quarta-feira, 4 de julho de 2012

ouvir dizer que tenho uma estranha forma de vida merece um pequeno apontamento: há quem no viver se vista de casual - eu visto-me de laços.

terça-feira, 3 de julho de 2012

o homem é o animal mais fraco da selva

 meia noite, sono espantado, leitura, zapping por excepção. Cathouse na SIC Radical, nunca tinha ouvido nem visto nem lido, e curiosidade a mil. castings para a profissão: duras. uma delas tinha como talento conseguir enfiar uma banana inteira, esquece lá isso que podia ser das da madeira, pela garganta sem a danificar; outra transformava-se em uma boneca articulada passível de meter ao bolso; uma outra baseava-se no histerismo para se diferenciar das demais. as peças funcionam ao mesmo tempo como reportagem e reality show: depois do proceso de selecção, e instalação delas na quinta, vêem-se excertos do trabalho de cada uma com os clientes e também as experiências que fazem entre si. dizem-se viciadas em sexo mas fiquei convencida que serão viciadas em dinheiro pela forma como negoceiam cada performance. nada me chocou mas tudo me surpreendeu. surpreendeu-me a falta de intimidade, os risos encenados, os sexos sem rosto. mas o que mais me surpreendeu foi constatar que qualquer um dos homens que ali entrou - vi três peças -, como que bezerrinhos frágeis a aprenderem a andar, se rendeu perante a possibilidade de ser controlado e ainda pagar por isso. questionei-me, mesmo antes de decidir adormecer, se cada um daqueles homens alguma vez satisfez, ou tentou satisfazer, as suas vontades e fantasias com a mulher com quem dorme ou se será a adrenalina provocada pelo desconhecido, pecado implícito a ser evitado pelo afecto, que dita a procura por sexos usados e gastos como se fossem, e não são, tanques do povo que lava no rio - nada se compara ao cheiro fresco da roupa acabada, não de sujar, de lavar.
observo, em outro dia, o processo de acasalamento entre um macho e uma fêmea em plena selva e percebo tudo: é à fêmea que cabe o papel de escolher quem nela vai pousar e o homem é o único animal que, medo em punho de ser rejeitado, paga, não para pousar, ser pousado. o homem é o animal mais fraco da selva.

(às excepções, que o ser reles não é obviamente universal, aqui fica a minha admiração)

segunda-feira, 2 de julho de 2012

hoje já lá vão dois golos na baliza da alegria

está explicado o porquê de cá em casa as plantas, beleza que salta à vista, serem tão felizes: vêem cor, intensidade e direcção.

gooooooooosssssssssss

Goethe é uma daquelas palavras que nós, por cá, não sabemos como se pronuncia - ora sai goude ora entra guete. e é aborrecido quando queremos dizê-la em alta voz, materializar pensamentos, e há necessariamente uma pausa forçada quando chega ao nome deste senhor genial na arte que é, saber pensar, escrever.

fui à procura de material audio para suportar as minhas dúvidas. pelo caminho, descobri esta frase tão interessante - do homem do nome que é difícil pronunciar - que veio apoiar inequivocamente a minha teoria de que a arquitectura também é poesia: "a arquitectura é música petrificada".

(fiquei feliz. é muito bom sentirmos retorno, retorno do que é mesmo bom, daquilo que pensamos acerca dos detalhes do mundo)

http://diekarambolage.wordpress.com/2012/02/13/como-pronunciar-goethe/

domingo, 1 de julho de 2012

reflexão de domingo

ambos, o bom humor e o bom amor, são filhos da embriaguez sem vinho. mais: um homem que sem vinho é mal humorado só pode ter aquilo que merece - ser mal amado.


sexta-feira, 29 de junho de 2012

(shuuuuuuuuuuu)

parada na av. da boavista naquela parte em que casa sim casa sim as paredes são altas e tapadas por árvores seculares, uma maravilha, imagino uma história por dentro da casa amarela e por musgos verdes raiada. mas agora não vou, não posso, contar: na história, a madame carlota byrne pediu-me para guardar segredo.



quinta-feira, 28 de junho de 2012

terça-feira, 26 de junho de 2012

prosápiar

prosápia no falar das pudendas de umas e outras é buçal. ou boçal, vogal bem à medida, se a pudenda lhes acerta na boca.

segunda-feira, 25 de junho de 2012

quando as vaginas batem

é na multidão que tanta vez se nos embacela o silêncio. e o silêncio é sempre uma sinfonia de vozes mudas, de nós para nós, alegro vivo, harmonia. no outro dia o silêncio contou-me que afinal se confirma: há mulheres que possuem o coração, máquina antiga porém com tecnologia de ponta a bombar, na vagina.

quinta-feira, 21 de junho de 2012

no meu rol não entra

lembro-me de, naquela altura quando o estudei, me orgulhar dele - ouvia e lia com entusiasmo das vicissitudes e glórias da unificação do império acrescido, curiosidade minha nos intervalos do essencial da política externa, das cartas que escrevia à mulher citando Shakespeare e Byron.

agora faço uma comparação entre Bismarck e a mulher mais poderosa do mundo, Angela Merkel, e percebo por que não lhe presto a mesma, nem a mínima, admiração: nunca escreveu cartas de amor.

quarta-feira, 20 de junho de 2012

o hamburguer e o sexo

são os aditivos de açucar, artificialidade controlada, nas comidas mcdonalds que promovem o vício pela comida rápida. para ela, para elas, os encontros de pasto com ele ora em camas usadas e surdas de motéis ora nos bancos cansados do carro, tempo absolutamente contado, onde ele passeia com a mulher, o que a vicia, as vicia, é o sexo - amarga máscara, doce cobertura, de açucar.

(escolho esta melodia, cozinha em lentidão, para congratular as mãos que cheiram a alho e a cebola)

terça-feira, 19 de junho de 2012

bilhetes sem regresso

desabrocham lentamente como se soltos não estivessem - e não estão.
soltam amarras, gritam abriladas
brindam ao acabar de mãos cheias de nadas
brilham: vestem-se de estrelas airosas, pungentes
que se fodam, pois, as cadentes
mostram alllegria, éles que mostram - tão contentes - os dentes
e aguardam, poesia de cá, os trémulos passos de lá.
bolinhas frágeis de sabão, bilhetes sem regresso
eu vos destituo, para sempre, confesso,
da cadeira barroca, amorfa, padiola
tenho o chaveiro! tenho o chaveiro!
ouve bem, roto, furado, vulpino cativeiro!

segunda-feira, 18 de junho de 2012

a verdadeira, e única, falência é a da alma - uma contradição no presente negativo: eu não falo.


sexta-feira, 15 de junho de 2012

súbito

há sempre qualquer coisa de inesperado na certeza - como se nem a certeza tivesse a certeza de estar certa. é como se a certeza nascesse da dúvida que a pariu e a ela sempre voltasse para mamar. e quando crescida, e autónoma, a certeza abana perante a possibilidade de estar - não errada - mesmo certa como se, de repente, um bicho atravessasse a sua rua e parasse: e lá se vai a certeza de que rua estava deserta.

quinta-feira, 14 de junho de 2012

e não precisa de selo

querido Passos Coelho,

alerto-te, desde já, que escrevo - e escreverei - sempre sem resquícios do novo acordo ortográfico mas com ironia que baste: de outra forma, seria obrigada a substituir querido por cabrão. escrevo-te hoje por resolver fazer um balanço. minto. escrevo-te porque acordei com vontade de purgar o meu descontentamento e não encontro melhor destinatário para a minha carta que não tu - tu és o meu saco de boxe, a minha bacia de limpeza linfática, o meu rolo de papel, preferido; quem melhor do que tu perceberá a minha frustração, o meu lamento e a minha gana de justiça? és, portanto, um privilegiado por também seres um construtor de ideias falido, um mentor do think tank de nicles, um apoiante à ajuda externa, vai-se o azeite e vem-se o vinagre, com picles.

hoje acordei e fui à janela ver se as finanças estavam estabilizadas e apanhei com a cagadela de uma pomba fodida com a vida.

hoje acordei e fui à rua, a correr, ver a alegria dos mais necessitados: fui assaltada por esticão e, de seguida, atropelada por um assaltante de carros em fuga.

hoje acordei e ainda estou de olho no crescimento da economia e do emprego. e sabes que mais? ainda não tomei o pequeno almoço por preguiça e marasmo - a padaria que fica mais perto também já fechou e os bons padeiros devem estar a coçar a pulga no centro de emprego da póvoa de varzim.

mas se eu vivesse em massamá, não escrevia aqui nem acolá: tocava na tua campaínha e, sem esperança que me abrisse a porta a das doce, a ex-bem-bom, tinha uma olho-no olho contigo, conversa de pé de orelha, onde soltava a minha língua fugidia e havias de torcer o rabo à porca. faria, assim, uma espécie de cozido à portuguesa, com ares de selecção, porque afinal o que é nacional é bom, e metia-te um frango dos de verdade por não me falhar a vontade.

com pimentos e sardinhas porque os santos não vacilam,

Olinda

(agora vou ver se chove, que é para colocar bacias a apanhar desperdício de água para as descargas)

terça-feira, 12 de junho de 2012

funiculì funiculà

Strauss pensou tratar-se de folclore para plagiar - como se, mesmo não o sendo, o povo fosse argumento para fraude lícita. como se musicar um vulcão que é o amor, ou o amor que vive num vulcão, fosse coisa vulgacha, daquela coisa de quem conta acrescenta um ponto ou de quem canta seus males espanta. não: celebrar um plano inclinado para chegar ao vulcão é nobre; gritar que o topo gira à volta de alguém é maravilhoso.

escolho esta versão:


sábado, 9 de junho de 2012

o silêncio dos inocentes

e se me perguntarem se gostava agora, depois de tantos outros, de tirar um curso de gestão eu sei bem que respondo que não -  ando a aprender, a meu ritmo e tempo, a fazer gestão do silêncio.

sexta-feira, 8 de junho de 2012

da putíssima verdade

pois bem: li ontem de relance uma frase bem curta, o que quer dizer que se não fosse de relance de relance igualmente seria, que levanta a ponta do véu sobre a possível homossexualidade de Fernando Pessoa. talvez, penso, isso explique a misoginia e o anti-feminismo, sim, mas não constitui argumento para a sua putíssima, valente, falta de acção, e de erecção, com a Ophélia. ou a sexualidade não é inteira que abrange ao mesmo tempo, e de igual forma, tanto o corpo como a alma? e ele, tão apaixonado que estava, não se fez homem nem dela mulher porque saciava a alma nela e o corpo noutros corpos, ou num só, iguais aos dele - um mundo de pénis e testículos duros obedientes à vontade alheia? fiquei confusa e cada vez mais simpatizo menos com ele. e ainda bem que ela, a Ophélia, casou com outro. vai-se a ver e o flagrante delitro foi mesmo uma mensagem, em imagem, para mostrar - escondendo - o que sempre escondeu. e se assim foi, ela foi um mero objecto de dilúvio do que ele realmente queria ser e não do que na verdade era - posso pensar tudo, este FP tira-me do sério. mas também li uma crónica do Pedro Mexia sobre a verdade em que se não pode amar a verdade se não se a conhece. agora é que acabei de nomear a confusão miss universo.

(como se a beleza fosse universal. Olinda, ordeno, vai dar de comer aos vivos que isso passa)

quarta-feira, 6 de junho de 2012

amor-próprio

decidiram viver juntos para namorar, na modernidade viver junto é namorar - não no sentido real do que é, seduzir, encantar, viver o amor com paixão, namorar - experimentar o outro com disponibilidade para conhecimento de outros. na realidade, decidiram separar juntos: as contas não são partilhadas, são divididas; as refeições processam-se à medida dos horários e das vontades de cada um; as conversas e os olhares não existem senão para fazerem prevalecer posições do que ficou pré-estabelecido. na cama, dividem o sexo em uma luta desenfreada, sono e riso por partilhar, para ver quem se sacia mais e mais vezes. cada um sovina para umas férias nas maldivas - o mealheiro, porco gigante a barro pintado de rabo retorcido e frágil perante o chão, é o privilegiado da partilha -, as férias são sempre a lua-de-mel dos adultos, ai as férias!, aquele pedaço de realidade fictícia, o pau de cabinda dos amores de mala de dez quilos. depois acabaram-se as férias, o mealheiro já não é um porco mas, souvenir, uma garrafa de formas estranhas com ranhura grossa. os dias recomeçam a nascer como se fossem um ditado detector de erros ortográficos: cada um é apenas responsável por si porque não há forma de saber escrever palavras pelo outro. e o ciclo de morte a dois segue o seu caminho, nadinha sinuoso, tenebroso: finge que nasce, não cresce, não se reproduz e, em processo de decadência contínua, renasce.
chamam-lhe amor. e é - amor próprio.

terça-feira, 5 de junho de 2012

nunca tinha pensado nisto de o coração parar cada vez que há espirro.

(quererá isto dizer que ando a praticar batimentus interruptus)

terça-feira, 29 de maio de 2012

cúmulo

o cúmulo do defeito é o excesso. exemplo prático: todos os alcoolizados se sentem os maiores condutores do mundo.

segunda-feira, 28 de maio de 2012

volare

e de dentro para fora
entre sol e chuva
nos toca a vida.
crescem plantas, brotam flores, os sapos seduzem as rãs
e os patos, que acasalam sempre com as patas, escolhem cotovias.
e o rio corre num samba tranquilo, lambendo as margens de fio a pavio, em originalidade de hortelã, freios de chocolate amargo, que doce já há
 funicular até ao céu!, ouço em voz de autoridade, sem zangar, e a cumprir com gosto, que os ouvidos que se tocam e se cheiram foram um presente,
dos seus,
do amor que é deus.
do amor que é deus.


http://youtu.be/V5PJ0YXrIOA

sexta-feira, 25 de maio de 2012

o que eu gosto de bombas de gasolina muito mais do que o Jacinto Lucas Pires

é universal: não se pode nem usar telemóvel nem fumar em bombas de gasolina pelo grande risco de explosão. ora eu, que não sou leiga em energias de activação nem em fontes de ignição, questiono se a energia de um telemóvel será suficiente para produzir uma explosão e vou procurar, quem procura acaba sempre por encontrar, alguma coisa e voilá: Enrique Velázquez, professor de electrónica do Departamento de Física Aplicada da Universidade de Salamanca [Espanha], concorda comigo e diz que "Um telemóvel tem uma energia muito baixa, além de produzir uma radiação electromagnética muito baixa, menos de um Watt".


são as boas e as más, as falsas e as verdadeiras, teorias que suportam as boas e as más, falsas ou verdadeiras, práticas. o que é que se costuma fazer quando está um deficiente motor, o empregado mais antigo da casa, de serviço na bomba e que esperamos cerca de meia hora em fila para sermos aviados de combustível? usa-se o telemóvel nem que seja apenas, como eu, para apagar as 543 mensagens acumuladas. na verdade, se o mito for desfeito, as empresas de telecomunicações e as gasolineiras só têm a ganhar - uma campanha de aliança faria aumentar as receitas para ambas: estás a ligar de onde querido? da bomba, estou a aguardar e a aproveitar para falar contigo. sério? isto merece uma comemoração quando chegares mais logo. e ele, entusiasmado, feliz, quando chega à sua vez de carregar, ou pedir para carregar, no pistão da gasolina ou do gasóleo, vai atestar o depósito (a satisfação antecipada do que vai acontecer acontece mesmo ali a segurar num pistão, e chamo-lhe pistão para dar ares de música, numa bomba de gasolina).


passemos agora à questão de fumar: enquanto o tal deficiente motor anda para lá e para cá, moletas raivosas, a causar filas de trinta metros para abastecer, sabe-me pela vida acender um cigarro. ou dois ou três. mas não se pode - não se pode fumar nas bombas de gasolina que são o local mais acessível para comprar cigarros. onde é que vamos comprar cigarros a esta hora? vamos à bomba. é verdade, a demência vive na lei. se por um lado eu (não) me sinto obrigada a sentir que estou a pecar por fumar dentro do meu carro quando estou, parada e ignição desligada, a aguardar o serviço - por outro devo sentir-me aliviada por finalmente renovar o meu stock de cigarros. e onde? na bomba.


é bem mais provável que o pingo doce expluda pela elevada concentração de cheiro a chulé e a sovacos aquando do milagre da promoção da carne do que um cigarro provoque explosão num posto de gasolina onde, supostamente, se as regras de segurança estão a ser cumpridas, não há perigos à espreita - assim como será mais provável que seja a energia da bateria de uma viatura qualquer a causar uma explosão. mas nessa altura a culpa será do telemóvel ou da pirisca.

quarta-feira, 23 de maio de 2012

deturpar também é preciso

a propósito dos sonhos, ah! os sonhos!, aquela terra onde todos chegamos sem sabermos como e sem exercermos qualquer tipo de controlo porque cada vez mais ser humano é ter controlo, dos sonhos durante a pequena morte que é o sono, é mesmo importante considerar que apesar de a maioria das vezes serem revelações de desejos escondidos - ou por concretizar - nem sempre é assim: tem vezes que sonhamos, tenho a certeza, com as cabeças trocadas de gente. talvez o mais importante, na experiência que é o sonho, não seja o que vemos, aquilo parece tão real - e é - que até mete cor (se fossem a preto e branco a sensação de passividade e de estado de repouso chocava com o que é ser movimento de realidade), mas o que cheiramos e sentimos. é como se os sonhos fossem cegos, parcos de visão e maneiros de outros sentidos. os sonhos são sentidos - e também sem tidos nem achados - entram sem bater e saem porta fora sem sorriso nem cumprimento, os sonhos são rudes no trato. mas é durante o tempo que só fica, sem aviso nem promessa de voltar, que o sonho vive: umas vezes faz-nos felizes e outras deixa-nos miseravelmente tristes, como quando nos tira alguém que amamos e acordamos esganados de aflição. nessas alturas os sonhos são dor que desatina sem doer.

nos sonhos nada se cria, nada se transforma: tudo acontece sem controlo e sem coador. se o Freud, ao invés de relacionar tudo o que é ser humano com o desejo sexual, se tivesse focado na posição horizontal do sonho pelo sono como um forte indício de equilíbrio - talvez hoje a necessidade de controlo estivesse em processo de esvaziamento. é o controlo que fode tudo e será a foder que se perde o controlo, penso. só que se não houver,  antes e durante e depois, catártica vai tudo a correr para o sonho. 

(há-de ser mais ou menos assim a minha deturpação sobre os estudos do Sigui.)

terça-feira, 22 de maio de 2012

olha o provérbio actualizado

em maio come-se cereja p'ra caralho

(e fica em aberto, a frase, porque entretanto tudo o que as caganeiras não precisam é de barreiras arquitectónicas. é verdade, as caganeiras têm uma costela de mobilidade deficiente - vão e vêm de rampante)

sexta-feira, 18 de maio de 2012

mistério, digo eu.

obviamente que tenho nada, absolutamente nada, contra Lisboa ou contra os lisboetas. gosto muito, até, da elegância com que pronunciam as palavras como se estivessem constantemente a fazer biquinho à boca fechada; gosto tanto da luz, da claridade e da largueza das ruas; gosto muito, também, do maneirismo a roçar o espanhol, aquela coisa de esticar o dia noite adentro de convívio. gosto de muitas mais coisas. só não gosto que o sitemater insista em dizer que estou em Lisboa, não obstante a elegância, a luz, a claridade, a largueza e a festa - não gosto porque sou do norte, nascida e crescida no Porto e Vila do Conde escolhida, há três pares de anos, para viver. e como nunca rejeito nada daquilo que me faz, que me faz ser, fico ofendida com isto de aquela coisa afirmar com convicção que estou em Lisboa, como se tivesse o direito de mexer na minha identidade, alterar-me o sotaque, acrescentar-me pastéis de belém em vez de natas, fazer-me um biquinho quando sou portadora de uma bocarra. e depois ainda festeja, ignorando o que quero, como se eu gostasse de foguetes e de canas. por que caralhos é que isso acontece, não sei: é um mistério. e o que vale é que gosto de mistérios.

quinta-feira, 17 de maio de 2012

acossar: já chega

a propósito de perseguir, de acossar, há disso em todas as variantes possíveis: há quem seja constantemente inoportuno na rua ou no talho, no emprego, nos sonhos (até nos sonhos) e nos blogues. o problema da perseguição nos blogues é nenhum, se atendermos ao facto de só haver efectivamente um problema quando é passível de resolução. ora havendo um problema que é facilmente resolvido, ou contornável, o caso fica bravo quando de cariz público passa, a sarna, para privado. temos sempre a opção, em qualquer uma das variantes mencionadas exceptuando o sonho, de activamente travarmos o abrupto cuja iteração o torna perfeitamente expectável. menos quando a abordagem salta de um blogue, um local público que pertence talvez a um cae criativo ligado à indústria da saúde e bem estar, para um endereço de correio electrónico - morada de um lar, local absolutamente privado, como se nos metessem cartas abertas, sem envelope, por debaixo da porta. somos, então, obrigados a ler e a ficar, nem que seja por segundos ou minutos, com as mãos sujas e os olhos manchados. passamos depois a limpo que o que é lixo ao lixo pertence e não deixamos que nos afecte - ou pelo menos assim queremos. mas as palavras têm força, talvez a força se muscule de intenção, e por vezes são, de facto, punhais. espera-se, então, que o tempo, pelo menos o tempo que conhecemos nesta dimensão, transforme o acossar e o dissipe. talvez estas minhas palavras tenham força. talvez.

terça-feira, 15 de maio de 2012

por que raios e coriscos havia de pensar, como queriam, em uma antena?

pedem-me que relacione, muito rápido, parabólica com maçã. sem dificuldade respondo que, sem rapidez, se não a como apodrece.

segunda-feira, 14 de maio de 2012

foder não é para qualquer um

dizem uns que ler é sexy, outros dizem que é um acto de amor. eu digo que é entre o instinto e a intuição - esta última que é bem visto o instinto da alma -, o pensar, o saber pensar, que se situa a base da sedução que depois traz o amor. ler, per si, não é sexy - é sexy conseguir fazer da leitura um joelho a descoberto ou uma copa larga de mama onde se adivinha um mamilo grande; é sexy escolher e cruzar o que se lê, joelho e mama a descoberto em intimidade, concretizar amor. e depois não há leitura sem escrita, novamente volto a dizer: escrever, per si, não é sexy nem resulta em amor - só pode seduzir quem sabe bem pensar e só pode amar e ser amado quem depois de sucumbir à descoberta do joelho e da mama se faz iterativamente amor. também a alma tem carne, tal e qual como o corpo tem alma, e se cumpre de amor em fluidos agitados e fundidos. e é quando, precisamente, a alma está fundida, e fodida, que, sedução sempre erecta, há amor de ler e de escrever. e é por isso que foder não é para qualquer um.

segunda-feira, 7 de maio de 2012

de alva sete sois


cumpre-se a estrela
fundo barrado a canela
romance no quarto do céu
mais brilhante do que nunca
é de alva
é fundida
em torno o tempo é de moios
como se num momento sete sois

domingo, 6 de maio de 2012

uns falam em economia verde como motor de arranque para contornar a crise, outros em economia social. falam, falam, falam e esquecem que para haver arranque tem de haver investimento no motor. e enquanto isso, arranque por arrancar, o povo canta e bebe e encontra nas farpas e alucinações a maior alegria do mundo. é mais ou menos assim:


sábado, 5 de maio de 2012

estação de serviço

quando um desconhecido chama, raiva na voz, lésbica a uma mulher, após algumas horas de penetra de conversa mole, é porque, garantidamente, se sente frustrado. o que quis mesmo dizer, coragem murcha, foi porque caralhos esta gaja não se deixa seduzir por mim? mais: andará o resto da noite com uma nuvem preta por cima da cabeça, como se a mijar-lhe em cima, a pensar que a tal mulher só pode ser lésbica. e frígida. e cega. e burra. e acabará por ejacular, ego ferido no peito, na oportunidade mais próxima. o processo de sedução da modernidade é, sem dúvida, uma estação de serviço.

sexta-feira, 4 de maio de 2012

https://www.youtube.com/watch?v=g2KstIkFPIU

é a solidão a fonte e a foz: um mundo gigante por debaixo do mundo dos mundos onde a fixação pela descoberta da existência se mistura entre o palco encenado e o palco da vida- tamanha a triste miséria egoísta da solidão, inocente e frágil bebé, sempre a solidão. e o amor escondido, adiado, sempre adiado, e a urgência de inadiar o inadiável, sempre adiado, é cruz nas costas: ininterruptamente pesado corrompe-se, sem nunca se deixar corromper, com a leveza pesada do sexo. é a solidão, menina velha, a fonte e a foz: um mundo destruído, gigante, por cima, do debaixo, do mundo, pequeno, dos mundos, grandes, onde a existência se perdeu em existir - tamanha é narrativa em desejo por narrar.
a solidão é um lugar estranho, um bicho, corrosivo e contagiante; a solidão vive no mundo das bactérias, grandeza erecta, e, deixando rastos, contagia. e mata. e é assim a vida dos mortos em travessia de vida.

quinta-feira, 3 de maio de 2012

borrões

há a chuva, há o sol, há o vento, há as palavras, há a música, há os cães, há as árvores e as plantas, há a cozinha, há os pêlos dos homens e as vozes e os cheiros. e depois há o irs e o iva e as facturas e as filas e os rolos de papel higiénico que metem nojo para abrir, borrões de tinta empastados na minha tela.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

olhir

ver um pássaro voar é tal e qual sentir uma lágrima cair: é tanta, tanta, beleza que vês - como quando cai uma, miss transparente, delicada, vê(e)m-se logo duas ou três.

domingo, 29 de abril de 2012

é couto e quero souto

nebrina mas pouco
mais do que da noite couto
porém tanto a navegar
é janela ante janela, vidas feitas por trás dela
outras tantas de fogos amenos
 por apagar
faz-lhe falta o souto
por entre vielas cuspidas
filhas da noite que esquecem o dia
a verdade do que é ser janelas
do que é ter janelas garridas

dom marrom


dom marrom, bico aguçado
em bicos de olhar pendurado
assobia
sabe bem mais do que ontem sabia
das sombras de fundo de fim de dia
códigos de vida barrados
simples
sem amanhãs, depois, pendurados

quinta-feira, 26 de abril de 2012

um mimo de mima

está bem, gosto de poesia e de romance - de embelezar tudo o que a vida tem: fazer dela rainha. e o que é que a casa mima tem de romântica? tem, precisamente, tudo aquilo que eu lhe poderia, e posso - a fantasia é um principado -,  acrescentar.

terça-feira, 24 de abril de 2012

suicídio

não conheço dor maior do que a de ouvido - e será por ela, um dia - na noite - nele, que cometerei suicídio.

segunda-feira, 23 de abril de 2012

ternura

olhos que se fazem tremura, no chão, são espelhos vistos do céu, pois são, em líquidos de ternura.

sábado, 21 de abril de 2012

fodeu-se, quilhou-se

bastou um dia para me encher daquilo: caixa de email a abarrotar de notificações e eventos e nhanhanhãs. a derradeira conclusão é que não tenho, de facto, paciência para a treta do fb. a reactivação em uma mão e a desactivação em outra parece-me uma excelente acção de abril. viva a falta de pachorra e a revolta da convicção!

sexta-feira, 20 de abril de 2012

bem-vindo novamente ao facebook

as vontades são espontâneas, não podem ser de outra maneira. de repente, reactivei a minha conta do facebook, pouco mexi naquilo que tem que ver com há alguns anos, percebi que percebo quase nada das ferramentas, vi que posso colocar um fundo, não sei como colocar coisas que me interessam, continuam a ser mais do que muitas as pessoas que não conheço e que me enviam convites de amizade. está bem, não vejo por que não aceitar, mas fica o aviso à navegação: sou uma calada, não bato papos inúteis, não tenho grande paciência para fotografias de gente - mas gosto de cuscar, corre-me nas veias a curiosidade e o vírus do interesse.

andar

retrato de brasão, riso em punho, moldura a cavalgar, são homens - diamante a ouro lembrados, filhos do reino de junho, calor a abraçar, prata polida, titânio suado, nevoeiro sem mistério: andar.

dicas enganosas

a propósito das dicas amigas do ambiente e da carteira, que mostraram na televisão, para limpeza da casa, em que são usadas claras em castelo para limpar molduras douradas e repolhos e sal para limpar carpetes tenho a dizer o seguinte: fica mais barato, e não há desperdício de comida, comprar uma embalagem limpa vidros que é o melhor removedor de sujidade que conheço - além de que o sal entranhado nas carpetes é quase impossível de aspirar.e o repolho massacrado cola-se ao piso. deviam começar, as senhoras das dicas, por experimentar o que sugerem, evitando assim o engano dos espectadores, antes de deixarem as sugestões milagrosas que tanta falta fazem na cozinha. a única coisa que efectivamente resulta é a passagem de limão, ou vinagre, no calcário das torneiras.

quarta-feira, 18 de abril de 2012

pascer

emoldurado olhar
tom sobre tom
pascer
mónade
(pára quieto, !truão!, !chocarreiro!, não se brinca c'a saudade)

terça-feira, 17 de abril de 2012

as casas de banho não iludem

consegui, finalmente, convencer uma amiga que na noite tudo é ilusão - as luzes, os sorrisos, o brilho dos olhos - menos as casas de banho.

segunda-feira, 16 de abril de 2012

arrostar é preciso. estamos cá.

vi ontem, pela primeira vez, esta publicidade e gostei mesmo muito - cativam-me os contrastes que dão sempre vontade de arrostar. e é por isso que eu mudava o slogan já, de imediato, retirando o "Portugal está a chamar. Vamos lá." substituía por arrostar é preciso. estamos cá.

domingo, 15 de abril de 2012

relações de número atómico 14

o pai de uma grande amiga é o maior cirurgião do mundo: consegue convencer, após poucos meses de convivência sexual, as namoradas que vai tendo a colocarem silicone nas mamas.

sexta-feira, 13 de abril de 2012

serpente, rouxinol, cotovias, caracol


lampeira explora o lugar
docemente
assim como faz com astúcia a serpente
importa luz exalar
por lá e por aqui
qu'a vida é isto de se ver
:
corar a alma ao sol
sabão e água dos dias
a canto de rouxinol, anjos de cotovias, em cornos de caracol

quinta-feira, 12 de abril de 2012

que chatos

a insistência no assunto titanic é um revivalismo que, de facto, mete água.

fixidade

afasta-se os verdes com as mãos em silêncio
delicadeza
como quem descortina um conto de era uma vez na natureza
agarra-se o frasquinho de tampa risonha
à homem inventado
cidade
e cheira-se o aroma
 mistura de sol com chuva
ventos de tempo
fixidade

quarta-feira, 11 de abril de 2012

saudades

ai que saudades. acordei com saudades das minhas avós. a Maria Argentina, mãe do meu pai, conheci-a teria aí doze anos quando chegou do Brasil para uns dias na quinta da tia Filomena, no Douro, onde passei alguns verões. foi com ela que aprendi a fazer renda e malha e foi ela quem me deu as primeiras agulhas e os primeiros fios. em Tões, na aldeia onde se chegava em caracol depois de passar a Régua, tudo era calmo e foi lá que descobri a beleza da fonte do largo, dos tremoços secos do monte, dos passeios dos bois que madrugavam com merda colada no rabo e das gentes aperaltadas em domingo de missa. a Carolina, a avó materna, tinha-me um amor gigante: aos oito anos quando a mãe morreu e vivi com ela e com os padrinhos, os banhos que eu lhe dava eram uma festa de perguntas e de espuma. foi com ela que aprendi a fazer tranças - fascinava-me a finura e a brancura dos seus cabelos. certo dia apareceu com um presente, um dos meus preferidos até hoje, uma saia amarela que usei vezes sem conta até gastar. morreram ambas ainda eu era adolescente. ai que saudades.

terça-feira, 10 de abril de 2012

olá, gostei muito.

fascinam-me as retrosarias. e quanto mais antigas, melhor. são as fitas, e os botões, e as rendas, e os apliques, e os tecidos, e as pedras, e os brilhantes, e os saquinhos de papel onde se embrulham estas preciosidades. hoje descobri uma que tem uma voz gravada, mal se entra, que diz: olá, espero que gostes. e também eu respondi olá na entrada. e quando saí fiz questão de lhe dizer que sim, que gostei muito.

risos na voz

fim de tarde em reclamação a serviço de apoio a cliente, ouço aquela voz. pergunto novamente o que já tinha perguntado para ouvir mais, não o que ele tinha para dizer, da voz. uma coisa é gostarmos da voz de alguém que conhecemos e gostamos - gostar de alguém e também da voz; outra coisa é gostar da voz sem conhecer o que quer que seja de alguém - gostar da voz sem gostar de alguém - como se a voz fosse, e é, alguém. interrompo-o e pergunto-lhe o que está ali a fazer. diz-me não estar a perceber. explico que deveria estar na rádio, incansavelmente, a dançar palavras. risos. pergunta se pode ajudar em mais alguma questão e digo que sim: pergunto se vive perto e, questionando-me porquê, diz-me que não. porque se vivesse tinha mesmo de vir lanchar comigo. mais risos, risos na voz.

segunda-feira, 9 de abril de 2012

rabiças

rabiças de uvas desfeitas são como bois de arado no dorso: em água ou em terra traduzem o momento, quadro de cor em tela , jornada de sustento.

sábado, 7 de abril de 2012

lustre, lustre, lustre

ai! lustre de lustre
em lustre mais uma vez
conta-se a que derrama raízes e fios d'ouro vivos
e depois a que carrega o afastar da 'scuridão
ai!, lustre, por fim,
o conjunto, tripé de lustrina,
beleza em imensidão
(em imensidão fina)

sexta-feira, 6 de abril de 2012

a favor

passou, por mim, um carro da GNR e, olhares cruzados, lembrei-me da Catarina Eufémia, ah ceifeira de ovários caseiros e bem alimentados, mas este tipo de flashes ainda levará o povo a dizer que sou comunista, comunista filiada. penso, entretanto, pelo caminho, que para ser uma revolucionária como ela eu teria de me sentir oprimida e reagir contra. mas eu sou uma rebelde, que é bem diferente, vivo fora da bolha, e todas as minhas reacções são a favor. a favor da minha alma. é isso.

quinta-feira, 5 de abril de 2012

mário soares em analogias na estrada

(parece-me mesmo bem que o estado seja obrigado a pagar uma multa por andar, fora da lei, em excesso de velocidade)

quarta-feira, 4 de abril de 2012

(vagina triste a dela)

ouvi dizer que a ginecologista lhe receitou pomada e outras coisas para uma inflamação na vagina . disse-lhe que sei de outra cura porque uma vez, talvez causada por um qualquer insecto que terá gostado das minhas cuequinhas enquanto secavam ao sol, experimentei isto: arranjei aloe vera natural - por aqui é fácil arranjar, há em qualquer jardim -, lavei muito bem. depois aparei-lhe os picos dos lados e cortei-lhe as pontas e, sempre com uma tesoura, recortei a peça em rectângulos finos e do tamanho do dedo mindinho. (apenas uma pequena observação muito importante: só se pode recortar mesmo antes de usar senão não faz efeito porque seca todo aquele molho que vai largando) antes de deitar, introduzi três ou quatro rectângulos na vagina e dormi tranquilamente. o que aconteceu foi que durante a pequena morte toda a seiva maravilhosa da planta passou para mim. e de manhã, naturalmente, quando fui libertar as primeiras àguas saíram os pequenos rectângulos, como que chupados pela vagina, incrivelmente secos. e bastou repetir duas a três noites para repor o vagilíbrio.

não acreditou, riu, e prefere andar a colocar pomadas e outras artificialidades. está bem - não sabe, como eu sei, que as vaginas devoram, porque adoram, o molho de aloe vera. talvez façam, até, de propósito para inflamarem só para poderem chupar os rectângulos como se fossem gomas frescas.

(vagina triste a dela)

terça-feira, 3 de abril de 2012

olhos de ficar

pardos são os olhos
veranistas, obcónicos, que vêem sem cor
as águas fortes como se paradas
as cúpulas como se cimeiras de dor
são pardos os olhos, são,
que atentam o meu olhar
pracejam não praziam
trambicam por aí o ficar
pardos são os olhos, são,
debatidura, detruncar

segunda-feira, 2 de abril de 2012

domingo, 1 de abril de 2012

pormenores gigantes

depois de descobrir exactamente que nome dar à enorme fatia folhada, maravilhosa, cujo recheio se torna quase - quase - indecifrável ao olhar e paladar, blimunda, descobri também que não sabiam, nem sabem, nem vão procurar saber, o que é ser blimunda e, depois, blimunda renovada.

(até dá vontade de dizer: sim, é blimunda. mais sete vezes vão todos para a puta que vos pariu)

quinta-feira, 29 de março de 2012

bravo!

Sem peias nem travões

fantasias de piriquitos

imaginei-os ao sabor de uma chuva torrencial, esboaçar de alegria, com o mesmo entusiasmo com que saltitam ao sol. e não tive mais nada: liguei a mangueira e encharquei-os com abundância. agora, ficamos todos consolados - eu satisfiz a minha fantasia e eles, na realidade, adoraram. talvez isto tivesse acontecido, penso com convicção, porque simplesmente terei absorvido o desejo deles e o que imaginei foi, nada mais nada menos, o que eles queriam e me passaram naquela língua estranha e aguda, que sai dos bicos de ponta fina e arqueados, que é a deles.

quarta-feira, 28 de março de 2012

funlo

a definição de fungo, no dicionário, diz que é uma excrescência esponjosa na pele ou nas mucosas. a minha é bem mais simples: fungo é um parasita filho da puta, um chulo, que anda a viver à custa do meu pé.

terça-feira, 27 de março de 2012

reclamo - logo existo.

a maior diferença entre deus e o quintal do vizinho é que o vizinho reclama se alguém lhe atirar com lixo. será esta a maior, e mais irrefutável, evidência de que deus não existe?

domingo, 25 de março de 2012

filetes de peixe gato (ou outros quaisquer) no forno


numa frigideira, ou sertã à moda do norte, deita as cebolas cortadas em rodelas, um dente de alho picado, uma folha de louro e rega generosamente com azeite. tempera com sal e leva ao lume até que a cebola fique mole. retira do lume, deita fora o louro, e espalha no fundo de um tabuleiro que possa ir ao forno.

lava bem os filetes e seca-os com um pano ou rolo de cozinha.
num prato, coloca o ovo e bate; noutro, o pão ralado - tempera com sal e pimenta e mistura muito bem. passa um filete de cada vez pelo ovo e de seguida pelo pão ralado (o chamado panar).

no tabuleiro, por cima da cebola, coloca um filete panado e por cima deste bastante queijo e por cima do queijo coloca outro filete. e vai fazendo assim até que se acabem os filetes, colocando-os uns ao lado dos outros.

corta as batatas em meias luas e mete-as ao lado e em volta dos filetes. polvilha tudo com o alho picado, rega com um pouco de azeite e leva ao forno até que os filetes fiquem bem douradinhos e as batatas assadas.

serva bem quente e entra no reino dos céus.

sábado, 24 de março de 2012

bombaré

e no momento da fusão
uma e outra sussuram o corar
é asas com asas, é,
é riso com riso, é,
é orelha com orelha
e colocam o biombo, fecham-se ao mundo em couces
assim é a parelha onde não cabe sensaboria
é fabordão
dabom
gabão
e depois pabulam-se, sim senhor, ai! como é pabular
quando um beijo não é beijo
é bombaré
que atravessa o tempo e o lugar
sobrevoa o céu, cânhamo de ar
e aterra, sempre a planar, no pé

menuro

viemos, e estamos, sozinhos e do vestido se faz nu: em redor há menuro, há, que ora pinta a garrido ora despeja tons de cru.

cantil

é beleza
como se água a tiracolo
cantil
espalhada no alto
no baixo
no centro dos olhos que procuram
e encontram
existência elevada a mil

sexta-feira, 23 de março de 2012

estilo de morte saudável

a CM de Matosinhos acaba de proibir o uso de flores plásticas nos cemitérios e os argumentos caem na prevenção de incêndio, por ser mais fácil erradicar o risco pelas flores de plástico do que pelas velas. e eu, cá no meu canto, imagino que os mortos hão-de estar a morrer de riso por saberem que vivem sem correrem qualquer risco de morrer. será caso para dizer que o município tem fortes preocupações em oferecer, à população, um estilo de morte saudável, qualidade de morte.

(isto merece uma linda banda sonora)



estás a aguardar uma oportunidade para andares da perna com a videomusicalidade que vive dentro de ti?

inscreve-te aqui.

e eu respondo: mudam-se os tempos, mudam-se os à-vontades.

"Bolinha
Houve um tempo em que o aparecimento da bolinha vermelha no canto do ecrã do televisor suscitava perturbação e expectativa."

quem o diz é o José António, O Escafandro, homem de poucas falas mas abundante em pensamentos e boa disposição. conhecemo-nos, há uns dez anos, num curso, na universidade e aprendi imenso com ele e com a sua colega de profissão, a Ana Sofia. eu era a mais tenrinha e aquilo para mim era tudo novo mas tamanha era a vontade de explorar tudo, fiz o que sempre faço: sorvi tudo e todos durante o ano que estivemos juntos e ainda hoje, quando me vejo perdida em algum projecto, é a eles que recorro para me safarem. e a verdade é que me safam e enchem-me de sabedoria e também de alegria: almoçar com o José António e com a Ana Sofia é um gosto e um prazer - há risota pegada e muita conversa boa; há, sempre, sempre, sempre, perturbação e expectativa da melhor e vamos mudando, mantendo, os à-vontades.


(reparei, entretanto, no uso exagerado de tudo no texto. que se lixe, assim vou manter, afinal de contas é a minha palavra de estima, uma das minhas preferidas.)

também gosto do frio

por este andar, dar para bronzear em pleno março em praias ou terraços ou relvas do norte, ainda havemos de poder usar vestidos leves e de decotes em dezembro. não, não quero disso - o que será do encanto das lareiras e da beleza do fogo a estalar e do cheiro como se a chouriço assado, nas paredes, no dia seguinte?

quinta-feira, 22 de março de 2012

triste constatação

a maioria absoluta recai sobre, não os que cumprem, os que falham com a palavra que dão.

(é nestas alturas que me lembro do pinóquio e lhe acrescento uma língua manhosa - a cada falhanço, de uns e outros, havia de lhes começar a crescer o nariz e a diminiur a língua. como eu gostava, ai!, de vê-los, aos narizes mentirosos, a bater nos joelhos e, sem línguas a bater nos céus, com as bocas mutiladas.)

equilíbrio

custa-lhe tanto resistir à repetição de uma dose de comida como fazer exercício físico.

quarta-feira, 21 de março de 2012

para o lanche:

aqui.

vulcão

por dentro dos montes e dos vales e da água que é o cérebro é muito difícil sabermos quando estamos a nadar ou a fazer piqueniques. por vezes acontece cair uma faúlha, do churrasco, na faúla e, pululantes de fogo, travamos o arder. outras, fora de pé, nadamos até à relva como se viver fosse a sentar. o cérebro é um lugar estranho - prefiro a aldeia do vulcão, o coração, por entre lavas quentes e indomáveis, onde a imprevisibilidade - que apenas sobe aos montes em pequenas promenades - é reina.

terça-feira, 20 de março de 2012

bigodes grisalhos d'amor

 :
em grisalho tom ouvem-se histórias
 façanhas
 lições do dever e do fazer
 como se em bigodes fartos se pendurasse o ser
e é, assim, gostar - não de cal - de pedra
preferir a amêndoa à flor
 como assim só pode ser
 grisalho
 e em bigodes
o amor
.

segunda-feira, 19 de março de 2012

homens que fazem gluglu

diz-se que os homens não têm grande capacidade para suportar a dor física. isto até pode ser verdade mas apenas se não levarmos em consideração a questão, aquela, a the one, a que move montanhas na modernidade, estética. vi eu com estes olhinhos negros azeitonados e brilhantes que um dia nem a terra há-de comer, porque os olhos não morrem, um amigo de uma amiga, tronco nu, esticado na cama, a ser completamente torturado com cera. o rapaz, branquinho como a farinha triga, ficou como fica quem apanha um escaldão e com aqueles mini-raios roxos como fica quem se esfola quando dá um tombo. optei por ir para a cozinha preparar frango com cogumelos e massa com natas para o jantar enquanto digeria, em lentidão, o que tinha acabado de ver: um perú prestes a ser besuntado. 

os homens já não querem ter pêlo no peito, é o que é, e eu penso como é que é possível fazer-se rolinhos com o pêlo, também do peito, se o arrancam com violência e desprezo com destino final de maldivas d'aspirador? não é: a modernidade dispensa rolinhos e carícias nos pêlos - prefere peitos passados a ferro, sedas de nus, e talvez até pilas esfoliadas. ai que miséria.

sábado, 17 de março de 2012

afinfar

se juntarmos, durante a preparação, mais leite do que água o resultado será pataniscas de bacalhau mais fôfas e deliciosas. é só. é a experimentar que se sobe o degrau. ou, então, é a experimentar que se afinfa o bacalhau.

sexta-feira, 16 de março de 2012

a insustentável leveza do parecer

um parêntesis no meio de uma crise existencial - as crises existenciais não são aquelas em que questiono quem sou de onde vim e para onde vou mas as que me reforçam a certeza de quem sou e de onde vim e para onde quero ir pela incerteza de poder ser quem sou e ir para onde quero, a primeira foi há cerca de sete anos e isso leva-me a concluir, não sei se prematuramente mas com a certeza intuitiva com que me habituei a viver, que entro em curto-circuito ao fim de ciclos de sete anos - foi uma oferta bem atrasada de aniversário em pura, total, poesia: um bailado russo em lago de cisnes no edifício mandado construir pela companhia de seguros garantia: o coliseu. não importa que os bailarinos não estivessem perfeitos em tempos nem em equilíbrio, estariam uns e outros (pode ser) igualmente a completar o pacote dos sete anos de vida, mas a magia da leveza, não só em pontas, da ponta dos pés até ao tecto alto, bem alto, que me transportou para o bico dos sonhos de olhos abertos. e cada passo, como se o andar fosse (e é) enfeitar cada movimento e procurar em cada um o mais leve respirar e a mais intensa concentração de amor; como se a vida se fizesse em cada arfar de melodia e se cada som tocasse violino para cada movimento e se a orquestra dançasse para nós e eles, os bailarinos, tocassem movimentos para ela. e tudo se confunde, entretanto, no palco da poesia: os bailarinos sou eu e eles são a orquestra e eu sou as pontas dos graves e dos agudos e ela dança vestida de tule.

e o parêntesis, em aberto, transfoma-se no livro e depois na colecção de livros e, enfim, na livraria privada. e quando chega a hora de fechar o parêntesis - talvez não passe de isso mesmo, penso, de um parêntesis no meu pensamento que se recusa a aceitar que a minha vida não pode ser uma livraria mas apenas uns e outros parêntesis -, a leveza contagia. contagia tanto que já dormi e ainda julgo que a minha vida é, como não deixam que seja como eu quero, leve.

tenho mesmo de partilhar

o mano mais gato do mundo. ai! como está garantida a minha satisfação! :-)

(meninas, não se esbarrem na estrada: os outdoors andam aí)

quinta-feira, 15 de março de 2012

escândalo

escândalo. dizem-me ser um escândalo recusar a visita de uma prima que considero uma estranha; que é um escândalo considerar uma estranha alguém que tem o meu sangue. tretas, tudo tretas, não é o sangue que nos faz sentir proximidade e vontade de estar e de receber. não quero saber se é prima, se pegou em mim ao colo ou se gosta mais de batatas do que de motas, e não tenho vontade, nem curiosidade, em vê-la e ouvi-la. não faço fretes e isso é, dizem-me, um escândalo.

(pois para mim escândalo é o telefone desligar-se, sem me dar aviso prévio nem explicação de silêncio, e eu não me lembrar do pin. e ainda me ameaça, o cabrão, dizendo-me que só tenho mais uma tentativa. isto, sim, é um escândalo.)

quarta-feira, 14 de março de 2012

depêlação da areia

bem sei que talvez nesta altura seja um desejo de luxúria mas as areias das praias deviam ser tão asseadas fora como dentro da época balnear pois as areias são assim uma espécie de pernas da água que são precisas para andar até molhar e as pernas querem-se sempre sem pêlos ou não fossem os pêlos as ervas daninhas da maciez dos jardins.

segunda-feira, 12 de março de 2012

fura-nos fode-nos faz-nos

soltem-se as borboletas da caixa
deixem-nas, zonzas, voar
como se o tempo fosse demente
e estridente
e carente
assim como voam os mosquitos celestes
as pragas dos cheiros campestres
já que o amor não é docemente
e amar é sempre contra a corrente
com força
com a força da rocha que se agarra ao mar
e do rebanho solto no monte
raízes debaixo
por debaixo
das sete saias da seiva de viver
o amor é um bicho que pica
fura-nos
fode-nos
faz-nos
para não nos deixar morrer.

generalidades atemporais

um casal, quando quer engravidar, esforça-se ao máximo em iteração sexual. curiosamente, este reforço traduz-se em aumento do tempo do resultado positivo.

(não há mistério: a energia sexual, vernácula, é espontânea e não usa cartão de ponto.)

domingo, 11 de março de 2012

generalidades atemporais

quando se tem frio, e se pode, mete-se as mãos no meio das pernas.

(não há mistério: a virtude é quente.)

o azeite no sapato

já não me lembrava de me chocar com isto, quero dizer com aquilo, de me cruzar com um homem e de fixarmos o olhar e eles, os olhos, irem descendo à procura de mais pontos, os olhos também buscam a completude, e de gritarem socorro! acudam! quando chegaram aos pés. é curiosa a força que uns sapatos azeiteiros, o que categoriza o azeite no sapato é o óleo do cabelo nos pés ou as nódoas no peito de uma camisa ou a conversa desinteressante e ordinária de um cérebro, tem num primeiro impacto quando tudo o que se conhece é o que se vê. e depois, quando aflitinhos, os olhos, começaram a subir à pressa para voltarem a apanhar o comboio do regalo, molície de ver, o homem já não tem ponta por onde se lhe pegue: como se a um olhar de sol, ofuscante, se seguisse uma imensa trovoada com chuva grossa. bem visto, o que eu quero dizer é que há banhadas assim.

sábado, 10 de março de 2012

paradoxo

o universo não gira à minha volta.

(o que não o impede de se cagar todo mesmo em cima de mim)

sexta-feira, 9 de março de 2012

lógica e emoção

os homens são, na generalidade, racionais e as mulheres são, cada vez menos, cada vez mais uma minoria, emotivas. e a lógica, a voz da razão, é uma derrubadora, uma vencedora. e a vida é, em deserto de emoções, logicamente uma campeã que esconde e manipula a verdade. importante mesmo é completar a lógica com a emoção. um homem de cinquenta anos e uma mulher de vinte apaixonam-se. passa tempo.
o homem, pura lógica, diz que o que está a acontecer é que, na verdade, ambos têm quarenta anos porque ela, com a sua jovialidade, fá-lo sentir-se dez anos mais novo e ele, pela sua sabedoria, fá-la sentir-se dez anos mais velha. a verdade, a do amor, a única que conta, está a ser escondida com absoluta lógica verdadeira. 
ela. já ela diz, simplesmente, que se amam.

quarta-feira, 7 de março de 2012

oitenta

os olhos são para pôr na mesa: de quatro se faz oito como se o mundo em placenta - não há alegria maior, venham ver, do que deixar o oito e abraçar o oitenta.

um sonho de carcaça

aqui não há desta invenção: o molete é pequenino e tem de se comer dois ou três para saciar o papo. nas carcaças deve caber um ovo estrelado, sem ser encolhido, como se a exibir a cauda do céu. e uma fatia de fiambre inteira a servir de tapete rosado e mais duas de queijo a derreter-lhe, ao miolo, o coração. que maravilha.

terça-feira, 6 de março de 2012

da chávena e do prato

dizia-me ela, na cozinha dele, que faz um esforço de vez em quando: a conjugalidade não lhe faz qualquer sentido, duas camas à moda de hotel é o ideal; o ressonar, o mexer, o hálito da boca de cima (e de baixo), os pêlos curtos e redondos no chão, o cheiro da urina; a roupa suja, o jantar diário. haver, portanto, toda uma separação de males e restar os momentos bons, os que considera bons, que se resumem, bem visto, ao sexo visto que o Q. não é homem de conversas- tampouco de boas conversas. e se ele pensa igual, digo eu a avaliar pelo que vejo, no nojo que lhe mete ver o corrimento nas cuecas dela; o varejo que ela lhe faz quando se levanta enquanto ele ainda dorme e o barulho do secador a entrar pelos lençóis; os pensos higiénicos enrolados no balde umas vezes durante o mês; o que tresanda quando abre a tampa da sanita como se comesse rosas, ele, e ela ovos podres com açucar.

objectos. não passam de coisas, de duas coisas, que se esfregam uma na outra em troca de uns ais sonantes e talvez muitas vezes fingidos, as mulheres-objecto que utilizam homens-objecto costumam fingir essas coisas para ficarem com o argumento dos momentos bons activo, e que servem de despeja-colhões mais ou menos certas e estáveis. que deserto de auto-estima , senhor dos amarrados.

(ora se o que é importante começa depois do sexo e o sexo só faz sentido ascendente com importância concluo, então, que se alguns sexos verbalizassem pensamentos diriam o seguinte dos seus cérebros: tens um qi típico de anedota, da relé ordinária, da chávena e do prato - ai filha tens um cu tão quente. deprimente, miserável, penoso, decadente. oh! lord!)

segunda-feira, 5 de março de 2012

memória do entroncamento

o hospital maria pia vai encerrar. tenho uma memória bem nítida lá e uma outra associada que não sei explicar: a minha primeira consulta oftalmológica, em olhos alternadamente tapados e letras a verbalizar em alta voz, e, depois, a tal memória do entroncamento em que passávamos, eu e a minha mãe, por uma casa de banho pública e dizia-me ela que o George Michael tinha sido flagrado a fazer sexo oral a um estranho em uma. é mesmo estranho, isto, visto que, por essa altura, às tantas o gajo ainda nem sequer gostava de lamber pilas sem rosto em cenário de urinol peçonhento.