quinta-feira, 20 de março de 2014

em terra de voz ou

Em Terra Sonâmbula,

 Mia Couto vai alternando duas narrativas, e é por isso que todos o capítulos têm duas partes: na primeira ouvimos contar de Tuahir e Muidinga; e na segunda ouvimos em alta voz um dos cadernos de Kindzu. Há, portanto, neste romance, um texto com outro texto por dentro. Há uma espécie de magia explorada entre as narrativas, palavra e terra ou terra e palavra como se lavrar e tratar da terra para produzir fosse, e é, escrever. Maravilhoso Mia Couto.

Construção do Romance

Mia Couto vai, palavra a palavra, ideia a ideia, em metalinguística, construindo o seu - o nosso - romance, em intertexto de oralidade, o autor serve-se, e tão bem, de tradições orais africanas mas também daquilo que é narrar por cima da guerra. Há quem diga que Mia Couto não escreveu um romance - mas antes uma sucessão de contos e provérbios tendo como pano de fundo o horror da guerra.

O que importa?

Não importa a forma, as origens, as inspirações - tampouco as dores dos observados e a do observador. Importa, isso sim, na narrativa cheia de narrativas de Em Terra Sonâmbula, a emoção das palavras e das imagens que Mia Couto faz o favor de nos ofertar. São imagens com cheiro e palavras que, cheirando, forçam-nos a serem cheiradas. A atribuição de poderes à palavra pode bem ser entendida, como referem Ana Mafalda Leite e Gilberto Matusse, como a encenação das dimensões e das funções práticas características da palavra nas tradições orais africanas.

Passagem por Rousseau

Rousseau defende a tese de que as línguas não têm como causa a necessidade, mas as paixões. A primeira língua seria, sugere o filósofo, figurada, onomatopaica, vocal, em nada diferente do canto. A evolução das línguas, que as reduz à submissão da necessidade, faz com que se tornem monótonas e cheias de consoantes. A escrita alfabética vem coroar este processo de racionalização das línguas. Neste raciocínio, a escrita coroa e reforça o processo de afastamento das línguas da sua fonte original, o coração. Logo, a escrita e suas instituições afectam, portanto, negativamente as línguas. De um lado, definindo a civilização, temos a academia, as línguas escritas, a razão; de outro lado, configurando o estado natural, temos liberdade, canto, coração. Opõe-se racionalidade a irracionalidade, atribuindo-se artificialidade àquela e autenticidade a esta. 

Oralidade, pois


Não estará, então, explicada a preciosa oralidade que Mia Couto usa e abusa para narrar a tradição africana? E o canto? Não será a música a mais limpa forma de oralidade e de comunicação selvagem? A voz liga-se, portanto, à fruição, enquanto que a escrita estará relacionada com a racionalização. O texto escrito aparece como inevitavelmente destituído da capacidade de abordar a "complexidade das forças do desejo", sendo a enunciação oral "quase perfeita", pois culmina no canto.

quarta-feira, 19 de março de 2014

ah!

lavar a língua, literalmente, esfregar a língua mostra porquê que as pessoas não o fazem também metaforicamente a pontos de se libertarem das bactérias e germes: provoca o vómito.

terça-feira, 18 de março de 2014

as esperas, que parecem intermináveis, nas salas de instituições de saúde, resultam em reflexões longas mas abreviadas por gosto:  quem é que quer ser amado como se já estivesse morto? E quem é que que quer amar como se fosse um morto? não são perguntas - são afirmações redondamente fechadas. mortas.

domingo, 16 de março de 2014

a tripa

a minha curiosidade natural, quero com isto dizer que não foi intencional, fez-me ver a pila do meu pai durante a consulta. gargalhei e eles não gostaram: esgar reprovador do meu pai e outro demolidor da médica. segurei o riso, claro, sem poder explicar de onde vinha. e vinha de a pila ser tal e qual uma tripa de porco enfarinhada. depois disso mudei de ideias, só os burros é que não mudam, e fui comprar um kispo para a minha princesa peluda. para quê apanhar chuva se depois tenho de estar a limpá-la e fica sempre com frio? elegantíssimo, creme a contrastar com a negrura dos cabelos, tem flores bordadas a linha prateada. por dentro é cardado e tem um pêlo maravilhoso no capuz. parece mesmo uma princesinha - tanto que me mandou logo ao reininho.

mas hoje não sei como segurar o riso, concluindo, vou fazer rojões para o almoço. rojões com a tripa enfarinhada.

quinta-feira, 13 de março de 2014

idiotário

tem vezes que o dicionário só serve mesmo para meter no cu de pedófilos e violadores: as palavras aparecem com o significado de sinónimos sem, no entanto, aparecer a definição do sinónimo. é o caso de tildar e tilar. fiquei a saber o mesmo. porca miséria.

tenho a certeza

absoluta: os homens que só se envolvem com mulheres para putarias têm carácter de chulos invertidos: alimentam-se da pureza, desprezando-a, roçando-se na imundice.

quarta-feira, 12 de março de 2014

uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa

fiquei quilhada para sempre com ele, bem sei que para sempre é muito tempo mas o que não me é para sempre passa-me minutos ou, quando muito, dias depois - e não passa porque abomino hipocrisia. mas esta miniatura  pornograficamente amorosa roubou-me risota. é isso: sou da pornografia amorosa.

sábado, 8 de março de 2014

mixórdia

acho uma certa piada aos que só funcionam através de implicitismos, nem sei se esta palavra existe, de atitudes caracterizadas por não atitudes - as mesmas que exigem dos outros para, com eles, se relacionarem - como se o processo de auto-aceitação deles próprios passasse pela rejeição dos outros. bem visto, tudo não passa de um exercício de rejeição própria frustrada. e faço-lhes distinção: de um lado meto os que o fazem por natureza, sei bem ver quem são mesmo sem ver, e, no outro, os que se convencem que assim é que é ser diferente tomando esta diferença como a grande virtude da sua vida. E se os primeiros merecem o meu respeito e admiração exuberante, os segundos fazem-me rir de tão ridículos: é que sabem tão bem quanto eu que são uma farsa.
*
quando inventarem o dia internacional do peido - a maior prova gasosa e viva do sucesso e dos fracassos das relações - estarei, prontamente e com alegria, em todos os traços da celebração. até lá!
*
quando houver uma manifestação de azeitolas machos e fêmeas, é informar - para eu indicar alguns nomes para os cartazes.
*
há pouca coisa que tenha o sabor da memória como a regueifa.
*
o ballet é a mais bela de todas as danças - talvez por não ser apenas uma dança de pontas.

quinta-feira, 6 de março de 2014

boa!

estes vasos etruscos poemados! quero mais, Pidarra.

(um dia vou escrever uma coisa do género, a quem eu cá sei, quando o teu tronco se deixar querer as minhas raízes podemos florir ao som das seivas que se vão, tão cremosas, engolindo e espalhando. não, cremosas não: cremosa - porque a minha é mais água de mar temperada que te vai sempre matar a sede. )

domingo, 2 de março de 2014

sábado, 1 de março de 2014

Pidarra,

não arranjes desculpas para justificar o quanto amar dá trabalho e que, por isso, mais vale ser apenas amado. 

isto faz pensar no progresso - quero dizer na falta de progresso essencial do Homem.

(5ª linha, o por os afectos. será este singular, talvez, um acto falhado) :-)

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

a contemporaneidade tem,

final, coisas irresistíveis.  não é que o google, por estes dias, foi o primeiríssimo a dar-me os parabéns? disse, em bolos e velas como cenário, assim: Parabéns, Olinda! adorei, o google é sexy.

sábado, 15 de fevereiro de 2014

por entre tempestades
e manhãs claras
só as árvores resistem
não são elas
o oposto
compreensão
força incansável
beleza em arrepio
que crescem de cima para baixo?

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

civismo não há

Ontem chorei

Civismo não há. Ontem chorei muito e não dormi a noite toda. Ela também não. Depois de jantar fomos dar o passeio, a volta do costume. mas ontem não foi uma noite normal. Os dois cães enormes soltaram-se e vieram em direcção a nós. As duas, parecidas em tanta coisa mas imensamente no que se refere ao acolhimento, sorrimos - eu em um olá prolongado e ela abanando o rabo de pêlo farto e solto. Veio o primeiro e abocanhou-a; veio o segundo abocanhar também. Estávamos as duas sozinhas na solidão do medo e do desespero.

Onde está o civismo?

Porque faz parte do civismo a entreajuda, aquela coisa que supostamente é inerente à condição de ser humano, estávamos e ali ficámos sozinhas por dentro do medo partilhado. Os carros que passavam foram parando com os meus gritos - mas ninguém saiu para me ajudar; havia transeuntes na rua, era cedo, mas ninguém se aproximou; havia apenas o céu imenso que me acolheu na sua escuridão e o eco da nossa aflição que parecia, e foi, mudo para o mundo.

O zelo pelo progresso da pátria também passa pela entreajuda

Ajudar - tão simples e tão miseravelmente omisso na Cidade. Perante uma chacina prestes a acontecer, dela e minha, descobri o flagelo da falta de civismo. A covardia das pessoas assusta - assusta quase tanto quanto os dentes afiados de dois cães gigantes a abocanhar uma cadela peluda e doce; a falta de civismo morde e rasga quase tanto como dois cães raivosos com o mundo.

Serão os cães raivosos o reflexo da falta de civismo?

A aproximação da raiva perante duas inocentes é em tudo semelhante ao afastamento das pessoas perante uma chacina em potência: liga-as o desprezo pela vida; liga-as a miséria do não se ser; liga-as a omissão perante a dor e o desespero; liga-as a irresponsabilidade fanática da inconsciência; liga-as o nojo atroz pela solidariedade e entreajuda.

Ela-eu, tu: afinal não somos iguais

Amanheceu e há susto. Amanheceu e há medo. Amanheceu e há tristeza. Amanheceu e há a certeza de que o civismo anda moribundo. Amanheceu e a certeza continua de que aquelas pessoas tiveram um sono tranquilo, uma noite descansada. Amanheceu e até a manhã gelada acredita no gelo delas, na indignidade que é o mau carácter de não se dar a mão nem a palavra a alguém. Amanheceu e o país está cada vez mais pobre: são cada vez menos os que zelam, valentia e coragem, pelo progresso da pátria. Amanheceu e eu continuo a chorar pelo que escasseia, pelo que não há. Amanheceu e ela está enroscada na sua vergonha de ter sido abocanhada por dois cães raivosos. Amanheceu e a tristeza, é a tristeza e a vergonha, cobre-se de civismo - do civismo que os que se têm como gente não têm.
Definitivamente: miseráveis covardes.

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

alfabeto de kama

sutra! qu' aqui não há discriminação sexual de género.

pode ser fácil o difícil de entender


crescemos todos a ver, na televisão ou jornais e revistas, mulheres despidas a patrocinarem marcas. a mulher é um bicho belo que serve para ser apreciado - tal e qual como se passa no zoo. mais: a mulher é um bicho belo que ganha dinheiro ao ser apreciada. por que razão haveria de se importar com isso? a instrumentalização do corpo, feminino em particular, deve dar em estudos psicológicos - mas também sociológicos - interessantes e o impacto da ridicularização aquando da inversão da tal instrumentalização é grande: dá vontade de gritar não faças isso!, sai daí!, e mais do que riso provoca alguma pena. parece humilhação. e é: uma pronografia mascarada, sexução em vez de sedução. porque a sedução, ao contrário do que diz o dicionário, os dicionários também se deixam corromper pelos linguistas, os linguistas também podem sofrer de desvios no seu imaginário individual, existirá desvio na imaginação? se a considerarmos um paralelo real da realidade?, no dicionário fala em corromper e também em fascinar, haverá fascínio por e aos pedaços? não creio - e por isso creio tratar-se antes de sexução. mas adiante. este tipo de publicidade acentua fortemente uma espécie de atraso mental no público masculino, falo obviamente na que instrumentaliza corpos femininos, já que pressupõe que , por exemplo, uma gaja nua com cabeça de ferrari estimulará a compra do ferrari pelas curvas da mesma. isto no meu campo de hipóteses, já que a estar comprovado que sim, serei obrigada a concluir que os homens terão mesmo um atraso mental. ou então que o estímulo à dominação e subserviência tem um impacto positivo, de tão negativo, na violência doméstica ou nas violações. não acredito nisso a não ser, claro, partindo de um outro pressuposto: há mais homens bem do que mal formados. estou enganada? talvez, estarei a raciocinar a uma escala muito ampla que é o mundo - o que me faz acreditar na grandeza. e aquele miúdo de treze anos que violou a irmã por querer imitar a pornografia de um jogo? pois. um adolescente não é um homem (e não leste o Gonzalez quando diz que os homens são bebés?) e um homem que quer comprar um ferrari por causa de um corpo de vagina nu não é inteligente. vá, são excepções e a publicidade quer excepções - até porque só as excepções compram ferraris. OK? não precisas de gritar só porque teimo em generalizar. ficamos assim. ficamos a entender que serão mal entendidos os que trabalham para entender as massas e os que não entendem por serem diminuídos.

interessante

cores com formas ou cores e formas ou percepção das cores através de tecnologia. aqui.

e a banda sonora que escolho é...


quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

urgência

serei sortuda, talvez, por nunca ter lidado com esta miséria. mas ingénua sou certamente por nem sequer ter imaginado o quanto o mundo é miserável, entre todos, com alguns. e é por isso que ler e reler aquele texto faz chorar. mas também sorrir - por nunca ser demais entender. obrigada, Isabel.

a beleza por detrás da ausência de ovários e de testículos

por tudo ficar por viver. aqui.

escultura com modelo vivo

há um par de anos tirei um curso, visual merchandising, com este artista e recomendo vivamente qualquer arte com ele na galeria, que é também a sua casa, dele. agora chegou a vez da escultura com modelo vivo.

estás à espera do quê para ires espreitar o site?

juanar

podia bem ser o olhar rasgado. ou o corpo definido. ou o improviso nos passos. ou o sorriso brilhante. ou o jeito delicadamente grosso. ou a pronúncia bagaceira. podia bem ser isso tudo que faz com que o Juan seja o melhor professor de Zumba do mundo - mas não é. o Juan cativa com a alegria que é dar alegria; com a atenção que dedica a cada aluna; com o bom humor que transpira e também pela sensualidade que desperta. por isto tudo e muito mais, já merece abrir um espaço só dele. e se não merecesse aconteceria na mesma: ele disse-me. fiquem a aguardar que logo, logo, vão saber onde fica. agucem esses sentidos que o Juanito vai aumentar.

terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

popar


um coiso que fecunda sem ter sido fecundado

mata-me ou ama-me sempre é sempre a outra voz. há quem tenha duas ou três, outros sete ou oito - nove ou dez. há quem tenha vozes, transpira mais, espalhadas pelos poros. (deve ser por isso, aliás, que correr ou dançar ou saltar estimula tanto a criatividade: mal se deita o descanso levanta-se o coiso criativo. o coiso, sim, aquilo que fecunda sem ter sido fecundado.) talvez a criatividade se esconda nos sovacos, em alguns casos, ou nos pêlos encravados dos rapados - é aqui, precisamente aqui, que mata-me ou ama-me poderá ser uma voz criativa porque de outra forma, sim, de outra forma, não pode haver o ou: matar por amor não é matar o amor, é matar o amado. e amar o morto não é amar o amado mas o amor. estarei perdida? não: o amor é energia vital e, por isso, criatividade (é por isso que o amor só se vê quando se deita o sexo a descansar). quando se pensa muito em morrer, ou matar, é porque já se está morto. o ressuscitar sim, já mete coiso criativo - o ressuscitar não é recuperar a vida depois de se morrer mas evitar aquele segundo, mais segundo do que minuto, derradeiro para a morte. é como quando as mulheres têm de virar à direita mas dão o pisca para a esquerda e já em cima do entroncamento conseguem a direita pretendida. isto é ressuscitar, o tal coiso que fecundou sem ter sido fecundado. é que depois de ter conseguido esta vitória, energia vital completamente potenciada, a mulher sente-se capaz de dar dez voltas a uma rotunda. o que tem isto de criativo? muito: durante essas dez voltas, há uma impressora mental que funciona e podem estar certos: quando uma mulher, uma mulher a sério, imprime coisas - o passo seguinte é arregaçar as mangas e fazê-las. ou pelo menos tentar até ao próximo segundo, mais segundo do que minuto, derradeiro para a morte. olha como tentar é criativo. olha o paradoxo: tentativa falhada é criatividade consumada.

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

agora é que tenho a certeza

:afinal sou uma santa.

muscular o cérebro ou vai-te foder nelinha



parece estar regulamentado nas cabeças. nunca percebi, não percebo nem hei-de alguma vez perceber, a coisa de os corpos gordos ou alegadamente feios inibirem de alguma forma as capacidades, os talentos, os sucessos ou os fracassos. vem isto a propósito da morte daquele actor maravilhoso que, dizem, apesar de gordo, vingava na grande tela. em uma sociedade cada vez mais industrializada ao nível mental, ideias em série de metodologia standardizada barbie-ken, perfeição plástica e  sempre em vias de polimerização, urge mesmo estourar com o preconceito de que a beleza é um conceito objectivo e universal, isto por um lado, e de que esse conceito objectivo condiciona as experiências pessoais e profissionais por outro. bem visto, tratar-se-á de muscular o cérebro e, exercícios permanentes aeróbicos, de oxigenar os pensamentos que se reflectem em palavras, atitudes ou omissões. este é um dos grandes desafios dos séculos vinte e vinte e um.

porque as pessoas são inteiras e a carne, que é a parte visível da alma, faz parte do todo. enquanto as pessoas que se dizem pessoas não entenderem isto, não entendem nada e serão sempre anorécticas de espírito. tenho dito. há quem diga de outra forma, mais obesa, aos tristes, do género: vai-te foder, nelinha.

sábado, 1 de fevereiro de 2014

empapado e enrojoado, aleluia!

decidiram entronizar um padre confrade de honra por ter contribuído durante quarenta anos para a divulgação das papas de sarrabulho e dos rojões de uma freguesia, a par dos trabalhos na paróquia. há mais de trinta anos, este mesmo padre, recusou-se a fazer o funeral de uma mulher e mãe de quatro filhos apenas porque ela não teria colocado os filhos na catequese para fazerem a comunhão com as lengalengas da igreja católica - não teve, portanto, papas na língua e manteve o rojão, o dele, bem sectário e desumano. a história, com um jeitinho, vai acabar assim: o padre, agora ainda mais podre das ideias por conta de a podridão do corpo ser bem solidária, ao ser aclamado confrade vai comer uma tigela de papas e arrotar de satisfação azeda. após um quarto de hora, sensação de vazio no estomago, sangue do porco a obstruir-lhe a vida, mete um rojãozinho na boca de lavagem e a justiça divina acontece: nem para dentro nem para fora, olhos arregalados de pânico, no meio da festa quando estão todos a olhar para o prato, esgar de aflito, nem sequer consegue bramir e só dão conta dele quando os resquícios finos da flatulência instalada, janelas que se fecham pela chuva grossa, dobrarem o ar. se houver justiça divina é isso que vai acontecer: padre confrade de honra bate a caçoleta empapado e enrojoado da goela até ao fundo. no fundo, aleluia!, foi uma morte cheia de abundância - dirão -, uma honra.

sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

espectáculo

através daqui.

foi-se-me

como dizer a uma amiga que escreve imundamente mal e que um trabalho académico tem regras, principalmente as do bom senso de não copiar brasileiradas como suas, que as ideias pouco valem quando não se conseguem expressar - o que denota um pensamento fraquinho - e que sinto uma grande, imensa, vergonha de coisas assim? 

pois. não se diz. faz-se a revisão do texto por amizade pura já que o interesse foi-se-me logo na primeira página, referindo-se apenas que estava tudo muito confuso; elogia-se o que há para ser elogiado, talvez a escolha da fotografia de capa, e pronto. entretanto preocupa-me as notas altíssimas que os professores lhe têm atribuído, tratando-se de estudos superiores pós-graduados. enfim.

terça-feira, 28 de janeiro de 2014

insista-se


está decretado

uma rainha, que sempre viveu como plebeia, um dia acorda a pensar: que se acabem os vampiros do meu reino!, faça-se justiça ao meu esplendor! e tranquila, plebeiando, segue com a coroa única do fulgor.

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

versus

amiúde ouve-se tanto da ignorância do positivismo a passar por positividade quando tantas vezes é o segundo conceito que nega redondamente o primeiro: ser-se positivo quando todas as variáveis da vida estão completamente no chão é conseguir ser um positivista do carago – basta para isso negar a realidade experimental. 

domingo, 26 de janeiro de 2014

boato selfie

um boato pode ser bastante útil: lança-se a posta escolhendo-se a quem a posta é lançada e depois fica-se a aguardar que a confirmação chegue. depois compara-se e conclui-se. sim, o boato pode ser útil desde que não prejudique ninguém. para isso a posta lançada tem de ter que ver com quem, protegido na sua falsa mentira, lança a posta. para a maldade usa-se a inteligência.

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

não quero perder esta tragédia cheiinha de diversão


cerrado permanece o nevoeiro

cerrado permanece o nevoeiro
na vida dos olhos do leme
é um navio a vapor movendo-se
por tudo o que ainda teme
régua e esquadro a jeito
esquissos rectos em rigor
que é isso! milheiro de d'espanto
de rosas frescas quebranto?
por onde vão passando pés
vestidos em nuvens de lã
que é isso! esculpido de prova
de que a poesia é manhã?
e é fio abolado ao dedo
que de s'enrolar se solta
que é isso! lousa bordada
de gizar que se perde e encontra?

cerrado permanece o nevoeiro
(shiuuuu)

domingo, 19 de janeiro de 2014

sábado, 18 de janeiro de 2014

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

espanta espíritos pobres

lava bem essas couves, não vá aparecer alguma lagarta e nem quero imaginar o nojo se calho de ter uma na boca. não tens nojo?

nojo tenho, claro, mas das bocas que já lamberam um rol de pilas diferentes. já as lagartas são muito bem vindas.

imbecilidade paternal da semana

não gosto deste peixe porque tem espinhas.

segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

quando o ego supera a arte

há crueldade e não beleza.
por favor: tua por tu ainda és nova (21ª linha); está por estás a perguntar-te a ti própria (24ª linha).

olá menina!

curiosamente passa sempre naquela hora em que ando a pastar a deusa peluda: quando para baixo, vício a ougar, vai a ressacar e quando para cima, já saciado, vai a alucinar. na voz, carrega sempre um olá menina e um acenar de braço simpático - isso não muda. pela tez na pele e na língua é cigano, as palavras saem-lhe cantadas e sorridentes apesar da idade. sempre a passos largos, passa a cantarolar o que não percebo e só interrompe a alegria para o olá menina. gostava de lhe conhecer a história. certa vez, há muitos anos quando já morei aqui, havia um mendigo que tocava na minha porta a pedir dinheiro e a minha resposta era sempre a mesma: leite ou arroz ou massa. um dia disse-lhe para entrar e sentar no sofá para lhe saber da história mas o meu pai chegou e ralhou tanto que ainda hoje os meus ouvidos sangram. e é por isso que agora, com o cigano barbudo e drogado, saber de histórias de gente perdida no mundo aqui em casa está fora de questão. pode ser que um dia os passos lhe abrandem.

The History of Philosophy, in Superhero Comics


domingo, 12 de janeiro de 2014

comunicar precisa-se

Cafe Babel

(aqui na gaveta do lado, cómoda branca e lascada, tem máscaras para colocarem, por favor, antes de ler)

não tenho dúvidas: estar, e não ser, no ser não se pode deixar que caibam os rótulos que a sociedade inventa, desempregado é uma doença - não para todos os que estão por conta de ser precisa muita força e desenvoltura física e sobretudo mental para gerir o estado - para a sociedade. e uma doença contagiosa, da qual não se querem aproximar ou recomendar relações próximas. o desempregado ora é um inútil ora é um condenado à subserviência tamanha a quantidade de direitos que perde e deveres que adquire. o desempregado é uma espécie de persona non grata a quem se fecham todas as portas precisamente por já se encontrar do lado de fora. o desempregado é aquele a quem tem de se, não humildar, humilhar. e o desemprego é a variável mais frágil para a estatística de uma sociedade justa. porque injusta.

mas o desemprego também tem um aspecto muito positivo: permite-nos aferir com minúcia quem exactamente se está a merdar para nós - coisa que muitas vezes nem durante uma vida inteira sabemos. o desemprego é amigo das descobertas. ah! por uma vertente mais espiritual da coisa diria que é uma experiência absolutamente positiva de tão negativa - isto se o desempregado ainda conseguir fazer reflexões e paralelismos durante o seu dia vazio de ganhos e proveitos, claro. ser desempregado é, vivendo no tempo que só passa, não viver. e quem for desempregado crente, bem crente, há-de acordar e dizer: este é o meu dia sem alegria porque Deus não quer. bem visto, o desemprego é uma lâmina para os movimentos religiosos. já para o governo que não travou, nem trava, o surto da doença o desemprego pode ser uma mais-valia: quando se dá fome aos animais eles respondem, em uma primeira fase, com raiva. mas a pouco e pouco, a desnutrição começa a passar da carne para o intelecto e o desempregado acabará por se render àquele que pode alimentá-lo - e passa a apoiá-lo. creio ser essa a condição das massas por cá: a fome e a enfermidade física e mental, sequestro em gerúndio, apoiam a psicopatia do governo. é a síndrome de estocolmo.


sábado, 11 de janeiro de 2014

melhor

o homem que uma mulher inteligente escolhe é, por fazer o mundo dela incomparavelmente melhor, o melhor do mundo.

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

as rosas e o seu perfume são engano?

quando se vive como se alguém não existisse, quando perante alguém se finge que esse alguém é ninguém, é-se (mais) feliz?


quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

necessidades vitais

nunca tinha levado isto muito a sério. quero dizer, como mulher, que desvalorizei sempre essa natureza do macho. talvez achasse piada a essa espécie de capricho masculino chamado de necessidade. até ver isto. é biológico e é verdade, a pontos de haver serviço de ejaculação assistida. não me choca o serviço - tampouco a necessidade; choca-me antes a existência de doenças que inibam um homem, porque é de homens que quero falar e da necessidade sexual absolutamente vital, estou convencidíssima, de se tocar. nunca pensei que um homem pudesse vir e ficar nem que uma mulher pudesse ir e regressar assim desta forma. mas também penso que só um homem para precisar disto e só uma mulher para conseguir dar-lhe. os homens precisam das mulheres para serem homens e as mulheres precisam dos homens para serem mais mulheres. fiquei triste, porém uma tristeza feliz como a música abaixo me sugere: afinal ele sentiu-se homem e ela ainda mais mulher naquilo que ser mulher é condição: na dádiva.


vale a pena ver


isto

sem fama e sem dinheiro só os animais, os outros, a amam.

quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

certos

em uma coisa os berros do meu pai estão certos: não tenho talento para negócios, nunca tive, não tenho astúcia para enganos e também não tenho queda para plantar e fazer multiplicar dinheiro - sou um péssimo negócio. uma falhada assumida.

olhem só para o talento cabeludo

deste moço. (e, é certo, só quem tem talento é capaz de ver talento nos outros)

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Emerald Web- Flight Of The Raven 1979 Trippy Synth Acid Folk


nunca desejei tanto a morte a um morto

tanta gente a passar mal neste país, tanta miséria humana e social e moral, e há mobilização total por um morto - uma pantera da bola passada. por falar nisso, também morreram trinta e nove baleias e quase ninguém deve ter dado por isso.

maravilha


esta maravilha serve a todos:  tanto a quem ama a culinária e quer aperfeiçoá-la como a quem a odeia e também a todos os que um dia podem precisar dela por falta de quem lhes faça tudo. ou até mesmo serve para os que são convictos na certeza de que trabalhos manuais só aqueles executados, carne na carne, em si mesmos.

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014



pode ser

em Portugal, 2013, a palavra mais pesquisada no dicionário Priberam foi poder. vai-se lá saber o que se passa na cabeça do mundo. se por um lado, como diz a notícia, a pesquisa pode servir para descobrir o significado - por outro também para verificar como se escrevem as palavras. ora poder, quer como verbo quer como substantivo, é capaz de ser uma palavra complicada. tal como bunda-mole ou anão, por exemplo. uma coisa é possível concluir: quem fez estas pesquisas foram, respectivamente, incapazes, cus duros (não confundir com kuduro que esse aprecia mais trabalhar com a anca do que com o computador) e gente de estatura regular. pode ser.


o que é certo

a ocasião faz o ladrão. isso. e tanto é ladrão o que rouba como o que deixa roubar. pára tudo. 

é um campo imenso, enorme, recheado de grelos e couves tão verdes como uma safira por inventar. e é um campo tão farto como desprotegido. a meio, o tal carreiro por onde sabe tão bem às galochas calcarem as poças e às ervas receberem com forte aplauso as águas e as merendas dos cães. mas há quem queira usar o carreiro, em todo o lado há gente que só quer usar em abuso, para aceder ao verde e usurpá-lo em sacos grandes e resistentes perante tão grande céu. agora quase que dizia que sou o céu. mas não, quando muito serei um céu, sim eu sei que céu da boca somos todos e toucinho do céu só de vez em quando, um céu sem ser pedaço. as couves e os grelos, ah!, essas pequenas grandes maravilhas que vitaminam e também fazem a tripa dobrar!, estavam a ser fisgadas de uma assentada. mas roubar para comer não será pecado, ouvi-me; mas pedir para levar para comer é que é correcto, mais vozes. decidi repousar, tal e qual como faz o céu, pelo menos nunca o vi a correr a não ser para mudar de cor, e aguardar que alguma sensatez descesse pelos canais que ligam o céu à terra, a razão à sensibilidade pela intuição, e sete casas abaixo das safiras por inventar lá estavam eles a violarem a laranjeira da casa azul e de portões acabados de abraçar. a adulta, suponho que seria a mãe, a péssima e desmerecida mãe, ser mãe é proteger, carregou a mercadoria enquanto mostrava às crias como procederem no assalto. esgar de vergonha, o meu - sempre o meu -, perguntei apenas se aquela era a casa deles e se achavam agradável chegarem à sua e terem sido roubados. mas são apenas laranjas e aqui não mora ninguém. percebi ser prática habitual e despudorada, uma miséria de ser. revolta no auge, a minha, porque ninguém desvaloriza laranjas e couves e grelos à minha frente, arregalei os olhos e ordenei que saíssem e não voltassem. e num ápice fui avisar os lavradores dos ladrões que andavam à solta. tudo se resolveu por ter a certeza de que fiz o que é certo. o que é certo para mim.