é) enfeitar cada movimento e procurar em cada um o mais leve respirar e a mais intensa concentração de amor; como se a vida se fizesse em cada arfar de melodia e se cada som tocasse violino para cada movimento e se a orquestra dançasse para nós e eles, os bailarinos, tocassem movimentos para ela. e tudo se confunde, entretanto, no palco da poesia: os bailarinos sou eu e eles são a orquestra e eu sou as pontas dos graves e dos agudos e ela dança vestida de tule.
e o parêntesis, em aberto, transfoma-se no livro e depois na colecção de livros e, enfim, na livraria privada. e quando chega a hora de fechar o parêntesis - talvez não passe de isso mesmo, penso, de um parêntesis no meu pensamento que se recusa a aceitar que a minha vida não pode ser uma livraria mas apenas uns e outros parêntesis -, a leveza contagia. contagia tanto que já dormi e ainda julgo que a minha vida é, como não deixam que seja como eu quero, leve.
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