durante a leitura deste texto, são raras as vezes que não sorrio ao ler o tempo contado por este Homem, e a propósito de atavismo, ocorreu-me, alguma relação deve ter se levarmos à letra o que a outra, de não haver coincidências, diz, que em relação ao casamento a coisa processa-se de forma inversa mas com tendência ao inverso do tal inverso. chamemos-lhe atavismo da geração vindoura. a geração anterior à minha, com as devidas excepções que fazem parte de qualquer assunto, ainda acreditava na conjugalidade via casamento que a geração dos pais e dos avós lhe passou - talvez por referências positivas dos tempos, de outros, e das vontades, não posso saber. na minha, ainda há uma parte que sim mas uma outra, grande, que não. na seguinte, muito menos. não estou a querer dizer que o amor não cabe tanto dentro como fora do casamento, não, até porque são poucos os que se unem, e muito menos os que se fundem, por amor mas antes a afirmar que os que recusam o amor são exactamente os que recusam apostar. sim, porque casar é fazer uma aposta, apostar - passo o pleonasmo - em si e no outro perante uma vida a três (a mim, a ti e a nós); já quase ninguém acredita que vale a pena apostar em alguém e nalguma coisa a não ser em si. e é daí que surgem as ligações de uma tal igualdade de contas bancárias e de contas correntes e de previsões, a curto prazo, de afectos.
garantias não há, em lado algum e sobre coisa alguma: pode-se casar e descasar; pode-se cohabitar e descohabitar mas a derradeira diferença entre o casar e o não casar reside no risco da aposta, na convicção de que partilhar o sono e o sexo tem exactamente a mesma importância que partilhar o riso e o choro. é como se o sentir que vou amar-te e respeitar-te, com todas as variâncias que o amor e o respeito possuem, todos os dias e todos os momentos da tua vida e aposto que vou conseguir apenas porque é o que de facto quero porque o sinto, andasse a ser trocado pelo o amor é um estado de espírito e por enquanto podemos tentar viver na mesma casa e dividir as contas, porque até temos bom sexo, até que apareça alguém que me encha todas as medidas. será uma espécie de cohabitação entre solteirões - ser solteiro é, muito mais que um estado civil, um estado de corpo e de alma - um estado de completo descomprometimento do corpo e da alma - incapazes de se entregar, ora porque não sentem ora porque cagam-se todos na possibilidade de perderem esse estatuto de estado. e assim se vive em conjugalidade solteira, tanto em casamento como por casar, nos nossos dias.
(e isto a propósito de atavismo. e de atadismo emocional também.)