domingo, 22 de setembro de 2013

o espelho do mundo





um espelho costuma ter a capacidade de reflectir a luz e, igualmente, tudo que se apresenta na sua face. foi sempre assim: até nascer o josué.




face que a face revelas
nos dias com sol e com luz
mostras as caras do mundo
que sem mistério seduz
assim é o que sempre foi
o ver o que já lá está
aguardemos quem lá vem
o mundo verdadeiramente espelhar
vai nascer o josué
e o mundo vai mudar
a mãe do espelho


rainha e menina da aldeia
curiosa não havia igual
reinava nos sonhos do rio
crescia por fora
crescia por dentro
mas não crescia, enfim
vitória não sabia
que longe dos sonhos do rio
estava já perto do fim

vitória, com apenas treze anos de idade, tinha uma curiosidade enorme em fazer o que cresceu a ver na televisão: homens e mulheres enroscados, gemendo, rindo e que depois se vestiam. aos catorze, a menina percebeu que esquecera alguma coisa (que não via nos filmes) e pariu. tudo começou naquela tarde quente de verão quando decidiram dar uma escapadela ao riacho da aldeia para refrescarem todos, cerca de nove, a pele suada do jogo do “mata” e também a vontade, calada pelo que as pessoas que passavam na rua impunham, de descoberta.

no seu corpo começavam a desenhar-se formas: adivinhava-se, com timidez, a nítida diferença da cintura com a anca; as mamas (ainda em forma de concha) ameaçavam saltar e os humores sortidos, porém sem caprichos de mulher artista, já se faziam sentir desde que o seu primeiro sangue desceu aos onze anos -altura em que igualmente, e pela primeira vez, nadou no rio.

vitória detestava flores e árvores e ninguém percebia muito bem o porquê, até porque foi vezes sem conta apanhada sentada a comer terra, de este desprezo pela natureza viva. ao invés, deliciava-se – horas a fio – a olhar as pedras e a sobrepô-las até desabarem. certa vez enquanto se lambuzava com a terra do quintal, foi surpreendida por um sardão. destemida e determinada, fez questão de o esmagar: primeiro a cabeça, depois o resto e, por último, arrancou-lhe, para expor ao sol até ficarem tesos, os olhos.

as brincadeiras nas margens do rio aumentaram com a chegada da caravana dos ciganos à aldeia, assim como a sua curiosidade acerca de corpos nus em movimento. de tal forma que vitória esperava que os pais se deitassem para espreitar e esperar que se embrulhassem, despidos. foi nesta altura que conheceu o né e, depois de constatar que para ele isso não era novidade, planeou imitar as acrobacias que via na televisão e pelo buraco da fechadura.

 o pai do espelho


cheio de cor e de estofo
com mãos e olhos de fogo
levava a vida a brincar
saltando de terra em terra
saltando de menina em menina
não sabendo que nesta aldeia
o seu mundo vinha acabar


nesse verão quente chegaram à aldeia sete carroças ciganas para uma temporada de habilidades artísticas de canto e de dança. entre os mais jovens: aquele que viria a ser um dos criadores de josué (entenda-se criador involuntário e sem qualquer pretensão), o né das tochas por tão agilmente brincar com o fogo.

completara dezassete anos e fora a maior festa do inverno da última aldeia por onde as caravanas passaram. de olhos brilhantes e sorriso encoberto habituara-se, desde cedo, a seduzir as meninas das aldeias (que se encantavam com as suas habilidades) que sempre os acolhiam com entusiasmo e alegria. durante o tempo em que permaneciam nas aldeias, todas as noites, decoravam o largo das igrejas com fitas e flores; cada membro do grupo cantava ou dançava algo diferente a cada dia vestindo roupas retalhadas que a avó, a mais velha, fazia.

corpulento e desajeitado ensaiava durante a manhã para, durante a tarde, juntar-se às brincadeiras no rio. quando conheceu vitória percebeu o quanto ela gostava de ouvir as suas histórias que eram, na sua grande maioria, aumentadas  - quer na duração dos episódios, quer nos pormenores relatados. era o entusiasmo de ela que o fazia exagerar e, por essa razão, achava que aumentar histórias assim não era pecado: era rebuçado. por falar em rebuçado, as guloseimas eram a perdição do né. todos os dias teimava em saboreá-las até ficar com dor de barriga. certa vez comeu tantos rebuçados que lhe soltou o intestino e não pode brincar com o fogo no espectáculo da noite: serviu-lhe de lição - não fossem as tochas a sua vida, as meninas das suas mãos. descobriu, com vitória, que adorava que lhe mexessem na cabeça: ela catava-lhe as lêndeas e os piolhos, senhorios os seus cabelos baços e desgrenhados, e riam muito quando olhavam para o frasco de vidro para onde os sacudiam. até encher, diziam.

não lhe era indiferente a quentura das mamas de vitória a desabrochar nas suas costas – cresceu a saber que quando se tem fome: come-se e quando se sente vontade: fode-se.


a criação do espelho

o fogo e o vento unidos
sem saberem bem porquê
brincaram um pouco
 juntos
com o rio
à sua mercê

como estava a dizer, naquela tarde juntaram-se todos para um banho no riacho e brincadeiras nas margens. desde o dia em que se viram pela primeira vez, vitória e né, sentiram permissão para se explorarem: enquanto ele relatava as passagens por outras aldeias, ela aproveitava para catá-lo das lêndeas e dos piolhos que faziam já parte da risota de ambos. decidiram, com os olhos - apenas com os olhos -, afastar-se dos outros e  atravessaram o riacho calcando as pedras, muito devagar, musguentas e brincalhonas que aguardavam impacientes um pequeno deslize para se poderem deslocar. era fascinante o poder que a água exercia em vitória: por breves instantes o mundo parava ali. fixava, séria e atenta, os olhos na água. seguiam-se as mãos e os pés. deliciava-se a ver o seu reflexo e dizia sempre que não era ela (o que deixava né confuso e atrapalhado e sem saber o que dizer). ocorria-lhe apenas chapinhá-la e meter lá a cabeça para depois poder sacudi-la e gozar com o afogamento dos seus inquilinos do quinto andar.

chegados à outra margem, vitória (que conhecia o rio como né conhecia o sabor dos rebuçados) assumiu a dianteira e dirigiu a caminhada para uma clareira onde achou que poderiam ficar longe de eventuais olhares curiosos e, desta feita, ensaiar o que viria a seguir. ali ficaram, horas a fio, a aguardar a escuridão da noite e a solidão do rio. Contou - sem pudor e com frenesim - as aventuras vadias em frente à televisão e de olho na fechadura da porta do quarto dos seus pais. né, apesar de atento e empolgado, não sabia bem do que falava aquela rapariga: televisão e portas eram palavras que não cabiam nas caravanas nem na sua vida sem paredes. ainda assim ouviu e imaginou e percebeu que a vontade chegava.

o que mais instigava a curiosidade de vitória eram os barulhos que dizia ouvir quando, escondida, apreciava as acrobacias. descreveu-os como estranhos e despropositados e, para né perceber bem o que queria dizer, comparou-os aos emitidos pelos macacos se aprendessem as vogais. né tinha apenas pensamentos mudos de quem nunca antes tinha parado para pensar nisso.
despiram-se.



vitória estava deliciada a olhar minuciosamente tudo no corpo de né que, por sua vez, comparava as formas de ela a frutos: as mamas lembravam-lhe pequenos pêssegos de bico arrebitado e escuro; o sexo – um figo aberto ainda por amadurecer. foi quando lhe ocorreu perguntar a idade daquele corpo: o mais jovem, e  ainda não sabia, o último, que provaria durante toda a sua curta vida.

os olhos da menina-água fugiram para o sexo, já erecto, do jovem cigano questionando-o se  seria aquela cobra, curta e grossa, a entrar nela. e ele ria, ria tanto que a bicha caía. depois vitória lá pedia para mexer, e ver o que se escondia por debaixo da densa penugem, e a bicha voltava a crescer. sussurrando, meia trémula, que estava a fazer-se tarde e que precisavam fazer o que os tinha levado até ali, vitória dirigiu-se para o rio onde, em passos lentos, entrou. seguiu-se o rapaz, excitado apenas pela excitação de ali estar e não, isso é certo, pelo cheiro e pelo (quase) sabor do cesto da fruta fresca.

estavam ambos nus, ambos na água que lhes cobria a cintura, quando, inesperada e docemente, vitória canta, ao mesmo tempo que né com brusquidão a penetra, assim:

reflexo meu
reflexo teu
 nananananana
onde queria eu chegar
e agora que aqui estou
vieste para me buscar
reflexo meu
reflexo teu
 nananananana

apenas uns instantes e né gemia, as vogais de macaco como dizia vitória, baixinho, baixinho e depois alto, alto até libertar um berro – que já não era de prazer – de aflição. o esperma que jorrava não era, como estava habituado, espesso e branco leitoso. era verde e em quantidade nunca antes percebida: o rio tinha-se transformado num prado a correr. vitória, que tinha fechado os olhos quando entraram no rio, com o susto do berro, que já não era de macaco mas antes de leão,  abriu os olhos e, igualmente assustada, correu para a margem puxando o ciganinho né pelo braço.

não conseguiram falar no rio verde mas prometeram, um ao outro, guardar o episódio com eles até morrerem e esquecerem o que tinham visto naquela noite em que a lua nem sequer estava cheia e manhosa.

no chão (ele) e na cama (ela): adormeceram.




sábado, 21 de setembro de 2013

como se dá uma tareia à febre

banhos gelados ao molhe
até arrepiar o dente
e laranjas com viço espremidas
de deixar o sabor contente
e de manhã
mesmo mesmo ao acordar
beber a brisa d'aurora
imaginá-la como antes de mar

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Vénus

trago comigo as árvores
as flores e o vento
são como Vénus
a que o tempo endureceu a carne cristalina do desejo

quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Se Pedro Passos Coelho lesse Crosby

Quando, há mais de dois anos, Pedro Passos Coelho agarrou a pasta da nação - e aqui convém sublinhar que nação, muito mais do que um aglomerado de gente, implica consciência nacional - nunca lhe terá passado pela cabeça ler Crosby, esse grande senhor da excelência, para ser tratado pelo povo por sua excelência. Haverá orgulho maior, para um povo e para um governante, ser chamado de sua excelência no sentido literal da palavra?

A esta altura, Pedro Passos Coelho, ao invés de se insurgir contra aquele que foi, em início de mandato, um dos seus três melhores amigos, estaria a rejubilar-se de contentamento pela (sua) excelência. Um dos tesouros que Crosby nos deixou para ser usado na gestão em particular, e em qualquer assunto em geral, inclusive na governação de Pedro Passos Coelho antes de ser um valente desgoverno, chama-se matriz de maturidade e foi criada com o objectivo de o progresso ser possível de ser avaliado e apreciado. (Sim, eu sei, no governo de Pedro Passos Coelho parece missão impossível - mas poderia não ter sido, ora veja:)

Pela matriz de maturidade Crosby estabelece cinco estádios para o progresso global de uma organização. São eles a incerteza, o despertar, o esclarecimento, a sabedoria e, finalmente, a certeza que permitem avaliar várias categorias de actividades tais como compreensão e atitude da gerência com relação à Qualidade, o "status" da Qualidade na organização, o tratamento de problemas, o custo da qualidade em relação às vendas, etc. Tivesse Pedro Passos Coelho sustentado a sua governação nesta matriz e estaria apto ao progresso, à chamada melhoria contínua do país, como se quer, através da implementação de catorze fundamentos:
1. Empenho da Direcção
  • É necessário o empenho da Direcção, e não falo de empenho em perseguir o governo anterior atribuindo-lhe culpa pelas actuais más e desorientadas escolhas, de modo a que fosse possível uma melhoria efectiva da Qualidade;
  • Deve ser difundida uma política de prevenção das falhas - o que Pedro Passos Coelho fez até aqui não foi, precisamente o contrário, remediar, tapando rasgões com bocados de tecido importado, alta costura tingida, da Troika?
  • Deve ser desenvolvida uma política da qualidade que refira os requisitos de desempenho individuais necessários para atingir os requisitos do cliente. Está mesmo a ser tido em conta, neste governo, o desempenho - e responsabilidade - de cada ministro?
2.  Equipa de Melhoria da Qualidade
  • A equipa é composta por um representante de cada um dos departamentos ou divisões;
  • Esse representante é o porta voz do grupo que representa;
  • São os responsáveis para que as acções de melhoria propostas sejam levadas a cabo;
  • A equipa serve para coordenar as acções de melhoria da qualidade.
Ora aqui está o espelho do que seria termos um conjunto de ministérios eficientes.
3. Medição da Qualidade
  • É necessário medir o estado de qualidade em todas as operações;
  • Identifica as áreas onde são necessárias acções correctivas e para onde é necessário dirigir os esforços de melhoria da qualidade; Os resultados da medida, que devem divulgados através de quadros bem visíveis, são a base do programa de melhoria da qualidade;
  • A medida aplica-se tanto na produção/serviços como ao número de erros detectados na secção de contabilidade, erros detectados em desenhos técnicos, quantificação de atrasos na expedição, etc.
É precisamente a monitorização - que detecta falhas, por um lado, e projecta de forma clara os resultados, transparência, um dos segredos para a eficiência e eficácia da governação. E aqui, sim, Pedro Passos Coelho, é exigida austeridade no cumprimento da garantia de qualidade.
4. Avaliação dos Custos da qualidade
  • A avaliação dos custos da qualidade (da não qualidade) permite identificar onde se conseguirão obter poupanças pela introdução medidas correctivas ou de programas de melhoria da qualidade;
  • Uma avaliação dos custos da qualidade deve ser conduzida por um relator depois de serem inequivocamente definidas as categorias de custos;
  • A avaliação estabelece uma medida para o desempenho da gestão.
Ora reconhecer que o rumo das políticas introduzidas está orientado para o fracasso não seria uma boa forma da governação de Pedro Passos Coelho entrar no caminho da (sua) excelência?
5. Conhecimento da Qualidade
  • Os resultados da avaliação dos custos da não qualidade devem do conhecimento de todos os empregados, incluindo o pessoal administrativo e auxiliar;
  • Só o envolvimento de todos possibilita o desenvolvimento de uma atitude positiva para com a qualidade.
A comunicação é essencial. Por onde tem andado a não ser nas ruas do bombardeamento ao anterior governante?
6. Acções Correctivas
  • As soluções surgem de uma discussão aberta e activa dos problemas;
  • Essas discussões levam à identificação e propostas de resolução de problemas, até aí, não identificados;
  • Devem ser tomadas medidas para a resolução dos problemas à medida que estes vão surgindo;
  • Para os problemas cuja resolução não é imediata, a discussão é remetida para reuniões subsequentes;
  • Este processo cria um ambiente propício à identificação e resolução de problemas.
Discussão aberta? Só se for à entrada do Palácio de Belém, onde Pedro passos Coelho e Aníbal Cavaco Silva tomam medidas de resolução que passam, única e exclusivamente, por manutenção do poder e do sectarismo da direita.
7. Comité ad hoc para o programa de zero defeitos
  • O conceito de "zero defeitos" deve ser passado a todos os colaboradores de forma clara;
  • Todos devem compreender que é objectivo da empresa atingir este objectivo;
  • Este comité dá credibilidade ao programa de qualidade e demonstra o empenho da gestão de topo.
 Como pode um governo, o de Pedro Passos Coelho, ter um plano zero defeitos de governação quando aposta repetida e constantemente em - peças defeituosas - recursos humanos com históricos manchados na vida social e comunitária do país?
8. Treino dos Supervisores
  • Todos os níveis de gestão devem estar cientes dos passos do programa de melhoria da qualidade;
  • Devem receber o treino adequado para que possam explicar o programa aos seus subordinados;
  • Só assim é possível passar a mensagem desde a gestão de topo até à base.
Será possível, com tanto entra e sai de ministros, inconstância pela incompetência, a este governo criar uma mensagem de qualidade que transmita qualidade e resulte em qualidade?
9. Dia dos "Zero Defeitos"
  • A filosofia de zero defeitos deve ser do conhecimento de toda a empresa e
  • Deve ser marcado um dia dos "ZERO Defeitos" em que é explicada a todos os funcionários;
  • Este dia deve marcar o início de uma "nova atitude" na empresa;
  • A Gestão deve "acarinhar" este tipo de cultura da qualidade na empresa.
Zero defeitos será aquele momento privado, na vida de Pedro Passos Coelho, quando se olha ao espelho da casa de banho da sua suite.
10. Estabelecimento de objectivos
  • Todos os empregados, em conjunção com os seus responsáveis, devem estabelecer objectivos específicos mensuráveis;
  • Os objectivos podem ser a 30, 60 ou 90 dias;
  • Este processo leva a que as pessoas adoptem uma atitude em que tentam atingir os objectivos estabelecidos. 
Os objectivos progressistas que este governo tem traçado são plenamente ambiciosos e, por isso, exequíveis e concretizáveis talvez a mais de 3650 dias.
11. Eliminar as causas de erro
  • É solicitado aos empregados que identifiquem as razões que impeçam que o objectivo de zero defeitos seja atingido - não são pedidas sugestões mas para listarem os problemas;
  • É tarefa do grupo funcional apropriado a elaboração de procedimentos que permitam a resolução dos problemas;
  • A comunicação de problemas deve ser feita de modo expedito;
  • A existência de confiança mútua é fundamental para que os grupos trabalhem em conjunto para a resolução dos problemas.
Quando um país se governa por decisores externos e se estrutura em um corpo de ministros que tem vindo a revelar-se um erro ininterrupto, causas é aquela palavra interdita ao próprio erro.
12. Reconhecimento
  • Devem ser premiados os empregados que atinjam ou ultrapassem os objectivos propostos ou que se tenham distinguido de qualquer outra forma;
  • O prémio não deverá ser baseado em compensação financeira mas sim em reconhecimento;
  • Este sistema de prémio encorajam a participação de todos nos programas de melhoria da qualidade.
Pedro Passos Coelho premeia os seus ministros, pela confiança e estímulo, na prossecução dos seus objectivos fracassados.
13. Conselhos da Qualidade
  • Membros do Concelho de Administração, chefes de equipa e técnicos envolvidos nos programas da qualidade devem reunir-se a intervalos regulares de modo a que todos estejam a par dos progressos;
  • Estas reuniões podem (devem) gerar ideias novas que permitam uma melhoria subsequente da qualidade.
Sem progressos, já se sabe, não existe qualidade – nem reuniões que valham o tempo.
14. Repetir o processo
  • A melhoria da qualidade é um processo contínuo;
  • O processo deve ser repetido à medida que a filosofia da qualidade vai sendo impregnada.

 A grande, e curta, conclusão: aguarda-se que um novo governo surja para que se dê início a todo o processo. Sem ser a brincar. À séria.

o que fazem as febres

acordei convencida de ser domingo, véspera de terça-feira e ressaca de sábado. bem visto, ainda ourada de dias, acabei de ter um delírio semanal.

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

drama

as gentes valorizam quem as trata mal. e só querem o que não têm. e só vêem quem não olha para elas. ser gente é uma comédia - e é por isso que há tanto aspirante a drama.

terça-feira, 17 de setembro de 2013

aperaltada de ficar

da varanda da minha casa via-se a serra a arder, um horizonte de fogo e fumo que durava dias. eram lágrimas as cinzas que iam manchando os beirais. naqueles dias o oxigénio alimentava o fogo mas também a esperança de um novo verde, talvez tivesse nascido aí a coisa da esperança ser verde, e de dias sem olhares queimados. o espectáculo de ver uma serra a arder faz-nos crescer: a ideia de sermos impotentes perante o universo vai-se apoderando de nós sem darmos conta - mas também nos faz minguar, tamanha a frustração de sabermos que entre nós há sempre alguém menor capaz de matar uma árvore. daqui a percebermos que a perda é o outro lado da alegria não é um instante, os instantes podem levar anos, tal como ver novamente o verde em cenário. entretanto moldam-se quereres, instituem-se afazeres, ganham-se e perdem-se bainhas naquilo que é a costura, o corta e cose só surge no mundo dos adultos, de sonhos até chegarmos aqui. sim, aqui, ao agora que já foi futuro e acabou de ser passado. o tempo que passa é um fenómeno codificado pelos deuses, como se de um comboio tgv se tratasse inacessível a quem não lhe presta sabor. já o tempo que fica é uma romântica carruagem que eles, os deuses, fazem questão de aperaltar para quem - como eu - se recusa a ver o tempo passar.

segunda-feira, 16 de setembro de 2013

mixês

10espero também é a vertigem de Kundera: desejo, o de 70r cair seguido de arrependimento. e, dizem as sábias vozes, mais vale 60r tranquilo - ou não é a paciência, verdadeiro 1000agre, a virtude 12´ povinho?

domingo, 15 de setembro de 2013

quando até a dor dói

mais uma amiga, uma filha de Portugal, que se vai - não por escolha mas pela necessidade. é é esta pequena grande nuance, aquilo que é um acrescento e não uma necessidade, que determina o que é do que não é amor. não se vai para outro país por amor à geografia ou biologia das gentes quando foi cá que a árvore cresceu. podemos cortar-lhe os ramos, arrancar-lhe as folhas mas as raízes cá permanecem; é por necessidade que agarramos uma punhada de coragem e a metemos no bolso da saída sem retorno programado; não é amor a necessidade, ainda que involuntariamente voluntária, de abandono. 

é a saudade , a ideia do amor, que nos aproxima do amor. e dói. dói tanto que até a dor chora. e é esta a melhor mensagem que posso deixar a este governo: senhores, fizeram, estão a fazer, a dor chorar. 

do renal

não tinhas nome
e sempre exististe
antigamente eras
talvez
uma pergunta do vento
não me atingias os rins
hoje
a cada voo
arrepias a pele

sábado, 14 de setembro de 2013

escova de dentes romântica


esqueçam lá isso de a contemporaneidade ser o máximo - o máximo é o romantismo do tempo dos reis e das rainhas, os pormenores do quotidiano em que viviam. era tudo pensado às curvinhas e aos rendilhados e escolhidos os materiais pela sua nobreza, não é como agora que se produz, para o dia-a-dia, do mais piroso e barato que há. naqueles tempos as escovas de dentes eram feitas em cabo de marfim com cerdas de pêlo de porco; as porcelanas, todas pintadinhas à mão, eram de dourados gostados. ai que saudades do tempo em que não vivi!

sexta-feira, 13 de setembro de 2013

belezura




noventa anos, faria

as premonições de natália









um quilo de figos.

têm-me dito, amiúde, que escrevo de forma sensual. é um grande elogio, claro, e por isso decidi partilhar uma partes mais sensíveis e sensuais que há em mim: os intestinos. é verdade. há muito tempo, tinha eu oito anos, ainda as escolas primárias eram todas de perfil centenário e as mesas em madeira maciça e inclinadas, ainda as crianças vinham almoçar a casa e ficavam com a tarde livre para estudar e brincar, ainda não eram precisas mochilas com rodas para transportar o peso dos livros porque o saber - esse - estava dentro da sala de aula e por dentro do professor, nesse tempo, vinha eu a subir a avenida para chegar a casa da tia, por mais que corresse nunca mais veria a mãe, e começou a dar-me daquelas cólicas que que se aguentam não mais do que um minuto. e no minuto seguinte lá estava eu, completamente envergonhada. e cagada. usava uns calções pelo joelho, à toureiro, ao xadrez vermelho e cinzento - lembro com se tivesse sido ontem. e foi. ontem tive a sorte de estar a menos de um minuto de casa, e que sortuda sou por poder correr para o meu pai, e dar liberdades à caganeira. penso que serão os figos, ai os figos!, esses maravilhosos estimulantes da alegria das entranhas e das façanhas. ainda continuam a chamar-lhes cólicas. eu decidi chamar-lhes  um quilo de figos.

quinta-feira, 12 de setembro de 2013

descobre as semelhanças

sem querer bater um coro, nem desrespeitar o corão, os burquinis são auênticas réplicas dos fatos de surf. no fundo, que é também à superfície, ambos existem para não meter água - os primeiros impedem o enrugamento da crença e os segundos o enrugamento da pele - que é, bem visto, a mesma coisa.

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

arfar

veste-se de fogo
hoje
a lua
em cornos de croissant
talvez a sussurrar temperança
(ou talvez não)
talvez grite com as mãos na cintura
tal e qual vareira em mercado na jornada do pão
às tantas sorri na metade por tapar
ou não é assim quando em fogo
temos a alma a arfar?

plagiarism checker ou como o entusiasmo pode crashar




esta ferramenta é um atentado à inteligência - mas só à de quem a tiver, claro. textos e mais textos, entusiasmo, muito, muitas horas a nadar. mas há momentos na vida que o que é mais seguro de se fazer, quando se está no meio do mar, é boiar. nadar não, não pode ser. passaram os meus textos na tal ferramenta, uma espécie de detector de mentiras à inglesa, e dois deles acusaram plágio e todos gramática completamente deficiente. honestidade, inclusive a intelectual, em causa, nadar é impossível. e depois a teimosia, a minha, no impulso de envergonhar a máquina e o acusador: agarrei em textos de gente que escreve gramaticalmente de forma exímia, tal como eu, e os mesmos resultados. e um ou outro plágio também. o que fazer contra um mercado que se rege por ferramentas falhadas e absurdas e que colocam em causa o nosso valor e os nossos valores? boiar. boiar é preciso quando o entusiasmo pode crashar.

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

verbo frescar

são tão boas as manhãs frescas como as noites arrepiadas: o calor, esse monótono e monocórdico besunto, só serve para fazer derreter a paciência. não é tão melhor o frescar do que o calorir? e há alguma coisa, do reino das coisas, mais gostosa do que uma manta para frescar o aconchego?

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

é que era

e é entre as malandrices do Verão
que as palavras soltas se prendem
no meio dos concertos dos grilos

Quando o trabalho se torna em um vício: os trabalhadores compulsivos.


Não é que a família não exista, existe – mas não é uma prioridade. Nem os amigos – a não ser, claro, os colegas de trabalho. E a vida afectiva a dois, essa, resume-se a umas horas contadas, bem contadas, mero indicador de que se tem, e se consegue, tudo. Os trabalhadores compulsivos, vulgos workaholics, andam aí e têm vindo crescer nas últimas décadas, o que se torna um paradoxo em um mundo onde cada vez mais há falta de emprego.

Quem são, afinal, os trabalhólatras?

Os trabalhadores compulsivos pela altura de férias, por exemplo, ficam desnorteados e sem saber o que fazer (o que é o lazer?) simplesmente porque não estão a trabalhar. Mas comecemos pelo princípio. Há vinte anos rompia a globalização, a competitividade roncava entre as nações e as empresas, assim como a necessidade das pessoas demonstrarem – a si próprios e a outros – valor, o máximo de valor. É impossível não referir aqui que, na minha modesta opinião, não é o trabalho que dignifica o Homem mas o Homem que dignifica o trabalho. Salvo raríssimas excepções, o trabalho não passa de uma caixinha de processos minuciosamente controlados e monitorizados, com imputs e outputs - num espaço e num tempo -, devidamente expectáveis. E quando, nessa caixinha, aparece a alegria ou o amor ou o prazer, já não estamos a falar de trabalho. (ainda estou a aguardar que me expliquem em que dimensão é que a alegria, o amor, o prazer são remunerados através de uma folha de salários ou de um recibo verde)


O trabalho faz parte de uma rede social, mesmo enquanto actividade individual, absolutamente necessária apenas para se ter dinheiro, carcanhol, guito, que, por sua vez, alimenta a rede social. e é só isso, e é bom que tenha consciência disso - não é o trabalho que o faz feliz nem o dignifica. Desmonte um dia de trabalho e saque-lhe a tal alegria, o tal amor, o tal prazer (se está difícil, passe para uma semana ou depois para um mês) e verifique lá se nos momentos em que sentiu o trio de que falo, ou alguma parte isolada, não estava a agir enquanto gente ao invés de agente social. É verdade, convença-se: apanhar a carrinha de caixa aberta às cinco da manhã para chegar à obra às nove, debaixo de sol e de chuva, não dignifica ninguém; nem passar um dia inteiro sentado numa cadeira - ainda que ergonómica -, por si só, em frente ao pc; nem prescrever um medicamento, ao ser mais uma ajuda naquela viagem de sonho, sem saber porque verdadeiramente o paciente sofre; nem dar uma aula sem aquele brilho de sabedoria que marca o outro lado. Nem nada. o trabalho não serve para nada quando não passa de um tudo, porque não é só se deixar de respirar que morre: se deixar de trabalhar também. Perdas e ganhos contabilizados, os trabalhadores compulsivos ganham doenças e tristeza perdendo tudo e todos à sua volta. Adiante.

Conhece trabalhadores compulsivos? Conhece alguém assim? Pois, eu também. Vamos chamar-lhe Filipa. A Filipa é casada e tem um filho de três anos. Estão de férias e a cada dia de férias que passa a Filipa está com um ar mais cansado. Estranho? Não: ela pertence ao clã dos trabalhadores compulsivos. Explico. A vida dela é uma verdadeira rotina instalada tendo como ponto de referência o trabalho. Então o que fazer perante tempo livre? Stresse. A Filipa entra em stresse perante a possibilidade de não ter de trabalhar e de não ter um ritmo alucinante e, curiosamente, sofre das mesmas angústias e cansaços como se a trabalhar estivesse: dorme pouco e mal, faz refeições fugazes e com pouco valor nutritivo, é incapaz de se libertar do telemóvel e sente um medo gigante de falhar com o filho e com o marido. Resumindo: a Filipa está de férias e vive impaciente, ansiosa, stressada, intolerante e alheada (confira aqui e aqui) daquelas coisas que dão alegria à vida.

Se tem cura? Tem, claro – bastará que as Filipas, os trabalhadores compulsivos do mundo, queiram ser gente para dignificarem a vida. E o trabalho.

recado a um Joaquim José

80ção! 70s 3passar-me, 10iste: 100 romance nem adianta dizeres 20 ver. 5'um caneco! estamos em 7embro e nada. já sabes, 7 atrasas mais - com menos ficas, 15é.

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

Acabar de vez, não com o piropo, com a perseguição ao dito



Já muita tinta tem corrido acerca do piropo, assédio verbal em destaque, quando ele, o piropo, não é mais do que um elogio tantas vezes confundido com palavras incómodas – ruído e malina – de cariz sexual e ordinário. Chamam-lhe, agora machismo, atalho de chauvinismo, quando na verdade existe para, neste contexto de homens versus mulheres, marianizar a coisa. Mas o que faz de um piropo um lugar arejado, aquela brisa que pode refrescar um momento ou um dia ou uma memória? 

Um piropo para mim, outro piropo para ti…

Olá. Olá. Até um olá pode bem ser um piropo, é verdade. Um piropo é, na realidade uma forma de expressão intensa – intensa porque genuína utilizada mais comummente na oralidade. E na oralidade cabe tudo, a oralidade é rica (tão rica que o Saramago sentiu vontade de colocá-la esticadinha na escrita), e quer-se – neste contexto – de chinelo e areia no pé, descontraída e espontânea. Um piropo pode ser, ou não, pronuncio de conquista – apenas expressão de agrado leve: o que é, senão uma leve expressão de agrado, uma queca ocasional? Ou também, conquista ininterrupta, pode durar uma vida inteira – o piropo pode ser um amor correspondido e vivido nos dias e nas noites. O piropo de um olhar, já pensou? Aquele olhar que mata, ou antes que faz viver, inesperado, cruzado com o seu de forma vadia. Ou simplesmente um bilhete com um número de telefone, ou email, deixado cair da cadeira de uma esplanada qualquer – um piropo é, como já disse, uma forma de expressão sem tempo e espaço definidos porém bem definido como um elogio ao outro se quer. Mas também pode ser um poema: já alguém lhe escreveu um poema cheiinho de metáforas e encruzilhadas para desmontar? Ou apenas de cinco linhas breves e rectas e penetrantes? Pois. Quando é um poema trata-se, garanto, de um piropo em potência – olhe, é um piropo a querer andar de mercedes. Se resulta? Vai-se lá saber…

Um piropo pode fazer rir quando lhe dizem que as suas meloas devem ser sumarentas. Mas também pode fazer chorar se lhe disserem que é bonita demais para sequer ousarem tocar-lhe. Um piropo pode aproximar – se quando apanha o bilhete escrito acaba por ligar – ou fazer fugir, se no bilhete está escrito que um estranho gostava de ter um filho seu. 

Já pensou no que seria a vida sem romance? Tudo isto que acabei de dizer é, não se iluda, romance. E poesia – ou não fosse a poesia a beleza do pormenor. E o que é um piropo senão um pormenor e, por isso, poesia, romance? É isso. Agora já sabe que é um romântico mesmo que tenha estado convencidíssimo, até agora, de que isso é coisa de donzelas e de maricas. 

Ou vai dizer que nunca piropou?









não é a brincar a forma mais séria de educar Segurança?

Sabemos todos serem as crianças a base daquilo que queremos que seja o futuro: o lugar mais seguro do mundo. E nascem, e crescem, cada vez mais e melhores, as iniciativas que promovem a Segurança. Interessa levá-la o mais longe possível e, para chegar ao reino do que é pensar para ser, a brincar. Diversão e aprendizagem, educação para a vida, é a aposta que fazem os que sabem que a importância começa onde termina a convencionalidade daquilo que é comunicar.


Se não lhe parecia ser possível cantar e jogar para fazer Segurança, leia isto:

Esta campanha de sensibilização que me chegou através do João Pedro da Costa levada a cabo pela gigante agência de publicidade McCann com o objectivo de promover a Segurança Ferroviária mas não só - já que o alerta da música e das imagens nos transporta a todos em geral, e às crianças em particular, para outras realidades de perigo e risco. Além de a música nos remeter para um ritmo e letra facilmente apreendidos, também a cor e as formas animadas são de uma simplicidade cativante. E depois há os jogos, ferramenta igualmente certeira, que chegam daquela maneira divertida e eficaz à Segurança por dentro do cérebro dos nossos traquinas.

Por cá podemos orgulhar-nos de já ter sido desenvolvido um projecto semelhante, de sensibilização da comunidade civil, para a problemática da Segurança e do acidente. Chama-se Tó & Kika, no âmbito do projecto Prevenir para Inovar, iniciativa da AEP (EURISKO). As actividades desenvolvidas assumiram diversas variantes desde workshops, seminários, acções de formação/treino, exercícios de simulação de emergência, análise de riscos das instalações, realização de ateliês de pintura e escrita, exposições, sessões de jogos, entre outros, sendo que o objectivo principal foi o de fazer com que as comunidades escolares se consciencializassem sobre a temática da Segurança e da Prevenção – na escola, em casa e na rua.

O resultado? O resultado deste tipo de iniciativas só pode ser, pois, excelente! Por cá, conseguimos o envolvimento das crianças, dos pais, dos professores, e demais funcionários das escolas, e também da protecção civil, bombeiros, polícia municipal e sociedade em geral – até pela publicação da BD Tó & Kika, durante muitas semanas, no Público - para o bem comum que é a Segurança. No caso do vídeo Dumb Ways to Die, terá tido já 60 milhões de visualizações no You Tube e premiado com um Cannes Lions e 7 Webby Awards.


Será caso para dizer: obrigada a todos os que promovem o lema de que mais vale prevenir do que acidentar – porque a Segurança não quer morrer. Nem de velha.

linha de todos os dias

tolerar a trovoada é apreciar o sol.

terça-feira, 3 de setembro de 2013

Canal180

O tal canal, não há memória de um outro igual, é especial

E é o Canal180. Tomei conhecimento da sua existência através deste blogue sobre videomusicalidade. Definindo-se como o primeiro canal nacional sobre cultura e criatividade, explora as várias plataformas digitais para nos fazer chegar conteúdos originais e criativos do mundo artístico: séries documentais, música, vídeos, ilustrações, cinema, arte urbana. Apresenta-nos uma espécie de cardápio de criadores e de obras – é só escolher.

Mas não estará em falta, neste Canal, a arte da escrita - da escrita criativa?

Mergulhada no interesse das águas do Canal180, onde cada link atrai a abertura do link que se segue, descobrindo mais e mais sobre aquilo que são as artes visuais deparei-me com (a meu ver) uma falha: nada de referência a conteúdos ou criadores das letras que parece que dançam (e dançam) e que cantam (e cantam) e que vivem (e vivem) e que morrem (e morrem). Falo, como não poderia deixar de falar, de literatura e de escrita criativa.

Enquanto desfolhava, sim desfolhava e não folheava por conta da imaginação que não pode nunca ser esquecida, cada link do Canal180 percebi que faltava ali qualquer coisa, sempre qualquer coisa, para abrilhantar ainda mais o projecto. Tudo o que os olhos vêem e os ouvidos ouvem e o coração sente serve de estímulo à verbalização. E qual é a arte de verbalizar, oratória de dedos, a cor e a forma do mundo? Exacto: é a escrita. Já pensou no quão magnífico seria poder ler uma ilustração? Na verdade estaria a fazer duas leituras em uma só – a da imagem e a da imagem escrita consoante o recanto desta ou daquela paragem criativa dos criadores. E um vídeo? Quantas vezes uma música, que já possui uma letra, nos leva onde também o vento vai que é o infinito? Já pensou como seria maravilhoso reescrever um vídeo que já está escrito?

Seria uma ponte, sempre uma ponte, uma ponte é uma amiga, uma união de artes que só poderiam resultar em força, em caminho, em criatividade acrescida e em originalidade aumentada. Este, mais completo, mais justo, é o tal canal que é bom. Mas, porque não, há sempre espaço para mais uma arte, pode ser ainda melhor.


Consegue imaginar, por exemplo, no programa de A Música Portuguesa a gostar dela própria, algo como agora faça-se silêncio porque se vai cantar, e ver e ouvir e escrever, o fado. Que completude! Que alegria!

o sexo e a idade

vai fazer noventa anos. noventa anos é muita frutinha, penso, muitos sorrisos e muitas lágrimas e muitas reflexões e muito amor e muito tudo. mas também são tão poucos! olha as árvores, aquelas reinas centenárias, que quanto mais velhas com certeza que mais rimam com beleza. na verdade ela continua a ser como era há vinte anos: o mesmo penteado de cabeleireira ao sábado, aquela banana de cabelo ripado, a mesma maquilhagem e o mesmo tom de batom, o rosa velho, as caminhadas para todo o lado, os livros que devora, o sudoku. ah, e os scones maravilhosos que faz sempre para o chá. e diz: quando eu ficar tolinha, ou inválida, deus pode levar-me porque não vou para casa de ninguém. vive sozinha e feliz, o marido morreu há mais de uma dúzia de anos e foi um consolo: passou grande parte da vida com amantes e, já velho, adoeceu. ora ela serviu apenas para a doença e também para lavar as toalhas cobertas de perfume das outras. então morreu e ela ai começou a viver. amou -o daquela forma que se ama a mobília e os bichos da madeira: quando estiver tudo carcomido vai fora e, no entanto, esqueceu-se de se amar. terá sido um amor de mãe, não de mulher. e eu disse-lhe: agora precisava de amar um homem e ser amada como mulher. à séria. e ela respondeu-me: agora é tarde demais: os homens velhos já só sabem amar também como fazem os pais porque o sexo, a parte sensual do amor, já o gastaram com outras. e depois vi o filme todo, RPG, que veio mesmo a calhar. os Homens só querem ser jovens por causa dos prazeres de sexo. (uma foda). por sexo os Homens estão dispostos a tudo. (outra foda). os Homens quando acreditam conseguem tudo - menos foder. (outra foda).  

e quem, sendo jovem, não conhecendo os prazeres do sexo - desejará ser jovem quando velho for?

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Foi você que pediu um estágio?

Surgem, neste Governo, como ervas selvagens, os estágios profissionais. Trata-se, à primeira vista, de uma forte tentativa de reduzir a taxa de desemprego por ciclo virtuoso: o estado apoia as empresas na contratação, a chamada medida estímulo 2013, que por sua vez fomentam a criação líquida de postos de trabalho. Bem sei que parecem ser coisas distintas falar de estágios profissionais e depois metê-los no mesmo saco da tal medida – parecem mas não são porque, na realidade, ambos resolvem uma pequeníssima fatia de problemas de uma outra, ainda mais fina, da população desempregada.

Quase vinte anos de carreira – quer um estágio?

A frequência de anúncios ao abrigo da medida estímulo tem vindo a aumentar dia para dia e a resposta, ou candidatura, aos mesmos está dependente de uma série de requisitos para o tal estágio – que é como designam, entidade empregadora, o tipo de trabalho: estar abrangido pela possibilidade de estágio na asa da medida estímulo 2013 que significa exactamente estar na penúria das penúrias sem descontar para a segurança social há mais de um ano. Ou seja até quem tem trabalhado, e pouco, e mal, precariamente, a recibos verdes está inibido de candidatar-se à oferta de emprego. Quer dizer o estado financia as empresas e estas, por sua vez, exigem experiência e competência e disponibilidade mas, ao mesmo tempo, recrutam pessoas que para cumprirem com os requisitos exigidos só podem ser extraterrestres. Exagero? Sim, um pouco – mas só no conteúdo e nunca na forma de sentir a injustiça.

As empresas, que aproveitam o financiamento – e sem olharem ao perfil académico e de experiência no mercado de trabalho do candidato -, estão a ser estimuladas a dar uma migalhinha aos desgraçados (desgraçado, anote aí, é o que é sozinho a tratar dos filhos ou  o que sustenta a casa porque o outro está desempregado ou é ignorante ou é nada disto que disse, pelo contrário, até tem quase vinte anos de experiência e trinta de formação mas no último ano fez uns descontozitos para a segurança social) e aos que têm necessariamente de cair em desgraça para poderem concorrer à tal oferta de emprego que exige candidatos com disponibilidade de eleição ao abrigo da medida. E a minha pergunta é a seguinte: o Governo não sabe que grande parte da população desempregada tem formação superior? E que uma empresa é tão mais considerada desenvolvida quanto maior for o número de quadros superiores? E que a qualidade está directamente relacionada com a excelência que por sua vez se traduz na aposta na investigação e desenvolvimento que por sua vez faz a vantagem competitiva e a expansão da empresa e o contributo no saldo positivo da balança comercial para o país? Que vem a ser isto de chamar estágio a um emprego? E que vem a ser aquilo de darem a entender aos empresários que o capital humano não tem valor monetário agregado e que pode ser pago a miseráveis IAS (valor do IAS em 2023 - €419,22)?


Estágio, estágio, estágio, estágio. É preciso emprego, neste país,  não é estágio – aquela coisa de experienciar a novidade do mercado de trabalho para colocar no CV para, talvez um dia, se conseguir um emprego. Perceberam?

o festo da rotina

quinze dias passaram a voar- vejo-os agora de tapete lá no alto, aos saltinhos, e em risota, como que a troçar -, uma mini viagem à volta da anarquia gostosa que é viver sem regras. a rotina regressou a casa, tristeza, mas faz todo o sentido que assim seja, malas arrumadinhas na mão, cabelos bem escovados e calças de festo perfeito, afinal de contas esta é a casa dela e quem cá ficou, erradinha e tortinha, fui eu.

sábado, 31 de agosto de 2013

dois ponto dois

decidi tentar - mais uma vez, desta vez decidida a conseguir convencê-lo, e tudo devido à pressão dos pneus que não está escrita em lado algum e tive de descobrir os números exactos, dois ponto dois, porque bem visto para convencê-lo terei de fazer a pressão certa, nem mais nem menos, a adequadíssima, a buriladíssima, a única - convencer o meu pai a ir para a universidade sénior. 

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

súbito

na vida
tudo chega de súbito
o resto
o que desperta tranquilo
é o que
sem darmos conta
já tinha acontecido


quinta-feira, 29 de agosto de 2013

That's all folks!

Os EUA são, de facto, omnipresentes

A toda a hora alguém acorda com um sonho, acordar com um sonho é aquilo a que chamamos esperança, um sonho cheio de luzes: ir para os EUA. Mais: o mundo nasce todos os dias a pensar em american-english. Ouch. Quem quer realizar um sonho vai para os EUA – e quem quer endividar a alma também. Os EUA estão, oh my god! em todo o lado: na luta pela escravidão e também pela sua abolição e contra o racismo e a favor de intervenções militares em países de outro mundo e no esperma da sala oval e no dia das bruxas e no cinema e na cadeia McDonald's.

Mas serão omnipotentes?

Quase. A indústria cinematográfica dos EUA é, sem dúvida, uma das maiores, e mais influentes, do mundo – não fosse Hollywood o símbolo do sucesso. Tenho, aliás, a convicção de que se a Linda de Suza, a nossa Teolinda Joaquina de Souza, tivesse rumado aos EUA com a sua mala de cartão, em vez de França, estaria hoje a dar continuidade aos papéis da Elizabeth Taylor na Universal Pictures. Ou então não teria passado de uma IT-Girl, o que nós por cá chamamos de pita que usa saias que mais parecem cintos e que bebe penicos de álcool e outras drogas, à boa maneira americana: plus chic, plus mode, plus de glamour. Mas não foi sempre assim. Já houve um tempo em que o espectáculo era outro, ora triste ora contente, nos EUA. Houve um tempo em que a escravatura não era como a de hoje – de fama e sucesso -, tinha que ver com a cor da pele preta explorada nas plantações do sul. Mas depois conseguiram abolir a escravatura, viva!, e conseguiram fazer dos EUA, UCB, United Colors of Benetton. (Mas isso é de origem italiana, Olinda. Ó, isso não interessa nada – o que conta é pronunciar em inglês americano, ignorando os tês). Por falar em cor, torna-se impossível não lembrar a da sala oval: rubra. Não, não me refiro à decoração. Adiante. A esta altura o leitor já estará com fome, está calor, é Agosto, o cinto já está esganado e, deixe-me adivinhar, vai passar no McDonald's. Como é que acertei? Ora como Portuguesa que sou conheço bem alguns pratos típicos. Além da particularidade de este prato ter algumas variâncias, como é o caso mais recente da bifana com sabor a sabonete de glicerina, é bastante económico e saciante: como o Governo quer. Além disso esta comida é confeccionada aos mais altos padrões de qualidade de HACCP o que constitui, para os EUA, uma vantagem altamente competitiva: ninguém fica de diarreia nem morre de E. Coli no McDonald's, excelente! Mas morre mais cedo. É. Mas também não morre sem festejar o dia das bruxas entre, oh yeah, doçuras e travessuras. Aliás, não servem as abóboras do Minho (não confundir com jerimum que aqui diz ser sinónimo mas é mentira. Porquê que é mentira? Porque o jerimum é usado apenas para confeccionar doces) para outra coisa  que não esquartejar e desmiolar para incendiar - são elas e as políticas altruístas, e intervencionistas, dos EUA.  O que é importante é americanizar tudo, não esqueçam. That’s all folks!




os dois

escolhi chamar-lhe, por razões musicais, Samantha.

ontem vi uma raposa. dizem que foi um cão, que me enganei, mas não: ontem vi uma raposa que se assustou comigo. saiu de dentro do milho alto e maçudo e depois espreitou para cá - para cá no lado onde não se podia esconder. estava noite fresca e recente e talvez precisasse de sair para o outro mundo. às vezes o outro mundo está quando abrimos os olhos ou acordamos ou adormecemos ou, e porque não, saímos do meio do milho. orelhas arrebitadas e focinho bicudo, como tem de ser, olhou-me fixamente durante uns segundos. e eu a ela. depois pensou e desapareceu. suponho que terá pensado em não estar com alguém, era o que faltava, esperou o dia todo pela fresca e agora aparece esta. mas estou convencida de que vai voltar a aparecer - hoje à mesma hora, talvez. ou amanhã ou depois, que importa, desde que não pense, só sinta, e venha lamber-me as mãos e as pernas e os braços - os braços espero que lamba os dois.







quarta-feira, 28 de agosto de 2013

sabor

à maçã verde
não perguntes quem é
outra forma
não há
de lhe conhecer
o sabor

verão triste

entra de mansinho, vai entrando, em conluio com o clarão escuro do nascer do dia - sobe as narinas e aloja-se na alma. os sentidos despertam e choram, também se vestem para confirmarem a tristeza, e, já na rua, o céu é uma mistura laranja com cinza, nuvens desenhadas a rigor de fatalidade. por aqui, por aí, por todo o lado morrem árvores e arbustos, ervas e caruma. por todo o lado o vento, mau conselheiro, exalta os ânimos. por todo o lado é verão. e o verão é, por isto, triste.

sábado, 24 de agosto de 2013

felicidade-poesia

descalça-te, por favor, para ler isto.

(adenda ao post anterior)

: a expressão genuína que os do norte dizem e os do sul só pensam: foda-se!

o sul com os olhinhos no norte: que justa maravilha

quem gosta de blogues, e de blogueres, não sei se existe esta palavra assim mas é assim que gosto, como eu - de bons blogues, reforço -, tudo tem significância. aliás, no mundo tudo é para ter significância com excepção do que excluímos de significado e aí, não existindo, nada significa. desde os autores aos conteúdos, cada blogue é um amigo (e agora é impossível não lembrar a canção: que devemos bem tratar...) ou, melhor, a casa de um ou mais amigos, que frequentamos e tantas vezes nos sentamos a conversar. também os há que, apesar de sofá na sala, nunca, ou poucas vezes, estão com pachorra para conversas - tantas vezes lançamos perguntas e nem sequer nos respondem: olham-nos mas ficam calados. talvez a vida não lhes corra ou tenham dores de garganta ou barriga ou de dentes, quem sabe, mas disso alguns padecem e assim hão-de morrer. a verdade é que ao mesmo tempo que fazem destas suas casas espaços de exposição e discussão de ideias também as não asseiam - deixam acumular lixo e nem sequer abrem as janelas. isto é curioso para quem deixa a porta aberta. adiante. mas o pormenor que mais me fascina é aquele do você, está a ver? se são visitas esporádicas, entende-se. se são amiúde, com chá e biscoitos e prosa, onde é que cabe a distância fria e merdosa do você? também é verdade que no sul há bem mais merdeiro do que merda em relação ao norte mas podíamos todos melhorar isso: os do norte a continuarem a ser excelentes hospitaleiros e os do sul a reduzirem a taxa de merdices pondo o olhinho no norte. parece me justo.

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

o criador

o criador apresentava, finalmente ao mundo, a nova gama de vaselina que, dia após dia, durante sete longos anos, tinha preparado. um pouco mais de óleo de rícino aqui, um cheirinho de petróleo acolá até a parafina líquida estar no ponto: não num ponto qualquer mas no ponto de exclamação das gentes perante a novidade que vinha aí.

(vir é sempre bom e a espera do vir pode, de facto, surpreender)

começou por testar o seu bebé (aquilo que fazemos com amor é sempre um rebento em branco) junto de vários estratos sociais. visitou muitas, muitas, casas e foi oferecendo amostras para, na semana seguinte, recolher informação sobre a textura e a utilidade que lhe dariam. numa casa, foi recebido por um senhor abastado que tinha descoberto uma utilização medicinal – aplicava a vaselina nos joelhos e cotovelos dos filhos sempre que se esmurravam e estava bastante satisfeito com a sua suavidade; na segunda casa tinham-na usado, na mecânica, para lubrificar os rolamentos da bicicleta e do aparador da relva; numa terceira casa, um operário, barba desfeita e hálito de intestinos de pato, disse-lhe que lhe tinha dado um uso meramente sexual: besuntava, todas as noites, a maçaneta da porta do seu quarto para os filhos não a conseguirem abrir.

entre todas as residências que visitou, esta última foi realmente a que mais prendeu a sua atenção – não pela utilização em si mas pela tomada de consciência de que, sem dúvida alguma, é a inconsciência de cada um que acarreta tantas finalidades diferentes. 

ninguém, porém, tal como ele, se lembrou de simplesmente não experimentar, não sentir a textura, não dar qualquer utilidade à vaselina; ninguém, tal como ele, se lembrou de, simplesmente, lhe responder que se excluiu do teste sem, daquela parte sem parte; da parte de não fazer, de não usar – o que o deixava a encher-se, pelo vazio seu e só seu, de júbilo.

a parte sem era, foi, sem dúvida, aquela em que, por enchimento, se excluiu. excluiu-se sempre de tudo o que o enchia, do que o tocava – e tocava-se, isso sim. tocava-se para se orgulhar do sem que era, do que com tudo sem tudo era. e abandonou o teste porque a única experiência que afinal de contas lhe interessava era a de reconhecer, em si, a exclusividade, a consciência da inconsciência. pensava, por todo si, que por melhor que fosse a sua criação nunca iria de encontro a si.

(ouvia, amiúde, de si, para si, a graçola do “e si sou boa comómilho porque não me queres?” e ria, ria, perdido numa nuvem balofa que lhe dava sempre nota cem)

por mais que a criação fosse boa como o milho, não se cansava de gritar que não era galinha – detestaria, aliás, ser a típica galinha que vive a olhar os céus e a pedir a deus que lhe dê outro sexo porque o único que tem (e a utilidade que lhe dá) enfada-o. por mais que a criação fosse maravilhosa, não a queria, recusava-se a partilhá-la com a sua outra parte que não a de criador – consigo mas sem si, sempre sem si, percorreria os caminhos e até os atalhos da ciência, do laboratório, das ruas com casas com gentes lá dentro, como num ciclo – não vicioso – virtuoso que o ajudava, mais e mais, a reduzir-se, a desfalcar-se de si em honra de si.


**

passaram dez anos, entretanto, e o criador explora o sem si no expoente máximo: bate na porta das casas das gentes, sem mostrar alegria ou entusiasmo, e aguarda, sem agitação e curiosidade, que adivinhem, sem consciência, ao que vai, qual o produto que quer testar e o que pretende saber. pretende, agora, sem fim e sem cabo, dar um novo significado à palavra sentir.

a chuva do Bidarra

também cai aqui. e lá.

vinte mil pessoas e um funeral

cheiinho de flores viçosas. e contadas.

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

nascia a ideia da Europa no século dezanove. valeu a pena?

estamos agora no século dezanove, façamos uma breve viagem, e bismark, o homem alemão da política pela força, falava em “falar europa”, prelúdio do discurso de renouvin – decano das relações internacionais de solidariedade entre povos -, que apresentava ao mundo o problema da criação europeia como federação ou comunidade. e dizia problema pela sábia visão da diferença daquilo que era, e continua a ser, o discurso (com tudo o que os vocábulos comportam em termos míticos, linguísticos, estéticos) e a acção que implica sacrifícios, opções, integração no real organizado e dependente das circunstâncias.

sem querer esquecer qualquer outro contributo importante no percurso da ideia da europa é impossível não referir emeria curcé que publicou, em 1633, o livro "nouveau cyrée", em que defendia a criação de uma assembleia permanente de arbitragem, que ao mesmo tempo garantiria a paz e favoreceria o desenvolvimento das trocas internacionais; e depois o “grande desígnio” que sully, seu conselheiro, atribuiu a henrique iv defendendo a europa em quinze estados e um conselho comum; e william penn quando publicou, em 1693, o "ensaio pela paz presente e futura da europa", no qual considerava que deveria ser constituída uma assembleia de  representantes dos estados europeus que tomariam decisões por maioria de 3/4 dos estados - as decisões tomadas poderiam ser impostas coercitivamente por uma  força armada a formar; do abade de saint-pierre, 1712, em "projecto de paz perpétua", defende a criação de um parlamento europeu que teria competências legislativas e judiciais; ou de kant, espírito liberal individualista, onde os colectivos identitários que denominamos de nações deviam ser diluídos em troca de uma “pacífica” colecção de indivíduos sob o mesmo estado federal; ou quando, em 1849, victor hugo lança um apelo a favor da criação dos estados unidos da europa.

poder. generosidade. solidariedade. coerência. todos estes homens, estadistas ou pensadores, que importa?, projectaram – muito mais do que um continente de força – valores. curiosa e lamentavelmente assistimos, mais de cem anos depois, a um problema – ao mesmo problema que renouvin, o decano lá de cima, explanou: a união do discurso não acompanhou a acção: ficaram, têm ficado, de lado os valores – vence o poder. os sacrifícios de uns são a glória de outros; as opções de alguns são ganância e de outros circunstância.
existe comunitarização de todas as matérias?
as decisões em domínios cruciais são adoptadas por maioria?
a comissão tem um grande poder de iniciativa?
o parlamento europeu tem um enorme poder no processo legislativo e exerce um efectivo controlo político?
o tribunal de justiça tem real competência perante todas as matérias?

valeu a pena?

Espirito Empresarial Responsável + boa vontade+ esperança


ouvi assim

as palavras, algumas, deixam a alma lavada.

(sim, é verdade, mas e as outras, outras, não são pêlos soltos e esquecidos, porque imprestáveis, no bidé?)

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

viveliotecas

as bibliotecas já não são o que eram: são, têm vindo a ser, melhores. as primeiras, materializadas em placas de argila, onde se registavam contas de tempos e de trocas comerciais, datam de há 3000 anos antes de cristo. a primeira biblioteca pública de que há conhecimento localizava-se em atenas e constituía, na graciosa grécia clássica, além de consulta de manuscritos, local de encontros para discussão e elaboração de projectos. na história ficou igualmente a biblioteca de alexandria – espaço com milhares de rolos de pergaminhos para leitura, oficina de copistas e arquivo de documentação oficial. mas terão sido os romanos os primeiros a fazerem das bibliotecas públicas instrumentos de dominação intelectual - propagando-se, assim, as bibliotecas particulares como símbolos de riqueza e prestígio -, uma moda.

foi nesta época que os copistas começaram a surgir em massa – trabalho desempenhado por escravos – assim como os codex em pergaminho que substituíram os, até então, rolos de papiro. seguiram-se guerras e destruições que travaram a expansão das bibliotecas e a concentração dos resquícios manuscritos em mosteiros, conventos e castelos feudais: aqui aqueles eram conservados, copiados, traduzidos e ilustrados mas também monopolizados e tornados inacessíveis ao povo. no mundo árabe a expansão destes locais foi impressionante durante a alta idade média, fazendo a delícia de professores e estudantes no reino da matemática, astronomia e filosofia.

 com o surgimento das universidades, na europa, os livros passam a ser um luxo intelectual, apesar de acorrentados para inibir o roubo, partilhado. o livro reencontra o simbolismo de riqueza e de prestígio na idade moderna que gutemberg, esquecê-lo é pecado, em muito contribuiu. que maravilha. nascia o primeiro livro impresso que vinha a permitir a transmissão do conhecimento a uma escala nunca antes vista. apenas, no entanto, no século dezassete as bibliotecas viriam a ser públicas quebrando-se a excepção de frequência a sábios. é no século dezoito que surgem as bibliotecas nacionais e no século seguinte é fundada a maior biblioteca do mundo, nos eua, a do congresso. aos antigos conceitos e actores do mundo do livro juntavam-se o autor, o impressor, o livreiro, o editor, o bibliotecário e, finalmente livre, o leitor.


mudaram-se os tempos, assim como as vontades e as necessidades: o combate ao analfabetismo e a cada vez maior preocupação com a educação deixaram, de vez, as portas abertas ao livro no século vinte, século que fez desenvolver, e instituir, um novo mundo ao mundo do livro. nos nossos dias as bibliotecas não possuem apenas um carácter documental e informativo in loco – antes deixaram que o tempo lhes refrescasse as tecnologias e os recursos e, ninguém lá longe alguma vez imaginou, entra-nos casa adentro, espaço físico superado, por via virtual. e esta, hein?

terça-feira, 20 de agosto de 2013

refas­te­lado, não irado, é como não diz a cobiça — de quem não tem olhos de lince: uma injustiça.


ai que bom!



gang dos cotas

raramente um programa de riso me faz rir e há muito tempo que não gargalhava a ver um - chama-se gang dos cotas e além de promover o riso, ai o riso!, promove igualmente o trabalho sénior. e lá estão eles, sete actores séniores e malandros a mostrarem que são bons e os melhores. a componente do inesperado e, ao mesmo tempo, do inesperado com banda sonora foi a que me cativou. e depois a naturalidade com que fazem aquilo vem dar-nos a certeza de que a idade em frequência acumulada é fonte de experiência e sabedoria. façam mais. quero mais.