segunda-feira, 4 de março de 2013

bola com nabiças e canção

bom, já sei, aproxima-se a hora do jantar e não sabes o que fazer. o quê, tem de ser leve para o estômago e para a carteira? está bem. pega lá nas sobras daquele frango estufado do almoço ou das carnes do cozido de domingo e fá-las em quadrados de ternura. vai ao frigorífico e vê lá se não tens fiambre ou paio ou chouriço. sim? óptimo. aquelas fatias de queijo também podes trazer. agora mistura uma chávena grandinha de farinha e uma de leite com três ovos e duas colheres de sopa de fermento. já está? pica também um raminho de salsa e acrescenta à massa juntamente com as carnes. agora pega na forma, se fôr de silicone melhor, e mete lá para dentro metade da mistura. stop. cobre-a com as fatias de queijo e continua a colocar o resto. mete ao forno e aguarda que fique dourada. e podes cantar:

comi uma bola
com carnes e com tudo
ficou boa, tão boa
e não fiquei um barrigudo

e uma sopa de nabiças? não te esqueças de aproveitar os talos porque dão óptimo sabor juntamente com a abóbora, a cenoura, o alho francês, o nabo, a cebola e a curgete. e quando estiver passada e meteres as nabiças - mete também um punhado de arroz agulha. há um mistério no casamento de nabiças com arroz agulha: a textura fica diferente e o sabor arrebita-se.



regras

regras para tudo, regras para tudo, e pergunto eu: também há horas marcadas para dar peidos?

terei sido criada ao som dos Rosa

os textos do João Lopes são sempre, de tão bem escritos, balsâmicos - ou porque nos remetem para o assunto em questão como se lá estivéssemos desde sempre ou, como é o caso, porque nos empurram para o tal sítio, aquele, que tendo ficado lá habita por cá.

os Pink Floyd viram-me crescer, já seriam eles bem maduros, e quando lançaram o The Dark Side of the Moon estaria eu a ser projectada, um ano pode ser o tempo exacto de elaboração de um projecto se excluirmos os três meses de ante-projecto previstos na concepção de quem é excelente parideira como foi a minha mãe. 1973 terá sido o ano da criatividade, muito riso à mistura, concluo.

mas como estava a dizer aquilo da escuridão com lua misturada entrou-se-me e entranhou-se-me, com toda a certeza, visto que quando tive autonomia para escolher o disco a rolar eram eles, os Rosa, que eu ouvia. hoje ainda ouço, de vez em quando, quando sinto vontade. aqui fica uma, uma porque escolher bom dentro de bom torna-se difícil, das minhas preferidas.



se te alimentas vais parar à cadeia ou a ex-cadeia alimentar

por cá, pelo ocidente, tradição histórica e religiosa em conformidade, come-se, inclusivé, a mão à vaca, as orelhas ao porco, as vísceras à galinha, a pele ao pato, a barriga à pomba, a dignidade à coderniz, o gluglu ao perú, a perna à rã, a barbatana ao tubarão, a costela ao javali, o penso higiénico à lampreia (...) e tem-se aversão de petiscar a coxa do cavalo - culinária desde há muito utilizada na europa. ora se o cavalo só servir para montar e embelezar carteiras - tal e qual como os touros que também servem para animar o povo, será justo arranjar fonte de adrenalina, que não no prato, para todos os outros que nos enfeitam os sentidos. e passamos, estômago não apenas por forrar mas também por poemar,  a estimá-los e a admirá-los. só. é pôr a bicharada em fungágá e esquecer a cadeia alimentar que está, de resto, démodè.

domingo, 3 de março de 2013

amor é, só pode ser, cão.

inspirada por este excerto
Paulo Varela Gomes, O Verão de 2012. Edições Tinta-da-China.
 
e por ela
 
choro. choro por saber da falta de abraços e pela arrogância da raça humana quando julga, e mal, que é superior a eles, aos outros, aos outros animais. ainda hoje, enquanto ela caminhava com aquele rabo farto e  pululante de vida, apreciava-lhe por detrás, o amor quando aprecia por detrás o amor é porque lhe faz frente e não tem outra direcção senão ir em frente, a coragem da sua existência: o que seria dela sem alguém que lhe conhecesse o olhar e o andar e o sentir e o pensar quando tudo o que ela não sabe é falar? e é por isso que, de certa forma, seremos nós uns privilegiados - mas apenas porque conseguimos expressar a nossa criatividade, não só, também, pela fala e pela verbalização. e com ela nem sequer preciso de falar; com ela sei que posso, incondicionalmente, contar; com ela aprendi, sendo sem reservas amada, a amar. 
 
e sorrio, sorrio muito. e é por isso que o amor só pode ser de cão: não por capricho, não, por ser insigne, alma de vento com sol e com chuva, estendida passadeira de flores e pedras pisadas, cheiradas, outonoinvernoprimaveraverão.

culinárioterapia




um bolo de laranja que se preze tem de levar a casca - não só faz brilhar o sabor como também o cheiro e, pela cor, os olhos. faz assim: pega na laranja e retira-lhe apenas as extremidades. depois, corta-a aos cubos e saca-lhe os caroços. o resto vai tudo para triturar.

sumo da história: até as laranjas são para comer inteiras.


estado nascente

como é que ele dizia, o alberoni, a propósito da cientificidade do amor? já não me lembro nem me apetece ir ver. mas falava de um estado nascente, de criação e mudança, tal e qual a perspectiva simples e de perfeito reajustamento como a de os desempregados trabalharem nas matas e na construção civil: que melhores imagens - senão a de controlar o fogo, ao mesmo tempo de manter perfeitamente limpa a zona envolvente, e a de escavar para, tijolo ante tijolo, construir algo durável - poderão haver para a cientificidade do amor e para o estado de ruptura com todo um passado endógeno e exógeno em alguém? isto aplicado às massas é grande e espelha a grandiosidade de um amor: o amor pela filha da putice.

sábado, 2 de março de 2013

contra o amianto

é nestes casos que as notícias haviam de servir para informar de facto  - e não apenas para cuspir obra feita, ou por fazer, dos governos. é nestes casos que interessa aproveitar um meio de comunicação, ainda por cima escrito onde a riqueza é maior tanto no que se diz como no que se apreende, para passar a informação da importância da retirada do amianto das escolas. aqui fica uma pequena amostra do estudo já efectuado aquando do Projecto PREVENIR Escolas.


A cobertura dos edifícios escolares e das zonas de circulação entre os edifícios, em uma grande parte de escolas mais recentes - quero dizer que não pertencem à tipologia do Plano Centenário - é de fibrocimento, contendo amianto na sua composição. Todas as variedades de amianto são agentes cancerígenos da classe 1, ou seja, sabe-se que provocam cancro no ser humano. A Directiva 83/477/CEE é a relativa à protecção dos trabalhadores contra o amianto.

Existe o perigo decorrente da inalação das fibras presentes no ar quando estas se libertam - as fibras microscópicas podem depositar-se nos pulmões e neles permanecerem por muitos anos podendo vir a provocar doenças mais tarde, normalmente várias décadas depois, isto se a ligação das fibras de amianto for fraca: o risco de libertação de fibras é maior devido à friabilidade do produto ou material.
Se, pelo contrário, as fibras estiverem fortemente ligadas num material não friável, a probabilidade de essas fibras se libertarem será menor.
 
Um determinado material libertará mais ou menos fibras de amianto consoante estiver intacto ou danificado. O estado dos materiais que contêm amianto pode alterar-se com o tempo, nomeadamente em função dos estragos, do desgaste ou das condições climatéricas.

CONSEQUÊNCIAS DO AMIANTO PARA A SAÚDE

O amianto é perigoso ao dispersar-se no ar sob a forma de fibras muito pequenas que são invisíveis a olho nu. A inalação dessas fibras de amianto pode provocar uma de três doenças:
- Asbestose, uma lesão do tecido pulmonar;
- Cancro do pulmão;
- Mesotelioma, um cancro da pleura (a membrana dupla lubrificada e lisa que reveste os pulmões) ou do peritoneu (a membrana dupla lisa que forra o interior da cavidade abdominal).

A asbestose dificulta severamente a respiração e pode ser causa coadjuvante de morte. O cancro do pulmão é mortal em cerca de 95% dos casos. O cancro do pulmão pode igualmente sobrevir em caso de asbestose. O mesotelioma não tem cura, conduzindo geralmente à morte no prazo de 12 a 18 meses a contar do diagnóstico.

Apontou-se para o facto de a exposição ao amianto poder provocar cancro da laringe ou do aparelho gastrointestinal e suspeitou-se de que a ingestão de amianto (por exemplo, em água potável contaminada) pudesse causar cancro gastrointestinal e pelo menos um estudo conclui haver um risco aumentado no caso de ingestão de água potável com concentrações de amianto excepcionalmente elevadas. Contudo, estes indícios não foram confirmados de modo consistente pelos resultados de estudos relevantes.
A exposição ao amianto também pode provocar placas pleurais. As placas pleurais são espessamentos focais, fibrosos ou parcialmente calcificados que se desenvolvem na superfície da pleura e podem ser detectados por meio de uma radiografia torácica ou tomografia computorizada. As placas pleurais não são malignas e, em princípio, não afectam a função pulmonar.

LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

A Lei n.º 2/2011, de 9 de Fevereiro visa estabelecer procedimentos e objectivos com vista à remoção de produtos que contêm fibras de amianto ainda presentes em edifícios, instalações e equipamentos públicos.

Prazos estabelecidos na Lei 2/2011
Prazos
Acções
Até 2/2012
O Governo procede ao levantamento de todos os edifícios, instalações e equipamentos públicos que contêm amianto na sua construção e resulta numa listagem de edifícios públicos que contêm amianto - a qual é tornada pública, designadamente através do portal do Governo na Internet.
Após 90 dias
No prazo de 90 dias contados a partir da publicação da listagem referida no número anterior, a Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT), mediante os registos de concentrações de fibras respiráveis detectados e face aos valores limite de emissão (VLE) previstos na legislação que regulamenta esta matéria, propõe, para cada um dos casos identificados na listagem, aqueles que devem ser submetidos a monitorização regular com frequência determinada e aqueles que devem ser sujeitos a acções correctivas, incluindo a remoção das respectivas fibras nos casos em que tal seja devido.

Compete ao Governo estabelecer e regulamentar a aplicação de um plano calendarizado quanto à monitorização regular a efectuar e às acções correctivas a aplicar, incluindo a remoção dos materiais que contêm fibras de amianto presente nos edifícios, instalações e equipamentos públicos que integram a listagem referida no artigo anterior, bem como a sua substituição, quando for caso disso, por outros materiais não nocivos à saúde pública e ao ambiente.

O plano calendarizado referido nos números anteriores deve ser elaborado pelo Governo no prazo de 90 dias contados da apresentação da proposta da ACT, ouvidas as autarquias envolvidas nas acções a empreender
Obrigatoriedade de informação aos utilizadores
As entidades que gerem cada um dos edifícios, instalações e equipamentos públicos, constantes na listagem referida no artigo 4.º, têm de prestar informação a todos os utilizadores desse edifício da existência de amianto e da previsão do prazo de remoção desse material.

A listagem de edifícios públicos que contêm amianto ainda não foi publicada.
A escola deve acompanhar a publicação de legislação nesta matéria e monitorizar a sua implementação.

sexta-feira, 1 de março de 2013

fadinho para o 2 de Março

acabei mesmo agorinha de me inspirar com o Valupi e tenho de partilhar.

parteiros

houve uma coisa que me fez sumariar uma outra coisa: o que nos marca realmente? e, sem ser surpresa, uma conclusão surpreendente - pouca coisa nos marca apesar de acharmos sempre que os anos de vida em frequência acumulada é que valem. é nada disso, marca-nos aquele excerto do livro (nem sequer é o livro inteiro), aquela música, aquelas palavras daquela boca ou daqueles olhos; marca-nos aquele sorriso ou aquele choro - o olhar do filme; marca-nos aquele presente - aquele sentimento. obviamente que ser uma parte do todo não é ser o todo, isto à primeira vista. mas na fantasia, a realidade só pode ter uma leitura fantástica ou estar de pé é sempre, literalmente, andar com os pés para a cova, não será de todo assim: o todo pode ser uma parte na perspectiva da dominância: um livro é-me lindo se se me agarra em uma frase que se descreve; uma música é-me deliciosa se se me prende por um minuto de som ou palavras avassaladoras; o filme, o tal, tem aquele meio mais próximo do início do que do fim com uma narrativa especial; tu podes ser maravilhoso não obstante teres uns pés enormes com os dedos mais tortos do que a torre de pizza - aqui o exercício feito ao contrário.

é assim. o que nos marca é uma espécie de caricatura espontânea que fazemos do que nos chega através dos sentidos. o que nos marca é o que incontrolavelmente sentimos (pensar e falar também é uma parte do sentir); o que nos marca inteiros são as partes. e é por isso que somos inteiros.

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

já pia

há imagens que ficam para sempre. há gentes que vivem a carregar a imagem que um dia ficou - nasceu do pior, do degredo, da devassidão de outras gentes. e à luta pela sobrevivência junta-se a luta pela decência, qual imagem tornada irreal, invisível, inexistente, por entre leituras ou lembranças de outros dias. porque um passado pode e deve definir um futuro daqueles que o mancharam a presente; porque um passado não pode e não deve definir um futuro dos outros - dos que merecem viver, corcundice de deitar fora, livres do peso do passado dos fazedores de manchas. 

agora há música em um coração, imagem, que já pia.



quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

risota pegada

passou a tarde a colocar silicone em uma extremidade da pia. já no carro, a caminho do centro de saúde, queixa-se dos resquícios do cheiro nas mãos. não faz mal, pai, se a médica sentir - e perguntar - dizes-lhe que acabaste mesmo agora de apalpar mamas modernas.

grândola vila morena à la portuga do século vinte e um

na terra da falta de fraternidade canta-se, não para espantar, para espalhar os males.

eis a minha sugestão para alteração da letra:


Grândola, vila morena
Terra da mediocridade
O povo é quem mais se ordenha
Dentro de ti, ó cidade
Dentro de ti, ó cidade
O povo é quem mais se ordenha
Terra da mediocridade
Grândola, vila morena
Em cada esquina, um inimigo
Em cada rosto, desigualdade
Grândola, vila morena
Terra da mediocridade
Terra da mediocridade
Grândola, vila morena
Em cada rosto, desigualdade
O povo é quem mais se ordenha
À sombra duma videira
Que já não sabia a vinagre
 Jurei pôr-te na mira
Grândola, a tua ira
Grândola a tua ira
Jurei pôr-te na mira
À sombra duma videira









Que já não sabia a idade

encontro espontâneo

vamos cruzar-nos?

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

do sanitar se faz gente

as tarefas domésticas são sábias porque nos induzem, se quisermos atribuir-lhes o devido valor, à sabedoria. lavar a louça, por exemplo, pode ser um óptimo exercício de reflexão ou até de achar a solução para um problema - é uma questão de sair do quadrado ou do redondo que é a pia e lavar não só, mas também, a louça. mas nem sequer foi com esta tarefa que cheguei n conclusão de que o mundo precisa de gente gira. o que é gente gira? antes de mais convém referir que foi a lavar uma sanita, depois da desinfecção e já na parte do brilho com um pano sem pêlo, que me ocorreu a gente gira. gente gira é, então, toda aquela que de bagagem apetrechada, bem apetrechada, não deixa que esta lhe ofusque a visão periférica do viver. a gente gira é leve, não se sente melindrada por confessar que gosta de comer banana dentro do pão ou engolir a gema do ovo estrelado inteirinho para ele estourar em êxtase no paladar; a gente gira gosta de conversar e trocar ideias e risos e não pensa 20384657592029 vezes, espontaneidade em bicos de língua, antes de falar; a gente gira não tem receio de se mostrar se mostrar fizer parte daquilo que está a fazer com o outro (de outra forma qual é o papel do outro e para que vale conversar?); a gente gira não se perde em labirintos nem em jogos porque não existe para perder nem para ganhar - só para viver. 

entretanto, já na parte da limpeza da banheira o assunto passou a ser outro - giro, também de gente, mas outro. depois um dia destes se me apetecer, conto.



de cabrão a cabrãozinho

estou convencida que por vezes o corpo prega-nos partidas para nos darem lições de vida. teve dois enfartes quase seguidos e em um espaço de duas semanas, aproximadamente, muita coisa mudou em redor - inclusivé em mim que, perante a fraqueza do meu pai a que nunca estive habituada, passei a dar mais atenção à linguagem do universo. e agora sei, tenho a certeza, do porquê de ter sido necessário ele, o ex-cabrão do universo, arrancar-me tudo: de outra forma nunca teria mudado de cidade. 
com o entendimento chega a tranquilidade e passei a chamar-lhe cabrãozinho.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

sabor

faço questão de saber a que sabem todos os meus passos: a minha cadela lambe-me os pés e logo de seguida eu lambo-lhe a língua.

frescura

já não me lembrava de ver os verdes cobertos com uma manta branca de lã,
 tão frágil, 
que passando a mão sussurram: cuidado que podemos par
tir
-nos
 todos. e então, com a ponta dos dedos, muito ao de leve, sente-se um fresco molhado como quando em dias quentes de verão recebemos a brisa do mar em final de tarde. as mantas brancas de lã das manhãs de inverno são as brisas do mar do verão. 

no fundo, nem sequer é preciso aprofundar muito para sabermos, a frescura da natureza está para nós, se a quisermos abraçar, o ano inteiro.

domingo, 24 de fevereiro de 2013

bacanal

acontece que o bolo ficou de uma boniteza por fora e completamente cru, em estado líquido, por dentro a uma temperatura leve de 150ºc.o que é estranho. isto leva-me a concluir duas coisas: a primeira é que, sectárias, laranjas e cenouras, não ligam com espontaneidade, só se gostam pela cor; a segunda é que remediar é um verbo típico português - já que consegui fazer deste último falhanço um bolaço de chupar os dedos e até de eles se chuparem a si próprios e uns aos outros: um bacanal de tacto e paladar.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

solha

as solhas são difíceis de amanhar por serem muito achatadas e de cabeça pequenina. além disso são bastante escorregadias. em contrapartida fazem as delícias do paladar. nem sei bem como é que o povo nunca se lembrou de meter uma solha em um provérbio popular, do género: dia em que não entra solha venha o diabo e escolha.

espero que o cheiro a peixe das minhas mãos tresande - afinal de contas, pelos dedos renasce o peixe.


quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

a pomba que arrotou a doce

em um elevador público, a ougar, convencidíssima de que o homem tirava da embalagem pequena que trazia na mão, com satisfação, m&ms: dá-me, por favor, um que estou a ougar? esgar de espanto, o dele, e  desconsolo meu: eram miniaturas de bolachas (dispenso bolachas, não aprecio). e, guardando-a - sem ele perceber- no bolso para dar à pomba que se cruzasse primeiro comigo, agradeci.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

cera boa e bem-vinda

os ouvidos haviam de ter uma tampinha, para onde caíssem as palavras dos outros, com uma redinha coadora: retido, pronto a esvaziar, ficava tudo aquilo que ouvimos ou que nos dizem que não queremos. e não acumulávamos merda, só cera, tão bom.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

estupidez sincera

oito euros na carteira e ainda sem almoçar. desculpe incomodá-la mas não tem uma moeda que me dê para eu conseguir juntar dinheiro para ir para Bragança? fui enganado num trabalho e não tenho como voltar para casa - ando aqui desde as dez da manhã para arranjar sete euros e meio. quanto lhe falta? tenho um euro. então pegue lá seis euros e meio.

sinceridade estúpida

como dadora de sangue páro no parque. vai dar sangue? não, vou ver o meu pai. então tem de sair.
(parece que adivinhou, o que nem sequer me passou pela cabeça, que ainda teria de esperar cinco horas para vê-lo)

JJ: vais-te minar

não dá para aguentar mais: é urgente fazer um cataterismo ao coração da política portuguesa, não dá sequer para esperar que, até 2015, o governo morra de enfarte. é enfiar-lhe o cateter para desbloquear todas as veias e artérias. já. o povo, mesmo unido, sozinho não consegue. imobilize-se o sector produtivo - unam-se os empresários para fazerem cair o governo, ajam pela não-acção; inibam-nos de chafurdarem na merda que fazem porque a merda já começa a tirar-nos o ar que respiramos.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

imprescindíveis



nutro um carinho especial por colheres de pau. na restauração é proibida a sua utilização por conta das bactérias que acolhem e mantêm no meio da madeira - percebe-se e subscrevem-se as regras do HACCP. no entanto, na minha cozinha - ou em qualquer outra que me sirva de base da alquimia -, são-me imprescindíveis: pequenas, grandes, ponta reconda ou quadrada, rasas ou fundas, não interessa. o que me importa é que sejam de pau e quanto mais antiga e carcomida fôr a madeira melhor. são lindas, maravilhosas, de uma elegância estonteante por fazerem com delicadeza os movimentos que inauguram o manjar. hei-de arrecadar muitas colheres de pau para quando chegar o dia em que simplesmente não serão fabricadas, a mim não me faltarem.

e hoje encontrei mais uma, moreninha, quase torradinha nas extremidades, uma beldade.

na terra dos rancheiros

foi giro rever as personagens e as marcas do tempo. ouvir a música do genérico e as pronúncias. nem sei bem há quanto tempo a série começou a passar na tv mas lembro-me de tudo como se tivesse sido ontem. e foi.

domingo, 17 de fevereiro de 2013

sense of life

fui ver, curiosa, e dei comigo em outro lado. houve um desvio, o endereço já não existe, e uma surpresa. uma surpresa boa.


de romantismo reza a história

custa-me imensamente perceber a dificuldade, ou talvez a resistência e oposição, de uma grande fatia de gente que considero inteligente excluir a hipótese de a inteligência ligar com romantismo. parece-me uma falha gravíssima de inteligência, uma espécie de hiato, como se espaço entre os lábios de corola, de ocorrências sensíveis, que dá nos que são, e sabem ser, inteligentes. já sem falar nos dias de hoje, a história está carregada - quiçá corcunda - de gente inteligente com um romantismo quase irrespirável de tão maravilhoso em qualquer arte que reflicta (também é preciso saber bem distinguir entre o ser e o parecer que apenas apanha a corrente) o romantismo. talvez confundam, os anti-românticos, romantismo com azeiteirice ou pimbalhice - mas isso é problema vosso, queridos: vão, ide, apurar o vosso senso de oportunidade para acharem os românticos já que me parece estar o apuro no tal desencontro. é uma espécie de desprezo, olhar envinagrado, sobre aquele que é um estilo de ser e de estar, que lançam os anti-românticos.



sábado, 16 de fevereiro de 2013

breve história sensível

era uma vez uma pedra pomes que vagueava indiferente por superfícies lisas depois de ser cuspida, para a vida, por um vulcão.

moral da história: há muita gente com a sua falta de sensibilidade: só se toca com calosidades.

aqui fica um hino à sensibilidade:


sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

tradição

os cemitérios já não são o que eram: campa sim campa não há flores de plástico roscofe, daquele carcomido pela humidade do tempo, uma puta de uma crise. e entretanto ele chegou-se a nós, um conhecido da minha madrinha querida e fantástica, senhor que terá a mesma idade que ela, de setenta e sete anos  - um poço de bom humor, e diz: já sabem que hoje não se pode comer carne, já não se respeita a tradição. de imediato, concordei com o desuso da tradição mesmo nunca tendo sido sua fã e rematei: mas também de que vale não comer carne na mesa se vocês, os fiéis a essa tradição, depois chegam à cama e desfazem o sexo?
a minha titi riu-se toda comigo mas ele, o senhor da tradição, ficou engasgado. e nem riu nem piou.

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

é mesmo isso

vão apanhar no cu.

caixão

quem se mata tem mesmo de deixar dinheiro para pagar o funeral, é uma questão de dignidade.
mas tu achas que na situação em que o país se encontra haverá muita gente que consegue pagar o próprio funeral?
não, não haverá.
mas então qual é a tua ideia, o que estás a querer dizer?
estou a dizer que este governo é um incitador à vida.
de facto, só mesmo tu para descobrires algo positivo nestes cabrões.
mas eu disse que é positivo? desde quando viver é ter de fazer prova constante de dignidade perante os outros?
então estás a querer dizer o quê que não estou a perceber?
estou a dizer que há quem viva, em tragos constantes de dignidade, a morrer.
tu és complicada.
sou: o meu caixão é aquele ali, cor-de-rosa quando sonho, preto como o dia.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

otroilaré, otroilará

sobreaquecimento e ruído. era assim que estava o meu PC desde há alguns dias - tanto que nem a minha cadela se aproximava dele. já por um fio, por conta de atingir temperaturas elevadíssimas e desligar-se por segurança vezes sem conta, e antes de pegar em um martelo e parti-lo todo, resolvi investigar. li, entretanto, que não é atípico nesta marca acontecer e que muitas vezes a causa está no pó acumulado no dentro. desaparafusei, abri, limpei as tampas, bufei, desaparafusei a ventoínha, aspirei-a, e voltei a aparafusar tudo. 

ah: e já guardei o martelo.

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

desdarwinizar

está na cara que é cultural.

raios e fodiscos




vão todos para o raio que vos parta, dizem os Deuses. e quando dizem todos querem mesmo dizer todos: todos os que aplaudem, todos os que criticam, todos os que julgam, todos os que se servem do preconceito para combater o preconceito. isto porque os Deuses, preocupados com tudo e com todos, não quiseram usar as palavras que pudessem ferir susceptibilidades de uns e de outros - de outra forma diriam: vão-se todos foder, cambada de fracos de que tem rezado a história e aprendam, de uma vez por todas, que a fé, seja vestida com que roupagem fôr, faz falta. assim como a falta que faz começar por cada um, antes de apontarem a dos outros, uma resignação diária de incompetência pessoal. uma espécie de auto-reclamação no livro do viver que permitirá uma superação de não-conformidades e respectivo ajustamento. e talvez o mundo galope para melhor. sim: o mundo avança em melhoria contínua se cada pessoa fizer o seu processo de melhoria contínua porque o mundo, essa abstracção, não tem costas largas.

domingo, 10 de fevereiro de 2013

alma de canapé

na clínica, uma mesa com vários montes de revistas de aquelavestiuaquiloeooutroandacomaprimada outra. no fundo, bem escondido, um livro com uma capa grossa e brilhante e diferente, fundo de louça chinesa, chamou-me: era um livro de leilões de antiguidades que me fez companhia durante algumas horas e, desconfiando que ficaria ali subestimado e ignorado por muito tempo, me pediu para vir, mãos dadas, comigo. porque não é roubar tudo aquilo que pode ser feito mais feliz. 

deslumbrante o par de baldaquinos portugueses do século XVIII, em talha de madeira e dourados a ouro fino, com falhas e defeitos, 171 cm; e as cadeiras, onze, Luís XVI, em nogueira, decoradas com talha cordoada terminando em florão, estofadas a veludo verde com poucos sinais de uso? lindas de viver. apaixonante a pequena chaise-longue forrada a seda azul com armação em mogno, faltas e defeitos, do século XIX. e depois a garrafa e o frasco de prata em vidro cor de rosa lapidado, com copo, prato e uma tampa partida em prata javali de colar os olhos e deixá-los ali ao abandono da beleza. seguiu-se, passadas muitas folhas, a taça chinesa em jade branco com armação em ouro com esmaltes do século XIX, deliciosa, poderosa. e o quadro Di Cavalganti (1897-1976), desenho sobre papel representado duas figuras, datado de 1943 com uma moldura linda? tanta sobriedade de cor e existência. mas a minha peça preferida foi o canapé, com vestígios de xilófagos, estilo Luís XVI, francês do século XIX, em madeira entalhada e dourada, assento e costas forrados a tapeçaria de flores, cheio de defeitos, falhas no dourado. 

é maravilhoso o detalhe de todos estes objectos como se houvesse uma tentativa desesperada de lhes dar uma alma na sua concepção. e é isso que a modernidade não faz, foi isso que a revolução industrial e a produção em série veio retirar da criação: a alma. a alma mora no pormenor, nos pormenores que fazem o todo de cuidado, de dedicação, de tempo. até um canapé para ser feito precisa de amor.

sábado, 9 de fevereiro de 2013

provérbio desenrascado

quando tudo tudo corre mal só há uma coisa que pode correr bem - manteres a saúde mental.

outra coisa boazuda pr'a comer e chorar por mais:

Socratopatia

não posso esquecer de partilhar isto

porque é muito, mesmo muito, bom: quatro aproximações à criatividade.

que não queira

mesmo antes do final do ano que passou, ainda eu morava em Vila do Conde, ai que saudades dos esquilos e das árvores e da areia e do mar, criei neste meu pc uma conta para o meu pai: combinamos que iria aprender a mexer nele. costumam ser os filhos a não terem paciência para ensinar os pais mas neste caso é o meu pai que não tem paciência para aprender comigo. pronto, sendo assim vou tirar a conta dele. olha Franklim, não me vou ficar triste: há muito futebol para veres e muita máquina de ginásio para gastares - faz muito bom, excelente, proveito.

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

fornicanço

ontem à noite, enquanto passeava a minha cadela, vi um casal a fornicar dentro da viatura. vamos lá esclarecer isto: tenho nada contra o fornicar e muito menos contra o fornicar em viaturas - mas tenho contra o fornicar em viaturas na praça pública e à minha frente. não eram sete e pico nem oito e meia mas eram nove e tal, hora de muita gente passar na rua para afazeres ou passeios. mas será precisamente a adrenalina de alguém os ver que os excita, pois claro, porque fornicar é algo íntimo e, portanto, não partilhável com terceiros. fará falta a esta foda de gente causas efectivamente potenciadoras da excitação e, na falta delas, saem para a rua para se roçarem nos olhos dos outros. até me parece que serão estes os maiores voyeurs. comigo não têm sorte e se estivessem mais perto da minha entrada era menina, era sim senhora, para desandar com um balde de água para cima do carro. ao menos teriam o gozo de ter uma experiência efectivamente encharcada.

don juan

descobri esta música que apesar de não perceber nadinha do que diz a canção, a não ser don juan, conseguiu pôr-me a abanar a cabeça e o sorriso. é gira.


quase que conseguia

fotografar. não é que ele se tivesse mexido - ficou, aliás, bem quietinho a ver-me observá-lo com alegria. se é verdade que sentimos o que vem de nós também o será afirmar que o que vem de nós também nos sente. e ele sentiu-me. sentiu a minha vaidade perante ele, perante a força da natureza que o terá esculpido com tamanha perfeição sem, obviamente, sem pressa. sim porque fazer à pressa o que quer que seja só pode dar em meros esquissos tantas vezes ranhosos. mas como estava a dizer, não é que seja uma amante da perfeição do fora: gosto muito da imperfeição perfeita mas já no que respeita ao dentro...vá...admito...sou perfeccionista. e não é que hoje caguei, sim, eu sei, cagamos todos todos os dias se tudo está a correr bem e há obstipação quando alguma coisa corre mal, mas eu hoje caguei um coiso absolutamente perfeito. gosto de ver o que faço antes de fazê-lo desaparecer e não tenho memória de um coiso assim: liso, homogéneo, inteiro, nem fino nem grosso, exactamente a meio do orifício da retrete, sem ter espirrado resquícios para lado algum, um coiso, como já disse, absolutamente perfeito. e fiquei ali, aí uns dez minutos, a olhá-lo como de não houvesse amanhã, como se tivesse cagado para sempre. foi um momento feliz, de muita alegria, tanta que corri a buscar a minha máquina para registar a evidência da perfeição. e nada, a puta da máquina fechou-se nela, talvez como que em protesto contra a perfeição. sim, eu sei, a esta altura já estará alguém a pensar que sou porca e execrável e blábláblá. e que seja. mas de uma coisa não me podem acusar - a de ser dada a uma perfeita porcaria. e isso fará de mim uma porca perfeita de uma imperfeição tamanha. excelente.

sem limites



nunca entendi muito bem a expressão "o céu é o limite" por me sugerir, precisamente, limite. talvez precisasse de ler e ver isto para entendê-la. como se voar fosse, e é, com e para além das nuvens, alucinação. e alucinar, entenda-se-me, como apaixonar - sair da caixa da paixão como desvario sem razão mas antes tê-la ali ao lado em consciência de que é lá que conseguimos ser, paixão e razão, ambas.

a nebulosa da gaivota mostrou-me, inspirou-me, que é precisamente quando mantemos o padrão saindo dele que podemos ser quem somos. é aqui que neste ponto, que rocei ainda agora, que ser e identidade se cruzam naquilo que é ser sempre três: 
nós
os outros
o amor/a amizade/(..)

ou assim:

nós
o amor/a amizade/ (...)
os outros

e nunca assim:

o amor/a amizade/ (...)
os outros
nós

nem assim:

os outros
nós
o amor/a amizade/ (...)

atente-se que a gaivota, veja-se como o infinito é sábio, é nebulosa. fantástico.

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

contentor de riso

levar o lixo ao contentor pode ser hilariante se encontrarmos alguém que nos diz: amanhã vou dar-te uma coisa para enviares pela ternex. mas depois tens de ficar atenta na ternex. tive de conter o riso, muito riso, porque foi dito com muita convicção e gosto. foi uma questão de aguentá-lo, para soltá-lo, uns minutos até entrar em casa. posso dizer que levei tanto o lixo como o riso ao contentor.

dica esperta

não há melhor hidratante, e protector solar, para os cabelos compridos e morenos, do que a abóbora. faz assim: coze meio quilo dela e, depois de a escorreres muito bem, faz um puré. acrescenta-lhe um iogurte natural e aplica nos fios da beleza quando estiverem húmidos e deixa passar um quarto de hora. depois lava-os normalmente e repete isto de quinze em quinze dias. o resultado? o resultado é teres cabelos como os meus: brilhantes e nunca espigados mesmo só cortando uma vez por ano com a tesoura do peixe. verdade.

tolinho número três

ontem à noite fui recebendo no telemóvel disto assim:

boa noite quanto quer pelo carro
boa noite, com quem estou a falar?
André e você quem é
Olinda deFreitas. Seiscentos euros negociáveis.
E ta bom
nunca me deu problemas, e tem a inspecção em dia, a não ser da normal manutenção para um carro de 94. é uma questão de ver e experimentá-lo.
a sua idade é 94
não percebi. o carro é do ano de 1994 e está comigo há 12.
posso saber a sua idade é que dizem sempre que é de velhinhos ou de velhinhas
que disparate. tenho trinta e oito anos.
você é extravaganza
não. mas tenho telefone fixo se quiser ligar e fôr gratuito.
e se ligar não tem bebés que podem acordar
aqui não há bebés mas há uma adulta que não quer brincar.

e assim se calou mais um emplastro supostamente interessado em comprar o meu carro. foda-se.

onde está a risota?

no dentista perguntei ao meu pai se me dava leite de vaca quando eu era bebé por conta da fragilidade dos meus dentes e as persianas da boca dele nem se mexeram - só as do doutor.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

ja me estava a esquecer disto

diz ela, como que à espera de respostas mudas à questão lançada para o ar, nem sei bem o que é uma alma gémea. logo a seguir ouviu isto: é aquela que não pára de nos surpreender com a sua ao mesmo tempo que não se cansa de ver, e apalpar, as mamas que vão murchando. o silêncio confrangedor que se seguiu levou-a a mudar de assunto. a mim só me deu vontade de rir muito depois do dito, do meu, e da aflição, da dela. e ri.

dilema acabado de desfazer

há aqui um pequenino dilema: devo escrever Português que se preze, por convicção e paixão, ou brasileirês, por mera conveniência, para prestar provas em uma entidade brasileira? das duas uma: ou faço o que tenho vontade e orgulho e há a forte possibilidade de me lixar redonda ou castro a língua e sei, com absoluta certeza, que estou nas segundas eliminatórias. por outro lado, vai doer-me p'ra caralho estar a amputar letras e travessas e sentidos - mas também dói ficar no banco a ver jogar. verbalizar, de facto, ajuda e já sei o que farei: delicadamente vou perguntar, imediatamente antes de começar a escrever, se é com ou sem acordo e depois mediante a resposta, se fôr o caso, seguirei o caminho dos carneiros mascarada de lobo - até conseguir impôr e contagiar, por direito, abraços em sorrisos, o meu querido e estimado Português. é isso, galera, está tudo em cima bicho.


terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

no meio da confusão, de repente, isto.

"bom dia, 7 de Julho

ainda deitado a minha mente suspira por ti, minha amada imortal, de vez em quando alegremente, depois tristemente, esperando o destino, se ele nos ouvir. só posso viver contigo, ou de todo. sim, decidi estar o mais longe possível, até poder voar para os teus braços e sentir-me em casa contigo, e enviar a minha alma envolta na tua para o reino dos espíritos - sim, lamento, tem de ser. vais recuperar ao conheceres a minha lealdade; mais ninguém terá o teu coração, nunca - nunca! meu deus, porque é que alguém se há-de separar daquela que se ama tanto, sendo a minha vida em W. tão triste. o teu amor faz de mim o mais feliz e infeliz ao mesmo tempo. na minha idade preciso de alguma estabilidade na vida - mas poderá isso existir para nós? anjo, acabo de saber que há correio todos os dias - devo concluir, para que esta carta te chegue de imediato. tem calma - ama-me - hoje - ontem.
que saudades em lágrimas por ti - tu - a minha vida - meu tudo - até breve. oh, ama-me sempre - nunca duvides do coração fidelíssimo do teu amado.

L.
sempre teu.
sempre meu.
sempre nosso."

Ludwig van Beethoven
(1770-1827)

que vivam as cartas de amor. melhor: que haja amor passível de ser, além de vivido, também escrito.


contorcionar




a palavra do dia do Priberam é vigorexia. e fiquei a pensar em quem será o maior vigorexico da actualidade. lembrei-me de muita má e boa gente mas fiquei-me pelo dono do Cirque du Soleil: o despedimento de quatrocentos funcionários de uma só vez faz parte do coadunar o negócio com a performance do mesmo, interpretação contorcionista minha,  não tendo nada que ver com uma eventual crise instalada na empresa.


segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

madame

dei por mim a pensar assim, no mercado, sobre a abóbora:

madame meia descascada, e de pevide ao ar, a arejar, cor de vitamina, pele lisinha e malhada, semeia fisgados olhares, p'ra doce ou panelão, inveja das alfaces verdinhas ao sol a corar que suspiram assim: nunca mais chega o verão para sermos inteirinhas desejar.

domingo, 3 de fevereiro de 2013

dormideira





caule em erecção, preguiça ao acordar, olhar de lua verdadeira: põe o chapéu, aperta o laço, sorri - é assim a minha de branco dormideira.

sábado, 2 de fevereiro de 2013

pressão

uma das piores coisas que a vida tem, senão a pior - não sei bem, é a de se conseguir lidar e gerir e aguentar e ultrapassar a pressão que os outros fazem sobre nós - sobre aquilo que, o que querem que sejamos, somos. as maiorias servem para esmagar as minorias, não tenho dúvidas.

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

vida da morte

ele dizia sempre que não queria ir ao hospital porque era lá que morreria - que o matavam.  e dizia-o em tom de riso, dizem, como piada convicta de domingo em família. era asmático e custava-lhe respirar, especialmente naquele dia, há três meses. quiseram levá-lo ao hospital e resistiu mas, como respirava mal, foi. nesse dia, nessa noite, deram-lhe medicação à qual era alérgico e morreu. morreu no hospital - mataram-no. e a mulher, enfermeira nesse hospital, sabe que lhe administraram medicação interdita. mas calou-se, não reagiu, por pensar, atendendo ao que ele sempre disse, que foi o destino .

(o destino faz-se anunciar e é esse o destino do destino? nesse caso o destino também morreu - mataram-no. foi a morte. é a vida.)


quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

estafa Capital

saí e cheguei de noite. não é fácil ir e vir no mesmo dia a Lisboa mas pelo menos perdi a aversão que tinha a comboios - já não apanhava um há mais de vinte anos. mas houve mais coisas boas: a largueza e a luminusidade da praça do comércio; a dúvida se estariam a limpar o D. José; a agitação engraçada da praça luís de camões; a caminhada em meias pela baixa da cidade por conta de os saltos já não aguentarem os pés; a pronúncia deliciosa dos conterrâneos. agora as coisas chatas e feias: o cheiro a mijo das ruelas, típico das zonas antigas das cidades por onde páram as gentes porcas; o lixo pelo chão das mesmas ruelas; os trezentos e tal quilometros andados apenas para dois minutos de entrega de documentos; a ordinarice dos assédios; a longa viagem de regresso sem uma bacia de água quentinha com sal para saciar os pés; a falta de alegria na cozinha lisboeta.

(mas não faz mal - para a próxima será melhor)

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

há sempre uma boa notícia depois de uma grande dúvida

o que caralhos é uma fotografia em tamanho 3 por 4?

ouvi falar da gostosura das caras de bacalhau e quis experimentar: feitas à espanhola é de chupar nos dedos depois que acaba e se limpa o molho do prato a pão.

o carro mais interessante do (meu) mundo

o mundo está cheio de gente que não sabe o que quer: primeiro pediram-me fotografias do carro para argumentarem o interesse - coloquei-as e nada. depois, mostram interesse e pedem-me para ver o carro - tento marcar e nem com o cu nem com a boca. estão a querer dizer-me que o meu carro não é interessante? é que se for o caso eu guardo-o para mim até cair de podre já que foi, e continua a ser, um amigo muito especial. obviamente que gostava que fosse para alguém que quisesse conhecê-lo a sério, lhe apalpasse os pedais com jeito e o buzinasse com vigor e orgulho mas, na falta de melhor, antes comigo e parado do que com indecisos desapegados a mexer.

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

o que pode ser feito

quando, por exemplo, esperamos na loja do cidadão: apreciar os toques dos telemóveis. ele toca e, de imediato, olha-se para onde e para quem. depois, quase em simultâneo, faz-se uma mistura da cara com a careta - ou, neste caso, com a trombeta. e não é que bate certo? há aqueles que tocam um som filho do telefone que pertencem áqueles que têm postura de indiferença e cara de feijoada sem sal; depois, aqueles que seguem as tendências da moda, cabelos esticadíssimos e unhas de gel pirosas, são acordados por aqueles que tocam a Rihanna ou Alicia Keys; depois, talvez pela vontade de ouvir, ouve-se, enfim, um toque diferente, de uma música acomercial - nem sei se esta palavra existe -, que passou em tempos no rádio mas que logo a voar migrou para as memórias de poucos, e que toca para chamar alguém que decerto estará sentado numa ilha mesmo ali no meio do mar das gentes. é difícil escolher as palavras certas para os sons certos, penso. não, é nada difícil, penso logo a seguir. porque os toques, na verdade, saem do toque da alma de quem os escolhe para serem chamados a toque.

pelo caminho deu esta, tão gira, que talvez esteja por aí no chamar de alguém:




questãozinha pertinéintxi

fez-se-me luz mesmo agora quando percebi que um atestado de bons antecedentes é a mesmíssima coisa que um certificado de registo criminal.

será que quando se rouba involuntariamente o coração de alguém - que o agarra e segura com imensa força- fica registado e será isso sinal de maus antecedentes?

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

e mais

atendendo a que a culpa está nas alterações informáticas, não há nada que me irrite tanto quanto a informática fora do meu controlo, que têm vindo a ser efectuadas no portal, dizem-me eles, agora a vontade sobrou também o Gaspar. a esse dizia-lhe para se despir todo com excepção das meias, já que não sou igual a ele e não o quero ver descalço tal como ele faz ao povo, e pendurava-o em uma árvore centenária mesmo por cima de uma colmeia - esperando que os zangões lhe subissem às miudezas e lhe deixassem a pila feita em uma laranja bem redonda e de cor viva.

javardice

a nova versão do java está a tirar-me do sério: instalo, desinstalo, vou aqui, vou acolá, dou pinotes, fecho, abro, e não consigo submeter uma declaração pelo portal das finanças. é caso para falar em javardice pegada, já que só tenho vontade de que o programa se transforme em alguma coisa palpável e esmagá-lo todo com as mãos e depois com os pés e aspirá-lo e depois rir-me toda por vê-lo misturado com o pó e os cabelos e os pêlos do saco do aspirador e depois despejá-lo em uma vala de esgotos para ser lambuzado pelos ratos. que nervos. só de pensar que adorava, sim adorava, o desenho da consola. agora nem o posso ver.

domingo, 27 de janeiro de 2013

puta que pariu os cabeçudos, cérebrudos.

pensar sequer que este ou aquele grande pensador ou filósofo ou poeta serve de muleta, pelos dizeres, a quem quer que seja no modus vivendi, dá-me volta à tripa. há quem fale de grandes homens pelo que disseram, pelo rasto de evolução social que deixaram quando falharam redondamente enquanto indivíduos e seres efectivamente vivos - a crítica, e a renúncia a serem gente, baseada no argumento da imobilidade social nada mais é do que um escape, uma saída airosa e covarde, da imobilidade pessoal a que se votaram por impotência inerente a si próprios - uma enorme deficiência emocional tapada a todo o custo pela intelectualidade.

isto a propósito de uma frase que acabei de ler, ainda agora, num texto sobre Nietzsche - esse filho da puta cabeçudo, cérebrudo, contudo com alma de alfinete, de bico de palito. Homem sem alma é Homem, nunca e nunca e nunca grande, rasteiro.


sábado, 26 de janeiro de 2013

balança


só há uma forma de descobrirmos o que os outros querem de nós: sentirmos se a energia que colocamos em alguma coisa que fazemos ou dizemos corresponde à energia do que nos fazem ou dizem. é uma espécie de balança do sentir, daquela balança - peso a peso - antiga. energia apurada, e depurada, fica o que fica. e o que não fica também.

saias de fazendo





ela diz, ela diz, que tem cinco saias de fazenda que a guardam do ar. mas é mentira, é mentira: ela tem é cinco coroas púrpuras, um altar, que fazem os olhos, saias de fazendo, reinado de ela, amar.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

inveja



inveja |â ou ê ou âi|
s. f.
1. Desgosto pelo bem alheio.
2. Desejo de possuir o que outro tem (acompanhado de ódio pelo possuidor).
não ter inveja anão ser somenos; não ficar atrás de.

estava a pensar se alguma vez senti inveja de alguém e não, nunca senti. a não ser, agora, neste presente gerúndio, de todos aqueles que podem fumar um cigarro grego de mentol, porta escarrapachada e pés esticados para o bidé, quando estão a cagar.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

a bela do beber

como um abrir e fechar de olhos o tempo, que não fica, vai-se. dias e dias que não podemos parar por o tempo dos outros precisarem do nosso tempo e o nosso tempo não ter tempo para nós. depois a fadiga, essa cabra insatisfeita, chupa o tempo, e o dia, já longe, deita-se para o dia seguinte se erguer. e depois, também o inesperado que descontrola o tempo que sem já sem tempo traz o intemperado, uma espécie de intempérie. e no meio disto do tempo sem tempo, que espero que não dure muito tempo, não sei viver sem tempo, descobri um tesouro: uma relíquia antiga, do tempo em que o tempo se fazia notar nos vestidos e nos chás e nos rendilhados do beber da vida, que agora é minha e só minha e não me canso de olhar nem de usar.

olha para ela tão delicada, tão a ouro talhada e pintada, tão de poesia enlaçada. e agora arranjei mesmo tempo para mostrá-la, cheiinha de vaidade, e fazer um brinde à decisão. decidir é, por vezes, muito difícil - principalmente quando o caminho é escuro, e literalmente escuro, em outro continente. mas eis que uma luz se acende, tal e qual a do candeeiro romântico que serviu de fundo à fotografia da bela relíquia, e mostra bem às claras que o caminho não é, de todo, para passar. caminho posto de lado por evidências irrefutáveis pesquisadas à custa de muita, imensa, teimosia e desconfiança, é hora de tomar um chá na bela relíquia - e brindar à decisão. à decisão certa. que alívio.

sábado, 19 de janeiro de 2013

asas


há uma forma muito simples e certeira de descobrir, à mesa, como é uma boa parte do ser de alguém: imaginemos uma refeição com frango, vários frangos, e esse alguém serve-se. as pessoas tendem a colocar no prato a parte que mais apreciam. agora reparamos que esse alguém aprecia coxas e pega em três das seis coxas da travessa, precisamente em metade das coxas disponíveis quando na mesa não estão apenas duas mas três pessoas. ora aqui está: estamos perante alguém indelicado, egoísta e grunho. além de encher o prato como se precisasse de comer como um touro, e de uma vez só, nem sequer pensou nos restantes membros da mesa que poderiam querer repetir a coxa. nestas alturas, dá vontade de lhe meter, ao grunho, no prato, todas as asas da travessa como que em desejo de o pormos andar - dar-lhe asas.

Fernando Vara

há uma pergunta que nesta manhã , imprescindível, tenham paciência, se impõe: ó mar salgado e agitado quantos dos guarda-chuva são hoje apenas varas em portugal?

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

coberta por elas

não é que sejam muitos mas há dias em que o ler esgota o tempo e se sobrepõe ao escrever. começamos a ler e a ouvir isto e aquilo, mimos, e quando vamos a dizer já não há, naquele tempo, tempo. enchemos as bolsas do que lemos e aguentamos, assim, o tempo até podermos dar a encher as bolsas dos outros. as bolsas não têm peso nem tamanho e moldam-se ao que queremos, ao que naquele momento nos faz bem - e só o que nos faz bem guardamos nas bolsas, embora possamos ler muita coisa, aprovisionamos e protegemos do sol e da chuva. às vezes até misturamos as bolsas com o sol ou com a chuva quando queremos sentir-lhes refinadamente o sabor. hoje de manhã foi um desses dias - quando ia para escrever, depois de ler e de ouvir pérolas, não deu. quando um pai adoece, tudo pára menos as perguntas mascaradas de ânimo e calmia: as perguntas que guardamos por não as querermos chamar nem lembrá-las, nem lembrar-nos, que se estão lá é porque existem; queremos que as perguntas vistam a gabardina e desapareçam, inventamos-lhes nevoeiro cerrado e trovões para ficarem longe. mas se elas estão lá, ao contrário de quem possa incansavelmente satisfazer-lhes a existência, logo existem e se existem está tudo fodido. os pais não deveriam adoecer porque os pais são sempre respostas; os pais, que fique registado, possuem um ship por dentro do dentro, que só os filhos vêem, que não admite perguntas, porque os pais são certezas e são respostas. queria tanto que fosse assim.

mas eu não tenho a certeza. e as perguntas estão a cobrir-me toda.

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

pressas é que não

prendeu a minha atenção esta palavra: flambear que também pode ser, diz o dicionário, flambar. lembrarei do flambar apenas por conhecimento da palavra mas não vou utilizá-la, discordo com a falta do e, o e faz toda a diferenta fonética no significado da palavra. flambear tem lentidão, movimento arrastado, enquanto que flambar é assim uma espécie de verbo exacto de botar ao segundo. ademais o que é feito às pressas, como flambar, não me cativa.

a primeira música da manhã é quase sempre a banda sonora, o flambear, do dia.



quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

cheiro olhado




 xarope de vida
groselha do fundo até à ponta
refresco
olhos colados nela como luzes a piscar de mais
fechá-los para voltar a abrir e fixar o gosto dela
sabor a terra fresca despida que sopra
que sopra, sopra, sopra
que sopra e veste os quintais

descrição discreta

não sei bem se será o caso mas fosse eu a ver um anúncio, para venda, assim e havia de gostar muito muito:

"carro fiel, de alegrias e tristezas, com que se pode sempre contar."

quero mais

soube a liberdade, soube a mim, soube-me bem.

o meu novo carro, parado já há algum tempo, precisava de ser esticado. melhor: precisava de ser esticado, em estreia, por mim. juntar o que tem de ser feito com o que se pode fazer só pode dar certo. e ele, moreno de tez e personalidade, deixou-se esticar: alavanca de velocidades tocada e explorada como se amada pela mão; curvas dobradas por dentro como se os pés as quisessem, e quiseram, passear; volume do rádio no máximo como se os ouvidos quisessem, e quiseram, ouvir apenas aquilo e ali.

a sequência de músicas que o rádio ia tocando tornou-se perfeita:

com esta o meu apetite abriu-se como se a viagem tivesse ainda mais quinhentos quilómetros para rodar.

seguiu-se esta que me fez saltar, e soltar, a voz:

pelo meio, desconhecendo que iria para canto, o Rui Veloso. pausa para deixá-lo calar-se. já só pensava, enquanto o gajo não ganhava vergonha na voz, em uma sopa de nabiças bem quentinha.

e depois, esta que já não ouvia desde o tempo que desenhei o elvis presley nas costas do blusão de ganga. com esta, naquela parte do arroto cantado, senti a euforia da imitação:

e depois, ai que alegria!, mãos, pés e ouvidos esticados, a loucura:

estranho

há dias em que dormimos a correr sem, no entanto, o acordar ser transpirado. estranho.

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

disco partido

ao longe, de fundo, aquela voz como um disco riscado, mesmice, que impedia de abalar para outro lugar. impedia, é isso, impedia. já não impede mais.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

dicas espertas

para conservar alface no frigorífico por mais tempo basta borrifar, com água, as folhas e embrulhá-las em um pano húmido ou, mais rápido ainda, cortar um limão e deixá-lo bem ao lado, sedução ácida,  das folhas verdinhas;


quando lavamos
 brócolos e couve flor não nos lembramos dos bichinhos mafiosos que lá ficam escondidos, no meio de tanto aperto - basta deixar estes legumes em água com sal durante um tempo para vê-los, aos bichinhos, consoladinhos e relaxados, a nadar.

(Through the Looking Glass (?) - and what Alice found there)

confundir emoção com sentimento é frequente. desmistificar a confusão é, no entanto, simples: enquanto a emoção surge num movimento de dentro para fora expressa por indícios corporais como linguagem facial e alterações vaso-motoras, o sentimento é eminentemente interior embora possa surgir da emoção e também gerá-la. existem as emoções primárias, aquelas mais selvagens e que não sofreram com o dedo social, onde cabem a alegria, a tristeza, a cólera, a surpresa e a aversão. já nas emoções secundárias, sociedade mestra, figuram a vergonha, o ciúme, a culpa e o orgulho. não havendo consenso optei por escolher estas - tanto para as primárias como para as secundárias - por considerá-las as mais representativas. 

sem querer perder-me no que quero falar, que é da importância das emoções na comunicação à distância, importa referir que constituem a maior, e melhor, valia na detecção dos afectos. obviamente que através de um computador serão poucos os que não manipulam o que escrevem, ou dizem, forjando muitas vezes emoções - e os que não o fazem sentirão, na comunicação, um deserto afectivo não obstante, evidentemente, a intuição de cada um relativamente à falsidade ou veracidade das mesmas. e foi por isso que surgiram os emoticons, para aproximar um pouco mais a conversa à emoção. se por um lado o seu uso excessivo pode causar ruído e efeito contrário à intenção da sua utilização, por outro a completa ausência - quer dos emoticons quer de linguagem que demonstre claramente emoções - gera ineficácia naquilo que é, de facto, comunicar. 

sistemas tecnológicos como o touchphone, lumitouch, pressuremouse, sentic mouse, affective colour, affective, emoto, visions of the future, emotion containers, hot badges, kid pagers são tentaivas de tornar, cada vez mais, a comunicação interpessoal mais e mais eficaz em que as emoções são mediadas pela tecnologia - o que reforça a importância enorme que elas, as emoções, têm nas nossas vidas. toda esta importância dependerá, certamente, se o utilizador se serve da tecnologia apenas como ferramenta ou como espelho e será isso que condiciona a exteriorização, ou não, do dentro e isto levanta um outro assunto, que é do mesmo, relacionado com a identidade na cultura da simulação. fica para a próxima.

controlo ou domínio?

o teste psicológico de Rotter, locus of control é muito usado - não apenas em estudos sociais ou do individuo no que diz respeito à psicologia - em medicina para bem distinguir controlo de domínio, o que demonstra o quanto nós somos psicossomáticos. o caso da asma, por exemplo, é flagrante: salvas excepções alérgicas é quando o medo passa a angustia e esta a pânico que surgem os ataques - o medo de ter medo funciona como o factor paralisante.

creio ser este o maior dos desafios humanos quer na saúde ou na doença, quer no trabalho ou nas relações sociais e pessoais: dominar o medo. e o domínio difere do controlo precisamente na parte em que enquanto este último é condicionado e motivado por aspectos exógenos, o domínio - o patamar acima - será uma definição interna e personalizada das peculiaridades de cada um.

domingo, 13 de janeiro de 2013

sarcasmite aguda (ela retrucou)

que bela ideia, querido. compramos o pit bull e alimentámo-lo, de uma só vez, com comida seca.
comida seca de golada? como assim?
desde que comecei a comer o vizinho do R/C direito percebi a diferença entre petisco e ração.

sarcasmite aguda

o nosso filho faz dezoito meses para a semana, querido.
pois faz, em dia de bola nas antas.
temos mesmo de pensar juntos no que lhe vamos oferecer.
já pensei: vamos amanhã comprar um pit bull.

e do abraceijo se fez sol

como se nunca tivesse recebido um abraço com um beijo a mulher, mulher é sempre mulher tenha a idade que tiver, cabelo de neve e pele de montanha, ficou feliz. e contagiou o dia: o sol abriu-se como um pavão e o pavão envaideceu-se ao exibir o seu fato de todos os dias a um domingo; e o domingo, dia também para o Domingues, ficou mais lento - e o Domingues, senhor Domingues, como lhe chamam desde que cá chegou, voltou a lembrar da terra e do tempo em que Dominguez cheirava a huevos con chopitos. ai señor!

invisível. in visível.

tive um sonho imensamente, incansavelmente, erótico. e andei toda a manhã a pensar como havia de defini-lo visto que os corpos estavam lá mas, contudo, apenas se sentiam, não se viam, uma espécie de energia com carne mas em carne sem rosto. andei então a pensar quando até esqueci a chave por dentro da fechadura e tive de subir uma escada, varanda assaltada, para entrar. 

agora já sei: foi um sonho erótico invisível, estranho, mas o estranho não tem necessariamente de ser negativo, delicioso - estava lá tudo o que preciso e quero, in visível, porém com véu, ai que pena ter acordado! quero dormir! deitar-me nos lençóis da água fresca a escaldar e fazer borbulhas de alegria! lamber cada pedaço do mel que é malagueta! cobrir-me com o edredon de pele em arrepio! ai que quero dormir para perder o pio! 

e a dança começou, o erotismo é sempre uma dança, com este som que, confesso, tive de procurar por não saber de onde vinha. mas encontrei.


sábado, 12 de janeiro de 2013

sim ao aborto na comunicação social

o facto de haver mulheres grávidas no governo é notícia porquê, afinal? relevar o estado de gravidez de alguém no trabalho já é, por si só, uma forma de discriminação. dar importância por a gravidez estar a decorrer em funções governativas, além de discriminação, é também fomentar o elitismo: se qualquer mulher pode engravidar está a considerar-se a gravidez de uma ministra um evento fenomenal a que propósito? a não ser que as razões estejam prenhas de esperança, tal como é ser a luz de uma criança que vem ao mundo, exijo um aborto desta absurda constatação e respectiva exploração da mesma pela comunicação social. já.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

hometa?


guardo até hoje a agenda poética de Albano Martins, distribuída e editada pela Universidade Fernando a Pessoa a todos os colaboradores mais precisamente, se não me falha a memória, em 2001. era, na altura, não faço ideia se ainda é, docente de Literatura, e fico muito contente que ganhe prémios literários - gosto muito da sua poesia. no entanto, como gente este homem era intragável de lidar: antipático, arrogante, altivo e prepotente - perfeitamente verificável, aliás, pelo desenho do sobrolho. pode ser que, entretanto, as rugas do tempo lhe tenham zarpado a densidade e seja, agora, um homem-poeta. um hometa.